Conhecimento Inato de Deus

por

Gordon Haddon Clark



I. Ainda que a luz da natureza e as obras da criação e da providência de tal modo manifestem a bondade, a sabedoria e o poder de Deus, que os homens ficam inescusáveis, [1] contudo não são suficientes para dar aquele conhecimento de Deus e da sua vontade necessário para a salvação; [2] por isso foi o Senhor servido, em diversos tempos e diferentes modos, revelar-se e declarar à sua Igreja [3] aquela sua vontade; e depois, para melhor preservação e propagação da verdade, para o mais seguro estabelecimento e conforto da Igreja contra a corrupção da carne e malícia de Satanás e do mundo, foi igualmente servido fazê-la escrever toda. [4] Isto torna indispensável a Escritura Sagrada, [5] tendo cessado aqueles antigos modos de revelar Deus a sua vontade ao seu povo. [6]

1. Rom. ii. 14, 15; Rom. i. 19, 20; Sal. xix, 1-3; Rom. i.21; ii.
2. 1 Cor. i. 21; 1 Cor. ii. 13, 14.
3. Hebreus i. 1.
4. Prov. xxii. 19, 20, 21; Lucas i. 3, 4; Rom. xv. 4; Mat. iv. 4, 7, 10; Isa. viii. 19, 20;
5. 2 Tim. iii. 15; 2 Pedro i. 19.
6. Hebreus i. 1, 2.

 

Esta primeira seção da Confissão de fé de Westminster afirma que a luz da natureza nos dá algum conhecimento de Deus. O que a Confissão quer dizer com “a luz da natureza”? Isto significa o senso comum? Significa que a experiência imprime uma idéia sobre Deus na mente de todos os homens? Significa que a existência de Deus pode ser rigorosamente demonstrada a partir da observação de um fenômeno natural, como os teoremas da geometria são rigorosamente demonstrados a partir de axiomas?

Por exemplo, ao acompanhar o diagrama abaixo, pode-se demonstrar corretamente que o ângulo 1 é igual ao ângulo 3. A prova é: o ângulo 1 mais o ângulo 2 são iguais a uma linha reta, ou 180 graus; o ângulo 2 e o ângulo 3 são iguais a uma linha reta também, visto que tanto a linha AB como a linha CD são linhas retas; portanto, ao subtrair o ângulo 2 de 180 graus, teremos o ângulo 1 ou o ângulo 3. Portanto, eles são iguais . A prova do teorema de Pitágoras é muito mais complicada, mas cada passo é da mesma forma certo e necessário. Não há como escapar da conclusão. Ela foi cabalmente demonstrada.

 

 

 

Tomás de Aquino, o grande filósofo da Igreja Católica Romana, cria não somente ter elaborado uma demonstração infalível da existência de Deus, mas também que o apóstolo, em Romanos 1:20, garantira tal prova. Já David Hume, a quem nenhuma igreja canonizou, argumentou que todas essas provas são falácias. Todavia, o salmista disse: “Os céus declaram a glória de Deus”. O que isso implica? Caso implique uma prova cosmológica, podemos inferir de maneira legítima que qualquer pessoa intelectualmente incapaz de aprender geometria, e que, portanto, não possa seguir o muitíssimo intrincado argumento cosmológico, não é responsável por seus pecados? O conhecimento é a base da responsabilidade, e o homem o desconhece! Ou, podemos dizer: mesmo que a existência de Deus não possa ser demonstrada, e todas as objeções de Hume aos argumentos sejam corretas, ainda assim a verdade do cristianismo permanece não afetada? Não é possível que o conhecimento de Deus seja inato? Não podemos ter nascido com uma intuição a respeito de Deus, e com esse equipamento a priori para ver a glória de Deus sobre os céus ? Dessa forma, não seríamos forçados aceitar o conceito peculiar de que o apóstolo Paulo, muito séculos antes, teria aprovado as complexidades aristotélicas de Tomás de Aquino.

Essa discussão sobre a possibilidade de demonstrar a existência de Deus não termina com Tomás de Aquino ou David Hume. Hoje, Karl Barth nega qualquer conhecimento natural de Deus. Um dos textos-prova que a Confissão usa é Romanos 1:19, 20, que diz:

Porquanto o que de Deus se pode conhecer é manifesto entre eles, porque Deus lhes manifestou. Porque os atributos invisíveis de Deus, assim o seu eterno poder, como também a sua própria divindade, claramente se reconhecem, desde o princípio do mundo, sendo percebidos por meio das coisas que foram criadas. Tais homens são, por isso, indesculpáveis.


Karl Barth, porém, insiste que Paulo falava aos gentios a quem suprira do conhecimento de Deus mediante sua pregação. Barth nega que chineses e indianos, antes de ouvir o Evangelho, possam ter algum conhecimento de Deus inato ou derivado da natureza. Essa é uma interpretação muito incomum de Romanos, e parece ser tão errônea quanto o conceito da aprovação paulina prévia de são Tomás.

Talvez fosse melhor entender a situação nos termos de idéias inatas ou a priori. No ato da criação Deus implantou no homem o conhecimento de sua existência. Romanos 1:32 e 2:15 parecem indicar que Deus também implantou algum conhecimento sobre moralidade. Nascemos com esse conhecimento; ele não é obtido como resultado da experiência sensorial. Com a ajuda desse conhecimento inato, podemos cantar com confiança :

Senhor meu Deus , quando eu maravilhado
Os grandes feitos vejo da tua mão ,
Estrelas , mundos e trovões rolando,
A proclamar teu nome na amplidão ,
Canta minh' alma, então, a ti, Senhor:
Grandioso és tu , grandioso és tu! [1]

 

Dentro dos limites dessa primeira estrofe, do primeiro capítulo de Romanos e da simples observação do universo, Deus não deve ser chamado Salvador. Ao compositor do hino, entretanto, por sua posição pessoal anterior cristã, pode-se permitir usar o nome de maneira proléptica.

Já a Confissão, a partir de sua construção sistemática, esclarece imediatamente que qualquer conhecimento do grande poder de Deus, demonstrado na criação, é insuficiente para a salvação.

Até mesmo o conhecimento inato de moralidade não fornece nenhuma informação de como ou até mesmo da possibilidade de perdão do pecado. “Por isso foi o Senhor servido, em diversos tempos e diferentes modos, revelar-se e declarar à sua Igreja aquela sua vontade”.


Notas:

[1] - Novo cântico, São Paulo: Cultura Cristã,1999, hino nº. 26, p. 21.


Fonte:


What Do Presbyterians Believe?
, Gordon H. Clark, páginas 9-11.

 


Traduzido e adaptado por: Felipe Sabino de Araújo Neto
Cuiabá-MT, 02 de Outubro de 2005.

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