Agostinho de Tagasta [“Santo Agostinho”]
O Peso do Amor

por

Jorge Pinheiro

 

“O mundo está transtornado, como se estivesse numa prensa. Coragem, cristãos, sementes da eternidade, peregrinos neste mundo, a caminho da cidade do céu! As provações que se multiplicam são o destino dos tempos cristãos, mas não constituem um escândalo para o cristão. Se amas este mundo, blasfemarás contra Cristo. E é isso o que te sopra o teu amigo, o teu conselheiro. Mas não deves escutá-lo. Se este mundo está sendo destruído, diz a ele que Cristo o previu”. [Sermão de Agostinho em outubro, sobre a queda de Roma, invadida pelos godos alguns meses antes, em 24 de agosto de 410].

Em l986, o mundo cristão comemorou 1600 anos da conversão de um homem apaixonado pela vida: Aurélio Agostinho. Aqui não faremos uma biografia desse pastor da igreja cristã, mas analisaremos, ainda que a galope, um dos momentos mais lindos de sua teologia, aquela que fala sobre o Espírito Santo e o amor.

A África, berço de Agostinho, produziu três gênios do cristianismo: Tertuliano, Cipriano e o próprio Agostinho. O futuro bispo de Hipona nasceu no dia 13 de novembro de 354, na cidade de Tagasta, antiga Numíbia, hoje Anabá, na Argélia. Seu temperamento combinava paixão, sensualidade, e amor pelo conhecimento e pela verdade. Aos 17 anos uniu-se afetivamente a uma jovem, que lhe deu um ano depois, seu único filho, Adeodato. Durante 14 anos foi fiel a sua companheira.

Intelectual brilhante, tornou-se maniqueísta na juventude. O maniqueismo foi fundado por Mâni, na Pérsia, no século III. Era um sincretismo que combinava elementos dos zoroastrianismo, budismo, judaísmo e cristianismo. Segundo Mâni, a luz e as trevas, o bem e o mal estão eternamente em guerra. Alguns conceitos do maniqueismo, como a concepção de espírito e matéria, aproximavam-se muito do pensamento gnóstico. Para os maniqueus, o homem era a prisão material do reino do mal.

Em 384, Agostinho tornou-se professor de retórica em Milão, capital ocidental do império. Separou-se de sua primeira companheira, unindo-se a uma segunda. Nessa época, aproximou-se do neoplatonismo, uma interpretação mística e panteísta do pensamento de Platão. Essa filosofia quebrou a dureza de seu coração materialista e criou as condições para que mais tarde aceitasse o cristianismo. Mas nesse meio tempo, Agostinho tinha chegado ao fundo do poço. Seus ideais neoplatônicos e sua vida dissoluta estavam em choque. Certo dia, estava em seu jardim em Milão, refletindo sobre a força moral do cristianismo, que vira nos monges egípcios, homens simples, mas coerentes em sua fé, quando... e Agostinho conta nas Confissões:

“E eis que ouço algo como uma voz, vinda de uma casa vizinha. Ela dizia, cantante, repetindo frequentemente: Toma! Lê! Toma! Lê! No mesmo instante, minha fisionomia mudou, fiz recuar as lágrimas que me assaltavam e pus-me a ler o que se encontrava no primeiro capítulo em que abri. Imediatamente, fez-se como que uma luz de segurança derramando-se em meu coração e todas as trevas da hesitação se dissiparam”. [Santo Agostinho, Confissões, 1a. parte, livro VIII, capítulo 12, p. 166, SP, Abril, 1973].

O texto de sua conversão foi Romanos 13: 13-14. "Andemos dignamente, como em pleno dia, não em orgias e bebedices, não em impudícias e dissoluções, não em contendas e ciúmes, mas revesti-vos do Senhor Jesus Cristo, e nada disponhais para a carne, no tocante as suas concupiscências".

Converteu-se no verão de 386. Na Páscoa de 387, Agostinho foi batizado por Ambrósio, juntamente com o filho Adeodato e com o amigo de juventude, Alípio.


O PESO DO AMOR

A semelhança de Tertuliano, Agostinho concebe a geração do Filho como ato do pensamento do Pai. E o Espírito Santo, que procede do Pai e do Filho, é o amor mútuo entre ambos. Esse amor é uma Pessoa. Toda atividade de Deus ad extra decorre de sua natureza e é, por isso, comum às três Pessoas.

Agostinho concebe imagens da Trindade no espírito humano, por causa de suas faculdades peculiares tais como o lembrar-se, o conhecer e o querer (memória, inteligência, vontade).

"É no Vosso dom [Espírito Santo] que repousamos. Nele gozaremos de Vós. É o nosso descanso, é o nosso lugar. É para lá que o Amor nos arrebata e que o Espírito Santo levanta o nosso abatimento desde as portas da morte. Na Vossa boa vontade temos a paz. (...) O corpo, devido ao peso, tende para o lugar que lhe é próprio, porque o peso não tende só para baixo, mas também para o lugar que lhe é próprio. Assim, o fogo encaminha-se para cima e a pedra para baixo. Movem-se segundo o seu peso. Dirigem-se para o lugar que lhes compete. O azeite derramado sobre a água aflora a superfície. A água vertida sobre o azeite submerge debaixo deste. Movem-se segundo o seu peso e dirigem-se para o lugar que lhes compete. As coisas que não estão em seu lugar próprio, agitam-se, mas quando o encontram, ordenam-se e repousam". [Idem, op. cit., livro XIII, capítulo 9, pp. 291-292].

Este texto não é somente belo. Mil e trezentos anos antes de sir Isaac Newton, Agostinho intuia que há coisas tão leves, que sobem, ao invés de cair. E que todas as coisas só encontram o repouso quando estão no lugar que deveriam estar. E escreve um dos mais belos textos sobre o amor:

“O meu amor é o meu peso. Para qualquer parte que eu vá, é ele quem me leva. O Vosso dom inflama-nos e arrebata-nos para o alto. Andamos e partimos. Fazemos ascensões no coração e cantamos o cântico dos degraus. (...) É o Vosso fogo, o Vosso fogo benfazejo que nos consome, enquanto vamos e subimos para a paz da Jerusalém celeste. Regozijei-me com aquilo que me disseram: iremos para a casa do Senhor. Lá nos colocará a boa vontade, para que nada mais desejemos senão permanecer ali eternamente”. [Idem, op. cit., livro XIII, capítulo 9, p. 292].

Para Agostinho, todo conhecimento é uma forma de amor. Só se ama aquilo que se conhece. E, a busca do conhecimento pressupõe sempre um conhecimento prévio. Para entender o pensamento de Agostinho sobre o amor é bom lembrar que ele vê Deus como unidade plena, viva e guardando dentro de si a multiplicidade. Em Deus há três pessoas consusbstanciais: Pai, Filho e Espírito Santo. O Pai é a essência divina em sua profundidade insondável. O Filho é o Logos, o verbo, a razão e a verdade, através da qual Deus se manifesta. O Espírito Santo é o amor, mediante o qual Deus dá nascimento a todos os seres.

É por isso que Agostinho diz:

"As três coisas que digo são: existir, conhecer e querer. Existo, conheço e quero. Existo sabendo e querendo; sei que existo e quero; e quero existir e saber. (...) Repare, quem puder, como a vida é inseparável nestes três conceitos: uma só vida, uma só inteligência, uma só essência, sem que seja possível operar uma distinção que, apesar de tudo existe". [Idem, op. cit., livro XIII, capítulo 11, p. 293].

Assim, para Agostinho, o amor encontra o seu objeto no mesmo lugar que a razão o descobrira: no mais íntimo da alma, onde a memória se abre para Deus e onde mora a verdade. Na doutrina de Agostinho, a metafísica é inseparável da ética.


A INFLUÊNCIA PLATÔNICA

O pensamento de Agostinho sobre o amor tem uma base ética, que vem de Platão. Para o sábio grego, o conhecimento consiste numa vitória da inteligência sobre os sentidos. O filósofo será tanto maior quanto mais se distancia do passageiro, para se apegar as realidades inteligíveis.

“Eles, os filósofos genuínos, desde os anos juvenis, não sabem o caminho da ágora, nem onde fica o dicastério, ou a sala do senado, ou o lugar onde se tratam dos negócios da cidade. Não escutam, nem lêem os decretos e as leis proclamadas ou escritas. Nem sequer em sonhos participam das facções e nas hetairias, que porfiam na eleição dos magistrados, nas assembléias, nas ceisas ou nos festins (...) nem prestam as suas lascivas seduções”. [J. de Castro Nery, Evolução do Pensamento Antigo, p. 88, PA, Globo, 1944.

Mas como procurar, quando se desconhece o que se procura? Sócrates já havia observado: "Não buscarias, se já não tivesses achado". Assim, saber é, na maioria das vezes, recordar.

Trabalhando com conceitos órficos e pitagóricos e com a mística do panteão grego, Platão propõe que o corpo é um túmulo e que se torna necessário um trabalho de purificação interna para expiar a sua queda do Olimpo. Em "Górgias", descreve o tempo de Cronos, quando os homens ainda eram julgados por um processo muito primitivo, em carne e osso. Plutão reclamava que os homens vinham cheios de beleza, muitos títulos, muitas jóias. Com isso, passavam até os assassinoa, ladrões e tiranos. Então, Zeus ordenou que deveriam ser julgados sem corpo.

É verdade que foi breve a passagem de Platão pela mitologia grega, mas sem dúvida alguns conceitos permaneceram e estão ligados a sua formulação sobre moral. Assim, a terra onde moram temporariamente os mortais é apenas uma sombra comparada a outra. Os bem-aventurados estão lá em cima, nos céus, um lugar puro e ternamente agradável. Dessa forma, Platão defende a tese da imortalidade da alma, usando para isso argumentos da psicologia especulativa. Para ele, as reminiscências pressupõem que as almas estivessem existido antes. Daí, chega à conclusão de que se a alma é imortal, ela está ligada às realidade inteligíveis, pois estas são imateriais, imutáveis e incorruptíveis. Logo, a alma, por sua origem divina, também é imortal. E o corpo, pobre corpo, é um túmulo.

Mas, o que impele a alma em direção ao bem? O amor. Não o sexo, que se funda na beleza dos corpos, mas se nutre da formosura da alma. No "Banquete", Platão parte do desejo sexual para chegar a forma divina de amor, que gera virtudes e pensamentos imortais.

Na "Dialética" declara que são verdadeiras apenas as coisas imutáveis, necessárias e eternas. Essas verdades são as idéias, que estão acima do tempo e do espaço, e que só podem ser conhecidas pelo discurso, cujo tipo está nas provas matemáticas, e também pela intuição, que atinge os puros inteligíveis sem usar imagens.

Todas as idéias são dependentes da Idéia Suprema, que é o Bem. Para Platão, a moralidade humana consiste em imitar a Idéia Suprema, fonte da felicidade.

A virtude, que é a harmonia das faculdades humanas, é o meio para se chegar ao Bem. O homem, para Platão, é formado por uma alma trina: racional, que mora na cabeça; irascível, que mora no peito; e concupiscível, que mora no ventre. A virtude também se divide em três: a sabedoria, que domina a alma racional; a fortaleza, que robustece a alma irascível; e a temperança, que domina a alma concupiscível.

No entanto, só a alma racional é espiritual e imortal. É espiritual porque move o corpo, mas é diferente dele. E é imortal porque participa das idéias eternas.


A INFLUÊNCIA DE PAULO E DA TRADIÇÃO CRISTÃ

As epístolas de Paulo, assim como a tradição cristã, fizeram parte da vida de Agostinho. Não podemos esquecer que ele se converteu ao ler Romanos 13. É interessante notar que, em seu livro XIII das Confissões, Agostinho cita Paulo -- que chama de Apóstolo com maiúscula -- 54 vezes, diretamente. Enquanto, em ordem decrescente, os livros seguintes mais citados são Salmos [31 vezes], Isaías [6 vezes] e Mateus [6 vezes]. As demais citações bíblicas estão abaixo desses números.

Em textos que lembram I Coríntios l3 e também a primeira epístola de João, Agostinho diz que "o amor é a própria essência do homem, e por isso ele não encontra repouso enquanto não encontrar o seu lugar". [Philotheus Boehner e Etienne Gilson, S. Agostinho, Mestre do Ocidente in História da Filosofia Cristã, pp. 164-168, Petrópolis, Vozes, 1988].

Assim, para ele o amor é a alegria ontológica mais profunda, e seria uma insensatez querer separar o homem de seu amor. O problema consiste, então, não em relação ao amor como tal, mas unicamente ao objeto do amor. "Porventura, se diz que não deveis amar coisa alguma? De modo algum! Imóveis, mortos, abomináveis e miseráveis: eis o que seríamos se não amássemos. Amas, pois, mas atende ao que é digno do teu amor". [Idem, op. cit., pp. 164-168] .

O problema central da moralidade é, portanto, para Agostinho -- e aqui ele traduz toda a tradição cristã -- , o da reta escolha das coisas a serem amadas. O amor consiste, principalmente, num peso interior, que atrai o homem para Deus. Amar sinceramente o outro significa amá-lo como a nós próprios, o que só é possível num plano de igualdade: quer elevando-o ao nosso nível, quer elevando-nos ao plano da pessoa amada.

Entre o amor a Deus e o amor ao homem há um elemento comum: o amor ao bem. Portanto, o amor sempre terá por objeto o ser e o bem. É justo que amemos o próximo como a nós próprios, pois, enquanto bem ele se encontra no nosso nível.

Amar a Deus, porém, é amar o bem como tal. Já não pode haver igualdade entre o amante e o amado. Para amar a Deus, convenientemente, devemos amá-lo de modo absoluto, com desigualdade. Ou seja, amá-lo mais que a nós próprios. De modo absoluto: sem esperar retribuição e sem comparação. A tradição cristã das testemunhas martirizadas estavam perto demais da vida de Agostinho, de forma que falar desse amor por Deus não era apenas exercício teológico.

De todas as maneiras, para o bispo de Hipona esse processo não significava aniquilamento do eu, pois, no amor a Deus, esquecer-se equivale a encontrar-se e perder-se a ganhar-se.

Assim, segundo a tradição apostólica e cristã, tomada por Agostinho, para entrar na plena posse do bem perfeito é necessário que o homem abdique de si próprio. Essa entrega plena a Deus, que assegura a posse de seu objeto, é o amor.

O amor não é apenas o coração da moralidade, é a própria vida moral. O começo do amor é o começo da justiça, o progresso no amor é o progresso da justiça, a perfeição do amor é a perfeição da justiça. Dominado pelo amor, o homem cumpre cabalmente a lei divina. Amar e fazer o bem tornam-se sinônimos.


CONCLUSÃO

Esse amor pregado por Agostinho chegará à plena realidade com seu trabalho A Cidade de Deus. O império está sendo ameaçado, Roma sitiada acusa os cristãos por esta decadência política. E a discussão teológica dos anos anteriores, sobre a relação dialética entre o poder do Espírito e a majestade do amor, cria carne e vira praxis. Agora, como profeta preocupado com o destino da igreja no século presente, o bispo de Hipona clama:

"Dois amores construíram duas cidades: o amor de si próprio em detrimento de Deus e o amor de Deus em detrimento de si próprio. Uma delas glorifica-se em si mesma e mendiga sua glória junto aos homens, a outra glorifica-se no Senhor. Deus, testemunha de sua consciência, é a maior glória da outra cidade". [A Hamman, Santo Agostinho e Seu Tempo, p. 307, SP, Paulinas, 1989].

Dessa maneira, o que era pessoal nas Confissões toma uma dimensão universal na Cidade de Deus. O amor de Deus abarca toda a humanidade. Aliás, quando as pessoas, vivendo a decadência daqueles momentos, diziam que os tempos eram maus, Agostinho replicava: "Os tempos são aquilo que nós somos. Não há bons tempos, há somente boas pessoas". [Idem, op. cit., p. 308].

Essa relação entre amor e cidade de Deus, para Agostinho está ligada ao caráter errante da vida cotidiana.

“Todo homem vaga e procura. O que procura ele? Busca descanso, procura felicidade. Não há ninguém que não procure ser feliz. Pergunta a um homem qualquer o que ele deseja, e te responderá que procura a felicidade. Mas os homens não conhecem a estrada que leva à felicidade, nem o lugar onde a encontrar. Por isso é que eles vagam. Cristo recolocou-nos na boa estrada, no caminho que leva à pátria. Como caminhar? Ama, e correrás. Quanto mais fortemente amares, mais depressa correrás em direção à pátria”. [Idem, op. cit., p. 309].

Assim, o amor em Agostinho toma uma conotação universal, dentro da mais pura tradição paulina. Por isso, finalizamos esse estudo com um pensamento chave do pastor de Hipona:

“Se quiseres saber qual é a cidade e a que chefe obedeces, escruta teu coração e examina teu amor. É o amor que identifica os homens e constrói as cidades. É pelo amor que seremos julgados”. [Idem, op. cit. p. 307].


A CRISTOLOGIA DE AGOSTINHO

1. Mediador. “Cristo nos reconcilia com Deus pelo sacrifício da paz, permanecendo um só com Aquele a quem fez a oferta, unindo em Si mesmo aqueles por quem ofereceu o sacrifício, sendo Ele mesmo um só como ofertante e sacrifício ofertado”.

Atenção: ele é mediador enquanto homem, não enquanto Palavra. O objetivo total da encarnação da Palavra era que ele fosse cabeça da igreja e agisse como mediador. A intenção de Agostinho não é eliminar o papel da Palavra, mas enfatizar a humanidade de Cristo. O que essa doutrina procura mostrar é que, na humanidade de Cristo, o homem caído e seu Criador possuem um ponto em comum, onde pode ser efetivada a obra da reconciliação e da restauração.

2. Essa mediação se realiza através da reconciliação -- a divindade participa de nossa mortalidade a fim de que participássemos de sua imortalidade; e da libertação -- liberta nossa natureza das coisas naturais, "a fim de tornar deuses aqueles que eram homens". Não é deificação, mas glorificação, uma libertação de Satanás.

Agostinho dramatiza: "Do sangue de Cristo como o preço que foi pago por nós e aceito pelo diabo só para, então, ver-se acorrentado". É uma dramatização, uma alegoria. Satanás não possuía nenhum direito sobre a humanidade. O dominío dele, após o pecado, é uma permissão, não uma determinação de Deus. Por isso, Cristo não devia nenhum resgate à Satanás.

Alguns teólogos consideram que o centro da soteriologia de Agostinho é a libertação do homem das mãos de Satanás. Discordamos desses estudiosos. Agostinho deixa claro que "mediante Sua morte, o mais verdadeiro sacrifício oferecido em nosso favor, Ele expurgou, eliminou e destruiu ... qualquer culpa que tínhamos". "Ele ofereceu este holocausto a Deus, estendeu suas mãos na cruz... e nossas maldades foram propiciadas... Tendo nossos pecados e maldades propiciados por meio desse sacrifício vespertino, nós passamos para o Senhor, e o véu foi removido".

3. A humildade de Deus. O ensino de Agostinho não tem precedentes. "Cristo demonstrou o amor e a sabedoria de Deus". O que deve levar nossos corações a adorar a humildade de Deus, que conforme revelada na encarnação, rompe nosso orgulho. "Fazemos bem em crer, ou melhor, em manter firme e inabalável em nossos corações, que a humildade demonstrada por Deus, ao nasce de uma mulher e ao ser compelido à morte de modo tão ignominioso por homens mortais, é o remédio supremo para curar nosso orgulho intumescido, o profundo mistério [sacramento] pelo qual os laços do pecado são rompidos".


Daí tira duas conclusões:

A. É a humildade objetiva que se mostra na encarnação e na paixão que torna possível nossa reconciliação.

B. Nossa imitação de Cristo é o efeito da graça divina liberada pelo sacrifício da cruz sobre nossos corações. "Jamais teríamos sido libertados, nem mesmo pelo único mediador entre Deus e os homens, o homem Jesus Cristo, se Ele também não fosse Deus. Quando Adão foi criado, ele era obviamente justo, não sendo necessário um mediador. Mas quando o pecado estabeleceu um imenso abismo entre a humanidade e Deus, foi preciso um mediador singular no nascimento, na vida e na morte sem pecado, a fim de que fôssemos reconciliados com Deus e conduzidos à vida eterna mediante a ressurreição da carne. Assim, pela humildade de Deus, o orgulho humano foi repreendido e curado, e mostrou-se ao homem o quanto ele se afastara de Deus, pois foi necessária a encarnação de Deus para a restauração do homem". [J. N. D. Kelly, Doutrinas Centrais da Fé Cristã, SP, EVN, 1994, p. 300].


A ECLESIOLOGIA DE AGOSTINHO

A eclesiologia de Agostinho capitulou às pressões dos acordos políticos com o império romano helenístico e do crescente poder da hierarquia da igreja de seu tempo, o que levou-o a distorcer sua própria teologia. Por isso, todos nós, herdeiros da Reforma, discordamos da eclesiologia de Agostinho, mas nem por isso deixamos de ver nele um grande teólogo da igreja cristã.

Assim, para Agostinho:

1. A igreja é o domínio de Cristo, Seu corpo místico e Sua noiva -- a mãe dos cristãos. Fora dela não há salvação. Os cismáticos podem ter a fé e os sacramentos, mas não conseguem tirar bom proveito deles, pois o Espírito Santo só é outorgado à igreja.

2. A igreja da qual Agostinho fala é a igreja católica de seu tempo, com sua hierarquia e sacramentos e com seu centro em Roma. Para ele, é a verdadeira igreja por ensinar toda a verdade e não fragmentos dela e por abranger todo o mundo.

3. Nesse sentido a igreja de Agostinho é universal, empírica e visível a qualquer momento. É uma comunidade mista, abrangendo bons e maus.

 


BIBLIOGRAFIA recomendada

Agostinho, Confissões, São Paulo, Abril, 1973
Boehner e Gilson, S. Agostinho, Mestre do Ocidente in História da Filosofia Cristã, Petrópolis, Vozes, 1988
Cross e Livingstone, The Oxford Dictionary of the Christian Church, Oxford University Press, 1988.
Finley, Los Griegos de la Antiguedad, Barcelona, Editorial Labor, 1970
Hamman, Santo Agostinho e Seu Tempo, p. 307, SP, Paulinas, 1989
Platão, Diálogos / O Banquete / Fédon / Sofista / Político, SP, Abril, 1979
______O Banquete, Sintra, Portugal, Publicações Europa América, 1977
W. Walker, História da Igreja Cristã, SP, Aste, 1967


Jorge Pinheiro , pastor batista, é professor do Depto. de Teologia Sistemática da Faculdade Teológica Batista de São Paulo e do Departamento de Antigo Testamento da Faculdade Teológica Batista Paulistana. É também professor convidado da Missão Antioquia (SP) e do Centro de Ensino Teológico - CETEOL (SC).


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