2 Coríntios 12:7b

por

Dr. Simon Kistemaker

 

 

7b. Portanto, para que eu não ficasse empolgado demais, foi-me dado um espinho na carne, um mensageiro de Satanás, para esbofetear-me, para que eu não fique eufórico demais.

a. “Portanto, para que eu não ficasse empolgado demais, foi-me dado um espinho na carne”. Essa afirmação conclusiva é introduzida pelo advérbio portanto. Mas dificilmente essa palavra pode se ligar ao versículo 6b com seu conteúdo específico. Em lugar disso, a declaração resume a ênfase que Paulo dá, de se gloriar de suas fraquezas. A soberba se intromete sorrateiramente na alma humana e passa a reinar de tal forma que a pessoa não perceba sua presença.

Ao longo do discurso de Paulo sobre o gloriar-se, ele deu ao Senhor a glória e honra. Seu desejo é permanecer humilde e abster-se de gloriar-se de si mesmo e de suas realizações. Ele sabe que o privilégio de vivenciar visões e revelações celestiais poderia resultar em orgulho.A tentação de se elevar acima de seus companheiros era real.

O Senhor interveio dando a Paulo um espinho na carne. O grego emprega o termo skolops, que significa ou estaca ou espinho. Não é correto pensar em empalação ou crucificação, porque Paulo sempre usa stauros quando escreve sobre a cruz. Aqui a palavra tem o sentido de um espinho ou outro objeto que fere a pele de Paulo e o machuca. Paulo também usa a palavra carne, que aponta à fragilidade de seu corpo físico. A maioria dos estudiosos concorda que esse termo deve ser interpretado literalmente, isto é, Paulo suportava dor física.

b. “Um mensageiro de Satanás, para esbofetear-me, para que eu não fique eufórico demais”. A segunda parte do versículo 7 visa explicar a primeira parte. No entanto, as dificuldades em se entender o que Paulo quer dizer aumentam a cada cláusula. Gostaríamos de acreditar que os leitores originais dessa epístola tivessem entendido o sentido dessas palavras, mas o fato de que Paulo está revelando sua visita celestial pela primeira vez é indicação de que sua referência ao espinho em sua carne também é notícia nova.

Paulo escreve que sua aflição física é um mensageiro de Satanás, isto é, um dos anjos maus de Satanás. Ao dar a Paulo um espinho para lhe causar desconforto físico, Deus permite que Satanás mande um dos seus anjos para atormentar o apóstolo. Somos lembrados de Jó, que também foi afligido por Satanás; na verdade, Deus impôs limites para Satanás, que só podia fazer o que Deus lhe permitia fazer (ver Jó 1.12; 2.6).

A frase seguinte, “para esbofetear-me”, é ainda mais descritiva, isto é, o mensageiro de Satanás feria Paulo no rosto. Isso aconteceu quando membros do Sinédrio deram murros em Jesus (Mt 26.67; Mc 14.65). Tanto Paulo como Pedro usam a palavra quando falam em apanhar injustamente (1Co 4.11; 1Pe 2.20).

Como relacionamos o “espinho na carne” com “mensageiro de Satanás”, e essas duas expressões, por sua vez, com esmurrar o rosto de Paulo?

Explicações do mal de Paulo são numerosas; há pelo menos doze diferentes sugestões, várias delas bem aproveitáveis. Entre as sugestões estão a epilepsia, a histeria, a nevralgia, a depressão, problemas de visão (ver Gl 4.14, 15), malária, lepra, reumatismo, um impedimento na fala (ver 10.10; 11.6), tentação, inimigos pessoais (comparar com 11.13-15) e maus-tratos de um demônio.30 Essas teorias são habilmente defendidas por estudiosos que conhecem tanto a literatura judaica quanto a vida de Paulo descrita em Atos e nas epístolas. Certamente, algumas conjecturas são dignas de consideração. Mas cada uma esbarra contra objeções de peso. Quer aconteça ter sido a aflição de Paulo um problema externo ou interno, o resultado permanece o mesmo: nossas teorias são meras suposições, pois não sabemos o que afligia o apóstolo.

Notamos um contraste descrito nesse versículo. Paulo, que se ergue ao terceiro céu para ver a luz celestial, é depois continuamente atormentado por um mensageiro do príncipe das trevas. Paulo diz aos leitores que esse contraste aconteceu para que ele se conservasse humilde, “para que eu não fique eufórico demais”. Duas vezes nesse versículo (v. 7b) ele escreve a mesma cláusula, obviamente para maior ênfase.


Comentários Adicionais sobre 12.7b

Da profusão de propostas, examinaremos resumidamente cinco explicações sobre a aflição de Paulo. Muitas dessas propostas têm tido seus adeptos através dos séculos, mas por falta de evidência bíblica continuam sendo meras suposições.

1. Depressão. Pelo capítulo 1 já tomamos conhecimento de que Paulo estava desanimado pelas suas experiências na Ásia Menor (1.8). Ele havia encontrado reveses severos causados por pessoas, tais como o ourives Demétrio (At 19.25-41). Mas isso dificilmente explica o espinho na carne de Paulo. Muito embora Paulo tenha experimentado oposição, nenhuma indicação nos é dada de que tenha sofrido de depressão séria. Ao contrário, ele escreve: “Em tudo somos atribulados, porém não angustiados; perplexos, porém não completamente perplexos” (4.8). Somos “entristecidos, mas sempre alegres” (6.10).

2. Visão fraca. Escrevendo aos gálatas, Paulo menciona que sua doença era uma aflição para eles. Contudo, eles o aceitaram como anjo de Deus e teriam feito qualquer coisa por ele, até arrancar seus próprios olhos para lhe dar (Gl 4.14, 15). Será que Paulo estava sofrendo de oftalmia? Paulo escreveu a epístola aos Gálatas com letras grandes (6.11), usou escribas para escrever outras cartas para ele (ver Rm 16.22) e teve dificuldade em ver o sumo sacerdote Ananias na reunião do Sinédrio (At 23.5). Mas não temos certeza se o desejo dos gálatas de dar-lhe os olhos deve ser entendido de modo literal ou figurado. Parece ser hipérbole; especificamente, eles dariam a Paulo a parte mais preciosa de suas pessoas. E, finalmente, a passagem fala de um anjo de Deus (Gl 4.14), mas não de um anjo de Satanás.

3. Epilepsia. Será que Paulo sofria de ataques ocasionais de epilepsia, dos quais um exemplo seria sua experiência de conversão às portas de Damasco? Um ataque epiléptico causa períodos de inconsciência, o que não aconteceu quando Jesus fez Paulo parar perto de Damasco. Também, quando uma pessoa está inconsciente, a dor não é um fator. A epilepsia não corresponde a ser dolorosamente esmurrado no rosto. Não há evidência nenhuma em Atos ou nas epístolas de Paulo de que ele tenha sofrido alguma vez desse mal. E dizer que a aflição de Paulo na Galácia foi epilepsia porque os gálatas podem ter mostrado desprezo ou desdém [1] acrescentar algo que não está no texto (Gl 4.14). Paulo não está se referindo a uma ação literal, mas está usando uma figura de linguagem.

4. Inimigos. Essa epístola revela a oposição contra qual Paulo teve de lutar continuamente. Seus oponentes foram de fato uma fonte de agonia mental para ele. Contudo, devemos dizer que uma interpretação que identifica seus inimigos com o espinho na carne não é coerente com a evidência disponível. Não podemos imaginar que Paulo oraria três vezes para ser livrado de seus inimigos. Ele aconselha aos gálatas a não lhe causarem problemas, “pois trago no corpo as marcas de Jesus” (6.17). Como servo de Cristo, ele suportou alegremente as evidências de apedrejamento, açoitamentos e enfermidades.

5. Visitação de demônios. Essa teoria ensina que quando Paulo estava no céu, foi dominado pelo orgulho. Mas de repente foi atacado por um demônio que o punia para conservá-lo humilde. Paulo orou três vezes ao Senhor para fazer com que o ataque parasse, mas foi-lhe dito que tinha de aprender sua lição e confiar na suficiência da graça de Deus. Há objeções exegéticas a essa interpretação: o desconforto físico do espinho na carne não é uma provação temporária no céu, mas uma dor persistente na terra. E mais, não há indicação no texto de que Paulo tenha vivenciado um castigo no céu, porque lá é um lugar muito improvável para um demônio vencer o apóstolo. E, por fim, um espinho na carne foi dado a Paulo não por um mensageiro de Satanás, e sim pelo Senhor, que permitiu que o mensageiro de Satanás o esbofeteasse.

Entender a aflição do apóstolo literalmente é uma abordagem viável, especialmente à luz de um paralelo. No sábado, Jesus curou uma mulher que tinha sido aleijada por um espírito durante dezoito anos. Ele perguntou ao chefe da sinagoga: “Então não deve essa mulher, filha de Abraão, que Satanás trazia presa por dezoito longos anos, ser solta no dia de sábado daquilo que a prendia?” (Lc 13.16). O paralelo, entretanto, cessa quando olhamos o desfecho. A mulher sofreu por quase duas décadas e foi
curada; Paulo não foi curado, mas foi-lhe dada graça para suportar a aflição.

 

Notas:

[1] - A tradução literal de ekptuw é “eu cuspo para fora”, mas os tradutores preferem o sentido secundário: “Eu desprezo”.


Fonte: Extraído do comentário de Simon Kistemaker sobre 2 Coríntios, publicado pela Cultura Cristã.

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