Santos....e Fiéis em Cristo Jesus

por

Dr. David Martyn Lloyd-Jones



Paulo, apóstolo de Jesus Cristo, pela vontade de Deus, aos santos que estão em Éfeso, e fiéis em Cristo Jesus” – Efésios 1:1


Como vimos, quando o apóstolo começa a sua carta, ele mergulha imediatamente no meio de grandes e profundas verdades. Suponho que todos nós, em graus variáveis, devemos declarar-nos culpados da tendência de considerar as instruções das Epístolas do Novo Testamento como sendo mais ou menos formais. Inclinamo--nos a achar que as instruções são mais ou menos desnecessárias, e que podemos saltar por cima delas para podermos chegar depressa à grande mensagem que se lhe segue. Nas leituras da meninice queríamos chegar logo ao coração da história, e muitas e muitas vezes ficávamos impacientes com todos os preliminares; queríamos a vibração e o fim da história. Esse hábito tende a persistir, de modo que, quando chegamos às Epístolas do Novo Testamento, achamos que os versículos preliminares e as saudações não são importantes e não têm nenhuma ligação com a verdade e com a doutrina. Assim, tendemos a lê-ias muito rapidamente e a precipitar-nos ao que consideramos como o ensino essencial. Mas, isso é um engano profundo, não somente com relação às Escrituras, como também com relação a qualquer coisa que valha a pena ler. É sempre bom dar atenção àquilo que o escritor no início julga necessário e importante, pois é óbvio que ele não o teria introduzido se não tivesse algum objetivo em mente. Se isso é verdade em geral, é verdade particularmente quantos a estas Epístolas do Novo Testamento, porque nestas saudações preliminares vemos aspectos da verdade que são vitais e essenciais.

Aqui, no versículo primeiro desta Epístola, temos um notável exemplo disso, pois o apóstolo nem consegue dirigir-se aos efésios sem ao mesmo tempo presenteá-los aos efésios (e a nós) com uma extraordinária descrição e definição do que significa ser cristão. Chamo a atenção para este fato porque muitas vezes as pessoas interpretam mal o ensino das Epístolas do Novo Testamento é dirigido única e exclusivamente a cristãos, a crentes no Senhor Jesus Cristo. É completamente errôneo e herético tomar o ensino 'de qualquer das Epístolas do Novo Testamento e aplicá-lo ao mundo em geral. O ensino é dirigido a pessoas particulares, e aqui o apóstolo não nos deixa em nenhuma dúvida quanto às pessoas às quais ele está escrevendo. Ele se dirige a elas e imediatamente as descreve.

Também é preciso ficar claro para nós o fato de que o apóstolo estava escrevendo o que se pode descrever como uma carta geral. A Versão Revista inglesa não diz: “aos santos que estão em Éfeso”. A palavra “Éfeso” é omitida, e isso nos faz lembrar que nalguns dos manuscritos antigos as palavras “em Éfeso” não estão incluídas. Os manuscritos mais antigos não contêm as palavras “em Éfeso”, mas elas se encontram noutros manuscritos antigos. Contudo, as autoridades concordam em dizer que o que realmente aconteceu foi que o apóstolo escreveu uma espécie de carta circular a várias igrejas, e que o seu amanuense provavelmente deixou um espaço em branco para que se pudesse inserir o nome de alguma igreja em particular. Esta carta à igreja de Éfeso foi também a outras igrejas da Província da Ásia, e é provável que a descrição tradicional, “A carta para os efésios” tenha surgido do fato de que o exemplar original foi para a igreja de Éfeso.

Permitam-me ressaltar também que esta carta não foi destinada a alguns cristãos incomuns e excepcionais, não é uma carta dirigida ' a algum grande erudito ou teólogo, não é uma carta dirigida a professores, não é uma carta dirigida a eruditos especializados no estudo das Escrituras. Não é uma carta para especialistas, porém para membros de igreja comuns. Esta é, sob todos os pontos de vista, uma observação muito importante, e pela seguinte razão, que tudo o que o apóstolo diz aqui acerca dos cristãos e membros das igrejas deve, portanto, ser verdade a nosso respeito. Toda a elevada doutrina que temos nesta Epístola é algo que eu e vocês fomos destinados a receber. A Epístola aos Efésios – talvez a realização máxima da vida do apóstolo e dos seus escritos – é uma Epístola destinada a pessoas como nós. O objetivo é que membros comuns de igreja, de todas as igrejas, tornem posse desta doutrina e as entendam e se regozijem nelas. Não são apenas para certas pessoas especiais e cultas; são para cada um de nós e para todos nós.

Voltando-nos, pois, para a descrição que o apóstolo faz do cristão, de todo cristão, temos aqui o que se pode chamar o mínimo irredutível do que constitui um cristão. No corpo desta carta diz o apóstolo que ele está desejoso de que essas pessoas aprendam mais verdades, verdades mais profundas e mais elevadas. Daí ele ora no sentido de que os olhos do seu entendimento sejam iluminados: “Para que o Deus de nosso Senhor Jesus Cristo, o Pai da glória, vos dê em seu conhecimento o espírito de sabedoria e de revelação; tendo iluminados os olhos do vosso entendimento”. Esse é o objetivo supremo, mas antes de chegar a isso ele lhes lembra o que já são e o que já sabem. Esta descrição do cristão é uma descrição dos cristãos efésios daquele tempo. Eles nunca seriam membros da Igreja, nunca seriam destinatários desta carta, se estas coisas não fossem próprias deles. Vemo-nos, pois, confrontados aqui pelo que o Novo Testamento ensina que é o mínimo irredutível do que constitui um cristão.

Estou dando ênfase a isso porque me parece que a necessidade primária da Igreja na presente hora é compreender exatamente o que significa ser cristão. Como foi que os cristãos primitivos, que eram apenas um punhado de gente, tiveram tão profundo impacto sobre o mundo pagão em que viviam? Foi porque eles eram o que eram. Não foi a sua organização, foi a qualidade da sua vida, foi o poder que eles possuíam porque eram cristãos verdadeiros. Foi desse modo que o cristianismo venceu o mundo antigo, e cada vez me convenço mais de que essa é a única maneira pela qual o cristianismo pode influenciar verdadeiramente o mundo moderno. A falta de influência da Igreja Cristã no mundo em geral hoje, em minha opinião, deve-se unicamente a uma coisa, a saber (Deus nos perdoe!), que somos muito diferentes da descrição dos cristãos que vemos no Novo Testamento. Se, portanto, estamos preocupados com o estado em que a Igreja se encontra, se sentimos o peso dos homens e mulheres que estão fora da igreja e que, em sua miséria e aflição, estão se precipitando para a sua própria destruição, a primeira coisa que temos que fazer é examinarmos, e descobrir até que ponto nos amoldamos a este modelo e a esta descrição. O após-tolo descreve o cristão com três expressões. A primeira é “santos”. “Paulo, apóstolo de Jesus Cristo, pela vontade de Deus, aos santos...” – aos santos de Éfeso, aos santos de Laodicéia, aos santos de todas as outras igrejas locais, pequenas ou grandes. A primeira coisa a dizer do cristão é que ele é santo. Receio que isso soe um tanto estranho para alguns de nós. Temos a tendência de dizer: “Bem, eu sou cristão, mas estou longe de ser santo”. Tememos fazer tal afirmação; de algum modo tememos esta designação particular; e, contudo, o Novo Testamento se dirige a nós como a “santos”. Portanto, precisamos descobrir porque o apóstolo usa essa palavra, e o que se quer dizer com “santo”, em seu sentido neotestamentário.

A primeira coisa que o termo significa é que somos pessoas separadas. Esse é o significado radical da palavra que o apóstolo emprega aqui, e como outros escritores bíblicos a utilizam. Primariamente significa separado, posto à parte. Uma boa ilustração desse sentido vê-se no capítulo 19 de Atos dos Apóstolos, onde lemos que, quando surgiram certas dificuldades e oposições, o apóstolo separou os discípulos e então começou a reunir-se com eles na escola de Tirano (versículo 9), e se pôs a ensiná-los e a edificá-los na fé; ele os separou. Essa é a significação essencial da palavra “santo”, e a Igreja é um agrupamento de santos. A Igreja não é uma instituição, é primordialmente uma reunião, um encontro de santos. A ilustração perfeita é a dos filhos de Israel na antiga dispensação. Eles eram um povo separado por Deus, foram tirados do mundo, foi-lhes conferida por Deus uma certa singularidade, eram “povo de Deus”. São descritos como “a geração eleita, o sacerdócio real, a nação santa, o povo adquirido” ou “peculiar” (1 Pedro 2:9) – povo para ser uma possessão e um interesse especiais de Deus. Essa é a definição dos filhos de Israel no Velho Testamento (e.g., Êxodo 19:5,6; Deuteronômio 7:6(. Num sentido eles eram uma nação entre muitas outras, e, todavia, eram diferentes; eles tinham certos direitos que outras nações não tinham, haviam recebido de Deus certas revelações da Palavra de Deus a que Paulo se refere como “os oráculos de Deus”. Noutras palavras, eles eram um povo separado, no mundo mas não no mundo, postos à parte de maneira peculiar por Deus; quer dizer, eles eram “santos”. Assim, o cristão é primariamente alguém que é segregado do mundo.

O apóstolo diz precisamente a mesma coisa no início da sua carta aos Gálatas – “Graça e paz da parte de Deus Pai e da de nosso Senhor Jesus Cristo. O qual se deu a si mesmo por nossos pecados, para nos livrar do presente século mau, segundo a vontade de Deus nosso Pai”. Fomos libertados do mundo, separados do mundo. O cristão hoje, como os filhos de Israel da antiguidade, embora esteja no mundo, não é do mundo; é homem como os outros, e, todavia, é muito diferente. Isso é uma verdade básica, primária. O cristão não é semelhante a ninguém mais; ele é separado, posto à parte, único. Ele sobressai, ele foi chamado por Deus, foi separado do mundo, separado para Deus. Seria isso óbvio acerca do cristão atual? A separação não significa apenas que freqüentamos dominicalmente um local de culto, enquanto que muita gente não o faz. Isso é uma parte muito importante; no entanto não é a porte vital, por que essa frequência pode ser resultado de simples costume ou hábito, ou pode ser simples parte de roda social. A questão é: somos verdadeiramente separados como pessoas, somos essencialmente diferentes do mundo?

Não significa somente que fomos postos à parte num sentido externo; significa que fomos postos à parte porque fomos purificados interiormente. Esse é o real sentido da palavra “santo”. Instintivamente pensamos num santo como uma pessoa pura. Isso está certo, e devemos captar este segundo elemento do sentido desta palavra. Um santo é alguém que foi purificado de muitas maneiras. Ele foi purificado da culpa do seu pecado, purificado daquilo que o exclui da presença de Deus. Se ser santo significa que você foi tirado do mundo e levado à presença de Deus, não estaria claro que aconteceu algo que o habilitou a ir à presença de Deus? É o pecado que separa de Deus o homem; daí, antes de alguém poder ser separado para Deus, precisa ser purificado da culpa do pecado. Assim, essa é a primeira coisa que caracteriza o cristão; ele foi purificado, como nos lembra o apóstolo, pelo sangue de Cristo, “Em quem temos a redenção pelo seu sangue, a remissão das ofensas, segundo as riquezas da sua graça”.

Mas a purificação não pára nesse ponto. O santo é alguém que também foi purificado da corrupção do pecado. Não se trata de uma purificação externa apenas; também é interna, porque o pecado afeta o ser completo. Um santo é alguém que foi purificado daquilo que corrompe a sua mente e o seu coração, as suas ações, e tudo mais. Ele é purificado exteriormente, ele é purificado interiormente; ele se tornou, como a Bíblia lhe chama, uma pessoa “santa”. Ao Monte Sião a Bíblia se refere como “o monte santo”, e os vasos que eram utilizados no templo eram chamados “vasos santos”. Significa que eles foram purificados e postos à parte, e não eram utilizados para nenhuma outra coisa; eram “santos ao Senhor”. É isso que se quer dizer com “santo”; um santo é alguém que foi purificado e separado, e é “santo ao Senhor”. Antes de ser aplicado ao cristão, esse termo era aplicado originariamente aos filhos de Israel. “Vós sois uma nação santa, um povo peculiar”, um povo para ser propriedade particular de Deus.

Nesta altura faço dois comentários práticos. O primeiro é que estas observações se aplicam a todos os cristãos – aos santos de Éfeso, aos santos do mundo inteiro, aos fiéis de toda parte. Devemos aprender uma vez por todas a desfazer-nos da falsa dicotomia que o catolicismo romano introduziu neste ponto. Ele destaca certas pessoas e lhes chama “santos”. Não há nada de errado em pagar tributo a quem é proeminente; entretanto não é isso que os romanistas fazem. Eles chamam aquelas pessoas especiais de “santos”, e somente aquelas. Mas isso é errôneo e não é bíblico. Todo cristão é santo; você não pode ser cristão sem ser santo; e não pode ser santo e cristão sem ser separado deste mundo num sentido radical. Você não pode mais pertencer a ele, você está nele mas não é dele; há uma separação que se deu em sua mente, em sua perspectiva, em seu coração, em sua conversação, em seu comportamento. Você é uma pessoa essencialmente diferente; o cristão não é uma pessoa do mundo, não é governado pelo mundo e sua mentalidade e perspectiva. Devemos examinar-nos e descobrir se correspondemos a esta descrição. Porventura não é certo que a multidão de homens e mulheres que vivem ao redor de nós e por perto (muitos deles infelizes e inquietos acerca de si e de suas vidas) não vêm falar conosco e fazer-nos perguntas, não correm para nós em sua angústia, porque não nos acham em nada diferentes deles, porque não há nada em torno de nós que dê a idéia de que somos essencialmente diferentes? Aceitamos a falsa idéia de que somente certos cristãos são santos, não nos apercebemos de que o propósito é que todo cristão seja separado do mundo.

É justamente aqui que devemos ver toda a maravilha e todo o milagre da fé cristã. Recordem o tipo de cidade que Éfeso era. Leiam o capítulo 19 de Atos dos Apóstolos e verão que era uma grande cidade, e próspera, mas completamente pagã. Seus habitantes adoravam uma deusa chamada Diana, e eles gritavam “Grande é Diana dos efésios”. Orgulhavam-se de si e da sua deusa. Não somente isso, havia também muita prática de feitiçaria, magia e coisas do gênero. O apóstolo visitou a cidade, e tudo o que encontrou foi um grupo de doze homens que eram discípulos de João Batista, porém estes não tinham entendimento muito seguro da verdade. Vocês poderiam imaginar coisa mais desanimadora? Quando o apóstolo passeou pela cidade de Éfeso, viu-a quase completa-mente pagã, cheia de arrogância e orgulho, repleta de seitas e de tudo quanto se opõe a Deus. Que esperança havia de que o cristianismo florescesse num lugar como esse? Mas Paulo pregou e foi usado pelo Espírito; a igreja foi estabelecida, aqueles santos vieram à existência, e mais tarde Éfeso tornou-se a sede do trabalho do Apóstolo João. Precisamos lembrar-nos de que o evangelho não é ensino humano; é “o poder de Deus para salvação de todo aquele que crê”, e quando ele entra numa cidade, como fez na pessoa do apóstolo Paulo, cheio do Espírito Santo nada é impossível.

Você é um cristão que se sente sem esperança acerca de um marido, ou de uma esposa, ou filho, ou algum outro parente? Você acha que, por causa do intelectualismo deles, ou da instrução que receberam, ou do ambiente em que vivem, não há absolutamente nenhuma esperança de que sejam convertidos, e que nem se pode tentar consegui-la? Lembre-se dos santos de Éfeso, sim, e de Corinto e da Galácia. O evangelho é o poder de Deus; ele realizou feitos poderosos, e continua sendo o mesmo. Ele pode pegar o indivíduo mais destituído de qualquer esperança, e fazer dele' um santo. Essa é a função primordial, a coisa pela qual Deus o enviou.

Pois bem, passemos à segunda expressão – “fiéis”. Devemos ser cuidadosos quanto ao significado desse termo. Num sentido, é uma tradução um tanto infeliz, porque, mais uma vez, temos a tendência de lhe atribuir, não a significação primária, e sim um sentido secundário. Essencialmente, a palavra “fiel” significa “que exerce fé”. Para ilustrar isso, considerem o caso do apóstolo Tomé, e de como se recusou a crer no testemunho dos seus condiscípulos quando, após sua ausência, retornou a eles e estes lhe disseram que o Senhor tinha aparecido entre eles. Tomé disse que não acreditaria se não visse o sinal dos cravos e não pusesse o dedo nas feridas. Então o Senhor apareceu de repente e Se mostrou a Tomé e lhe disse que fizesse o que tinha dito. Tomé caiu a Seus pés e exclamou: “Senhor meu, e Deus meu!” Mas procurem lembrar como o nosso Senhor o repreendeu gentilmente e lhe disse: “Porque me viste, Tomé, crestes; bem-aventurados os que não viram e creram” . E acrescentou: “Não sejas incrédulo, mas crente”. A palavra traduzida em João 20:27 por “crente” é a mesma que traduzida por “fiéis” em nosso texto. Significa “estar cheio de fé”, exercer fé. O apóstolo escreve a estes cristãos de Éfeso como a crentes, a pessoas que exercem a fé; eles são cristãos porque são crentes.

Aqui também há algo fundamental, primário e vital. Você não pode ser cristão sem ter certa crença; o que nos faz cristãos é que cremos em certas coisas. Voltemos ao capítulo 19 de Atos dos Apóstolos. O que nos é dito (versículos 1 e 2) é que Paulo encontrou certos discípulos, porém não ficou satisfeito quanto a eles, pelo que lhes perguntou: “Recebestes vós já o Espírito Santo quando crestes? E eles responderam: “Nós nem ouvimos que haja Espírito Santo”. “Em que sois batizados então?”, perguntou-lhes, e eles responderam: “No batismo de João”. Então lhes disse Paulo: “Certamente João batizou com o batismo do arrependimento, dizendo ao povo que cresse no que após ele havia de vir, isto é, em Jesus Cristo”. Tendo ouvido isso, foram batizados em nome do Senhor Jesus.

Nesse incidente nos é dito claramente o que é que nos faz cristãos. O cristão não é meramente um bom homem, um homem bondoso, um homem que gosta de ser membro de uma igreja cristã, um homem vagamente interessado em elevação moral e no idealismo. Certos homens hoje descritos como cristãos proeminentes crêem tão-somente no que se chama “reverência pela vida”; mas isso não está de acordo com o ensino do Novo Testamento. O cristão é alguém que crê em certas verdades específicas; e a essência da sua crença centraliza-se na Pessoa do nosso Senhor Jesus Cristo. O cristão, o santo, é “cheio de fé”. Em quem e em quê? Fé no Senhor Jesus Cristo. Ele crê que Jesus de Nazaré é o Filho unigênito de Deus. Ele é cheio de fé na encarnação, crê que a Palavra eterna, “o Verbo foi feito carne e habitou entre nós”, que o Filho eterno veio em natureza humana a este mundo, crê no nascimento virginal, e que, por Seus milagres, Jesus tornou manifesto que Ele é o Filho de Deus.

Os santos de Éfeso criam nestas verdades; e Paulo foi capacitado a realizar milagres especiais em Éfeso como prova delas. Eles não criam superficialmente; sabiam no que criam. No entanto, acima de tudo, criam que Cristo Jesus veio a este mundo “para provar a morte por todo homem”, criam no fato de que é pelo Seu sangue que Ele nos salva, que Ele sofreu o castigo merecido pelos nossos pecados, e morreu sofrendo a nossa morte, para reconciliar--nos com Deus – “Em quem temos a redenção pelo seu sangue, a remissão das ofensas, segundo as riquezas da sua graça”. Eles eram cheios de fé nestas coisas. Criam firmemente que Ele tinha ressuscitado dentre os mortos. Não tinham simplesmente uma vaga crença em que Jesus persiste, mas tinham plena certeza de que Ele ressuscitou dentre os mortos e Se manifestou a muitos discípulos, e por último a este homem, Paulo. Também eram cheios de fé na Pessoa do Espírito Santo. Criam que o Espírito Santo fora enviado no dia de Pentecoste, que “a promessa do Pai” tinha vindo, e que Ele podia ser recebido, e que os crentes sabiam que O tinham recebido. Eles eram cheios de fé nestas coisas. E nós, somos “fiéis”? Somos cheios de fé? A questão vital não é se somos membros de igrejas locais, porém se somos cheios de fé nestas coisas. Sabemos em quem temos crido? Conhecemos a doutrina cristã? Entendemos o caminho da salvação como vem exposto nas Escrituras? Devemos estar “sempre preparados para responder a qualquer que vos pedir a razão da esperança que há em vós”, diz Pedro, confirmando Paulo.

Há ainda mais um sentido desta palavra “fiéis”, o sentido geralmente dado. Significa que guardamos a fé, que mantemos a fé, que somos constantes na fé, leais à fé, e que, com Paulo, estamos prontos a defender a fé e a lutar ardorosamente por ela. Significa que se pode contar conosco, que se pode confiar em nós porque conhecemos a fé, e porque cremos e confiamos no que ele significa. Não nos esqueçamos deste sentido secundário, que devemos ser pessoas nas quais as outras podem acreditar e confiar. Não devemos ser como os que são “levados por todo vento de doutrina” e cuja fé pode ser abalada pela leitura de um artigo ou livro escrito por algum dignitário da Igreja que nega a deidade de Cristo, ou o nascimento virginal e muitas outras doutrinas essenciais. Temos que ser fiéis, confiáveis, dignos de crédito; sabemos no que cremos, e estamos firmes com os apóstolos e outros numa sólida linha de defesa da fé contra todos os adversários.

Mesmo que nos sobrevenha terrível perseguição, não devemos acovardar-nos. A muitos daqueles cristãos primitivos se dizia que se eles persistissem em dizer que “Jesus é Senhor”, seriam mortos. Contudo, eles continuavam dizendo que “Jesus é Senhor”. Embora eu e vocês talvez não sejamos tentados deste modo particular, há cristãos noutras partes do mundo atual que têm que encarar a possibilidade de perder o trabalho ou o emprego ou a sua posição profissional, ou de serem separados das suas famílias, lançados na prisão, surrados ou baleados ou mutilados de algum modo terrível, simplesmente por causa da sua lealdade e esta fé. Eles estão firmes, são “cheios de fé”; pode-se confiar e descansar no fato de que eles resistirão até o último momento, e nunca vacilarão nem se acovardarão. Nem eu nem vocês, pelo menos no presente, temos que enfrentar perseguição aberta, mas temos que enfrentar escárnio e zombaria, e muitas vezes nos fazem estranhos e esquisitos. Eu e vocês temos que ser fiéis, aconteça o que acontecer, não importa quanto riso, mofa e zombaria tenhamos de enfrentar. Seja qual for o preço – financeiro, profissional – temos que ser fiéis, fidedignos, confiáveis, resistindo a todo custo, venha o que vier. O cristão é assim; ele sabe no que crê; e prefere morrer a negar a Cristo.

Depois, finalmente, há esta frase grandiosa, “em Cristo Jesus”. É sumamente importante compreendermos o que ela significa, e ela está ligada a “santos” bem como a “fiéis”. Eles são santos em Cristo Jesus, são fiéis em Cristo Jesus. Esta frase, como veremos repetida-mente à medida que percorrermos esta Epístola, é uma das grandes declarações características do Novo Testamento. Significa que o cristão é alguém que, não somente crê em Cristo, mas também, num sentido real, está “em Cristo”. Pertence a Ele, está unido a Ele, está ligado a Ele. Vejam a ilustração neotestamentária do corpo. “Vós sois o corpo de Cristo”, declara Paulo aos coríntios, “e seus membros em particular”. No capítulo 4 desta Epístola aos Efésios ele faz uso da mesma analogia. Diz ele que os cristãos, que formam a Igreja, são edificados como um corpo. Diz ele: Antes, seguindo a verdade em amor, cresçamos em tudo naquele que é a cabeça, Cristo. Do qual todo corpo, bem ajustado, e ligado pelo auxílio de todas as juntas, segundo a justa operação de cada parte, faz o aumento do corpo, para sua edificação em amor” (versículos 15 e 16). Portanto, ser cristão significa, não somente que você é crente em Cristo, exteriormente a Ele; você é crente porque está ligado a Ele, você está “nele”.

Vemos a mesma idéia no capítulo 5 de Romanos, onde Paulo elabora uma grande analogia e um contraste. Diz ele que todos nós estávamos originalmente em Adão. Adão não foi somente o primeiro homem, foi também o representante de toda a raça humana. Todo aquele que nasceu neste mundo estava em Adão, era uma parte de Adão, estava ligado a Adão, resultando em que a ação praticada por Adão teve consequências em todos. Contudo, o após-tolo continua e argumenta no sentido de que, assim como todos nós estávamos “em Adão”, agora estamos – os que somos cristãos – “em Cristo”. Como “em Adão”, assim “em Cristo”. Tudo o que o Senhor Jesus Cristo fez passa a ser verdade quanto a nós.

Também no capítulo 6 de Romanos Paulo desenvolve o tema e afirma que quando Cristo foi crucificado, nós fomos crucificados pp' Ele; quando Ele morreu, nós morremos com Ele; quando Ele foi sepultado, nós fomos sepultados com Ele; quando Ele ressuscitou, nós ressuscitamos com Ele. Ele está sentado nos lugares celestiais. No capítulo 2 da Epístola aos Efésios Paulo diz: “Deus nos ressuscitou juntamente com ele e nos fez assentar nos lugares celestiais em Cristo Jesus”. Estamos sentados nos lugares celestiais com Cristo neste momento porque estamos “em Cristo”. Que verdade tremenda, estonteante, irresistível – sou parte de Cristo, pertenço a Ele, sou membro do corpo de Cristo! Não sou meu, fui “comprado (adquirido) por preço”. Estou em Cristo. Ele é a cabeça, eu sou um dos membros. Há uma união vital, orgânica, mística entre nós. Todas as bênçãos que gozamos como cristãos nos vêm porque estamos em Cristo. “E todos nós recebemos também da sua plenitude, e graça por graça” (João 1:16). “Eu sou a videira verdadeira”, diz o nosso Senhor, “vós as varas”.

Tudo isso é para você, se você é cristão. Não fale da sua fraqueza ou desamparo; Ele é a Vida, e você está ligado à Vida, você faz parte da Vida, você é um ramo da Videira, “em Cristo”. Voltaremos a isso, mas vamos apossar-nos disso em princípio agora. Meditemos nisso, e permitam-me animá-los a fazê-lo concluindo com dois breves comentários. Por que vocês acham que, ao descrever o cristão, o apóstolo coloca estas três coisas na seguinte ordem – “santos”, “fiéis”, “em Cristo”? A resposta é muito simples. A primeira coisa e a mais evidente acerca do cristão sempre deve ser o fato de que ele é “santo”. O apóstolo tinha em mira a cidade de Éfeso; ele viu o que lhe parecia um oásis no deserto de riquezas, paganismo, feitiçaria e vida libertina. Sobressaindo no deserto, este verdejante oásis – a Igreja, os santos. Essa é uma boa maneira de ver o cristão . Quem quer que olhe para o mundo deve impressionar-se logo com o fato de que há nele certas pessoas que sobressaem e que são completamente diferentes porque são “santas”. Essa é primeira impressão que devemos causar; todos – vizinhos, amigos, colegas e companheiros de trabalho – devem saber que somos cristãos. Isso deve ser óbvio, deve sobressair porque somos o que somos, por causa destas coisas que nos caracterizam. Lemos a respeito do nosso bendito Senhor que Ele “não pôde esconder-se” (Marcos 7:24), e isso deve ser verdade a nosso respeito neste sentido; deve ser impossível esconder o fato. Mas não quer dizer que eu prego e imponho o meu cristianismo aos outros, tornando-me uma pessoa molesta. Trata-se antes de uma qualidade que recende santidade, algo que é cheio de graça e de encanto, uma tênue semelhança com o Senhor. Deve ser evidente e óbvio que somos um povo separado, um povo diferente, porque somos um povo santo.

A seguir notemos a importância de se manter intacta a relação entre ser santo e ser fiel, a relação entre a santidade e ser crente no Senhor Jesus Cristo. Estas coisas nunca devem ser separadas. Por mais que possamos iludir-nos, isso de cristão teórico não existe. É possível sustentar a doutrina da fé na sala de aulas, dar um assentimento intelectual a estas coisas, porém isso não faz de nós cristãos. Daí Paulo coloca “santos” antes de “fiéis”. Disse o Dr. William Temple: “Ninguém é crente, se não é santo, e ninguém é santo, se não é crente”. Estas duas coisas jamais devem ser separadas, nunca se deve abrir uma lacuna entre a justificação e a santificação. Se você é cristão você está em Cristo, e em Cristo o que acontece é que Ele “para nós foi feito por Deus sabedoria, e justiça, e santificação, e redenção” (1 Coríntios 1:30). Você não pode, você não deve tentar dividir Cristo. É falsa a doutrina que diz que você pode ser justificado sem ser santificado. É impossível; você é “santo” antes de ser “fiel”. Você foi separado. É por isso que você crê. Estas coisas estão entrelaçadas indissoluvelmente. Não permita Deus que as separemos ou que as dividamos, jamais! A santidade é uma característica de todos os cristãos e, se não somos santos, a nossa profissão de fé em Cristo não tem valor. Você não pode ser crente sem ser santo, e não pode ser santo, neste sentido neotestamentário, sem ser crente. “Portanto, o que Deus ajuntou não o separe o homem”.

 


Fonte: David Martyn Lloyd-Jones, O Supremo Propósito de Deus, Editora PES.



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