Duas Árvores

por

Arthur W. Pink

 

Gênesis 2

Não é nosso propósito proporcionar uma exposição detalhada e exaustiva de Gênesis, mas, sim, tentar selecionar alguns dos tesouros menos óbvios desta maravilhosa e rica fonte, na qual estão guardadas inesgotáveis provisões de riquezas espirituais. Este primeiro livro da Palavra de Deus é repleto de quadros simbólicos, prefigurações proféticas e um resumo dispensacional, bem como de importantes lições práticas, e será nosso deleite chamar atenção para alguns destes, à medida que passamos de capítulo para capítulo.

Ao estudarmos os ensinamentos simbólicos das Escrituras do Velho Testamento, delas aprendemos, algumas vezes, por contraste e outras por comparação. Uma ilustração surpreendente deste duplo fato, encontra-se no segundo capítulo de Gênesis. No nono versículo lemos: “E a árvore do conhecimento do bem e do mal”. Em At 5:30, lemos: “O Deus de nossos pais ressuscitou a Jesus, a quem vós matastes, pendurando-o num madeiro” (1); e, novamente , em 1Pe 2:24 “Carregando Ele mesmo em seu corpo, sobre o madeiro, os nossos pecados” (2). Agora, o leitor contemplativo naturalmente perguntará: Por que deveria a Cruz de nosso abençoado Senhor ser mencionada como uma “árvore”? Ao certo, deve haver algum significado mais profundo do que aquele que aparenta na superfície. Não seria intenção do Espírito Santo que nos referíssemos novamente a Gn 2:9 para compararmos e contrastarmos estas duas árvores? Cremos que sim, e uma meditação silenciosa sobre o assunto revela alguns aspectos extraordinários tanto de comparação como de contraste entre a árvore do conhecimento do bem e do mal e a árvore (madeiro) sobre a qual nosso Senhor foi crucificado. Vamos considerar, primeiro, alguns aspectos de contraste.

1.  A primeira árvore foi plantada por Deus. “Do solo fez o Senhor Deus brotar toda sorte de árvores agradáveis à vista e boas para alimento; e também a árvore da vida no meio do jardim e a árvore do conhecimento do bem e do mal” Gn 2:9. Então, esta árvore não foi plantada por Adão, mas pelo Criador de Adão – Deus. Mas a segunda árvore, a árvore sobre a qual nosso Senhor foi pregado, foi plantada pelo homem. “Depois de ( eles ) o crucificarem” Mt 27:35 é o breve, porém terrível registro. Foram as mãos humanas que planejaram, prepararam e erigiram aquela árvore cruel na colina do Calvário. Em marcante contraste com a primeira árvore, foram as mãos da criatura, e não do Criador, que plantaram a segunda árvore.

2.  A primeira árvore era agradável aos olhos. “Vendo a mulher que a árvore era boa para se comer, agradável aos olhos e árvore desejável para dar entendimento, tomou-lhe do fruto e comeu” Gn 3:6. Exatamente em que consistia esta “boa aparência” não sabemos, mas o registro Divino parece indicar que esta árvore era objeto de beleza e prazer. Que contraste com a segunda Árvore! Nela, tudo era feio e repulsivo. O Salvador sofredor, a multidão ofensiva, o escárnio dos sacerdotes, os dois ladrões, o sangue derramado, as três horas de trevas – nada havia ali que agradasse os olhos. A primeira árvore era “agradável aos olhos”, mas no que diz respeito Àquele, na segunda árvore está escrito – “Mas nenhuma beleza havia que nos agradasse” Is 53:2

3.  Deus proibiu o homem de comer da primeira árvore. “Mas da árvore do conhecimento do bem e do mal não comerás” Gn 2:17. Uma proibição divina foi colocada sobre a fruta desta árvore. Novamente, que diferença da segunda árvore! Que contraste assustador! Não há nenhuma restrição aqui. Neste caso, o homem é livremente convidado a se aproximar e comer do fruto dela. O pecador está oculto(?) para “Provai e vede que o Senhor é bom” Sl 34:8 . “Vinde, porque tudo já está preparado” Lc 14:17. A posição está corretamente invertida. No momento em que foi ordenado ao homem que não comesse da fruta da primeira árvore, agora lhe é ordenado que coma da segunda.

4.  Porque Deus proibiu o homem de comer da primeira árvore, Satanás usou de todos artifícios para conseguir que o homem comesse dela. Por outro lado, porque Deus, agora, convida o homem a comer da Segunda árvore, satanás utiliza todo o seu poder para evitar que o homem o faça. Não seria este um outro contraste intencional manifestado a nós pelo Espírito Santo? Humanamente falando, foi somente devido à astúcia e malícia do grande inimigo de Deus e do homem que nossos primeiros pais comeram da fruta proibida , e porque também não dizer que, atualmente, é principalmente devido aos conselhos sutis (astutos?) da velha serpente, o Diabo, que os pecadores são impedidos de comer da fruta da Segunda árvore?

5.  A ingestão do fruto da primeira árvore trouxe o pecado e a morte, “Porque, no dia em que dela comeres, certamente morrerás” Gn 2:17. Foi através da ingestão do fruto desta árvore que a maldição desceu sobre a nossa raça acompanhada de toda sua desgraça. Ao comer da segunda Árvore, alcança-se vida e salvação. “Em verdade, em verdade vos digo: se não comerdes a carne do Filho do Homem e não beberdes o seu sangue, não tendes vida em vós mesmos. Quem comer a minha carne e beber o meu sangue tem a vida eterna” Jo 6:53,54. Não há, nestas palavras do nosso Senhor, uma referência latente à história da queda do homem e um contraste intencional da primeira árvore? Se pelo ato de “comer” o homem perdeu sua vida espiritual, então, agora, por um mesmo ato de “comer”, ele obtém vida espiritual e eterna!

6.  Adão, o ladrão, quando comeu da primeira árvore, foi expulso do Paraíso , enquanto o ladrão arrependido, ao comer da segunda Árvore, entrou no Paraíso. Não duvidamos que há, novamente, uma antítese proposital nestes dois aspectos. Um ladrão está relacionado a ambas as árvores, pois ao comer da fruta proibida, nossos primeiros pais cometeram um ato de roubo. Então, não seria mais do que coincidência que encontrássemos um “ladrão” (sim, dois ladrões) relacionados à segunda Árvore também? E quando observamos as experiências amplamente diferentes dos dois ladrões, o ponto se torna ainda mais impressionante. Como dissemos, um foi expulso do Paraíso (o jardim), o outro, recebido no Paraíso e, para dizer o mínimo, é notável que nosso Senhor empregasse a palavra “Paraíso” nestas relações – a única vez que Ele a usou!

 

Vamos, agora, resumidamente, considerar alguns aspectos de comparação:

1.  Ambas as árvores foram plantadas num jardim. A primeira no jardim do Éden, a segunda, num jardim sem denominação. “No lugar onde Jesus fora crucificado, havia um jardim” Jo 19:41 Isto não nos é dito, por alguma razão, para que relacionássemos as duas árvores? Não seria um aspecto analógico impressionante que ambos, o primeiro Adão e o último Adão, morressem num “jardim”?

2.  Em relação às duas árvores, encontramos a palavra “no meio”. “A árvore da vida no meio do jardim e a árvore do conhecimento do bem e do mal” Gn 2:9. A palavra “e” unindo as duas árvores e anunciando sua justaposição no meio do jardim. De maneira semelhante lemos de nosso Salvador, “Onde o crucificaram e com ele outros dois, um de cada lado, e Jesus no meio” Jo 19:18.

3.  Ambas são árvores do Conhecimento do Bem e do Mal. Onde, em todo o mundo, ou em toda a Escritura, aprendemos do conhecimento do bem e do mal, como aprendemos com a segunda Árvore – a Cruz? Ali, vemos Deus encarnado. Ali, contemplamos a manifestação da Santidade de Deus como em nenhum outro lugar! Ali, descobrimos o insondável amor e a graça sem par da Divindade revelados como nunca antes. Mas ali também vemos o Maligno vê-la em todo seu horror nativo(?). Ali testemunhamos a consumação e o climax da iniquidade da criatura. Ali contemplamos, como em nenhum outro lugar, a baixeza, o horror, a feiura do pecado da maneira como ele se apresenta sob a ótica da santa trindade de Deus. Sim, há tanto uma semelhança como um contraste intencionais entre as duas árvores. A Cruz é também a árvore do conhecimento do bem e do mal.

4.  Finalmente, há uma outra árvore ao lado da que foi plantada no Éden, como indica Gn 3:6, “Vendo a mulher que a árvore era boa para se comer, agradável aos olhos e árvore desejável para dar entendimento, tomou-lhe do fruto e comeu”. Ah! Aquela segunda Árvore certamente também é “boa para se comer”. A Cruz de Cristo e tudo o que ela representa é o próprio alimento e essência da vida do crente. É “bom” como “alimento” para a alma! E quão “agradável” é aos “olhos da fé”! Nela vemos todos os nossos pecados cancelados. Nela, vemos nosso velho homem crucificado. Nela vemos a base sobre a qual um Santo Deus pode encontrar-se com um pecador culpado. Ali vemos a Obra Consumada de nosso adorável Redentor. Verdadeiramente, é “agradável aos olhos”. Não é esta segunda Árvore “desejável para dar entendimento” também? Sim, a pregação da Cruz não é somente o poder de Deus, mas também “sabedoria de Deus”. O conhecimento desta segunda Árvore torna o pecador “sábio” para salvação.

Para concluirmos esta breve meditação, vamos destacar um ou dois textos em que a “árvore” notabiliza-se com proeminência. Primeiro, aprendemos de Gn 3:17 que a “árvore” está diretamente ligada com a Maldição, “Visto que atendeste a voz de tua mulher e comeste da árvore que eu te ordenara não comesses, maldita é a terra por tua causa; em fadigas obterás dela o sustento durante os dias de tua vida”. À luz desta passagem, quão significativas são as seguintes: em Gn 40 , está registrado os sonhos dos dois homens que estavam na prisão juntamente com José. Ao interpretar o sonho do padeiro, disse José: “Dentro ainda de três dias, Faraó te tirará fora a cabeça e te pendurará num madeiro ” Gn 40:19. Novamente em Josué 8:29 lemos: “Ao rei de Ai, enforcou-o e o deixou no madeiro até à tarde; ao por do sol, por ordem de Josué, tiraram do madeiro o cadáver”. Ainda em Ester2:23 temos: “Investigou-se o caso, e era fato; e ambos foram pendurados numa forca (1) (tree). Isso foi escrito no Livro das Crônicas, perante o rei”. Que exemplos surpreendentes são estes diante do que encontramos em Gl 3:13, “Cristo nos resgatou da maldição da lei, fazendo-se ele próprio maldição em nosso lugar, porque está escrito: Maldito todo aquele que for pendurado em madeiro ”.!

“Apareceu o Senhor a Abraão nos carvalhais de Manre, quando ele estava assentado à entrada da tenda, no maior calor do dia. Levantou ele os olhos, olhou, e eis três homens de pé em frente dele. Vendo-os, correu da porta da tenda ao seu encontro, prostrou-se em terra e disse: Senhor meu, se acho mercê em tua presença, rogo-te que não passes do teu servo; traga-se um pouco de água, lavai os pés e repousai debaixo desta árvore” Gn 18:1-4. Que sugestivas são as últimas palavras desta citação. Por quê foi-nos feito saber que Abraão convidou seus três visitantes a “descansar sob a árvore”, a menos que haja algum significado simbólico para estas palavras? A “árvore”, como temos visto, fala da Cruz de Cristo , e é que se encontra “descanso”. Um aspecto adicional é revelado em Gn 18: 8: “Tomou-lhe também coalhada e leite e o novilho que mandara preparar e pôs tudo diante deles; e permaneceu de pé junto a eles debaixo da árvore ; e eles comeram”. Comer é símbolo de comunhão, e foi debaixo da árvore que estes três homens comeram; então, é a Cruz de Cristo que é a base e o fundamento de nossa comunhão com Deus. Que surpreendente, também, a ordem aqui: primeiro, descanse sob a “árvore”, e em seguida, coma , isto é, comungue!

 

NOTA: (1) A palavra “forca” está no original como árvore (tree).


Fonte:
Capítulo 2 do livro Gleanings In Genesis

 


Traduzido por:

Mariângela Paranaguá

Marcia C.C. Okimura (m.okimura@sercomtel.com.br)

 

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