A Pessoa de Cristo

por

Vincent Cheung





O Cristianismo bíblico afirma que Cristo possui duas naturezas, que ele é tanto divino quanto humano. Ele existe com Deus o Pai na eternidade como a segunda pessoa da trindade, mas tomou a natureza humana na ENCARNAÇÃO. O que resulta disso não compromete ou confunde a natureza divina com a humana, de modo que Cristo é totalmente Deus e totalmente homem, e permanecerá nessa condição eternamente. Às duas naturezas de Cristo subsistindo em uma pessoa dá-se o nome de UNIÃO HIPOSTÁTICA.

Algumas pessoas alegam que essa doutrina gera uma contradição; contudo, antes de providenciarmos respaldo bíblico para essa doutrina, vamos primeiro defender sua consistência lógica.

Recordemos nossas primeiras discussões sobre a Trindade. A formulação doutrinária histórica da Trindade diz: “Deus é um em essência e três em pessoa”. Essa proposição não é contraditória. Para haver uma contradição nós precisamos afirmar que “A é não-A”. Em nosso caso, isso se traduz assim: “Deus é um em essência e três em essência”, ou “Deus é um em pessoa e três em pessoa”. Afirmar que Deus é um e três (não um) ao mesmo tempo e num mesmo sentido é contradizer-se. Porém, nossa formulação doutrinária diz que Deus é um em um sentido e três em um sentido diferente: “Deus é um em essência e três em pessoa”. Além disso, embora cada uma das três pessoas componha de forma completa um único Deus, a doutrina não se torna um triteísmo desde que ainda haja um único Deus e não três.

A “essência” na formulação acima se refere aos atributos divinos ou a cada definição de Deus, tanto que todas as três pessoas de Deus preenchem completamente a definição de deidade. Mas isso não implica em um triteísmo porque cada definição de deidade inclui o atributo ontológico da Trindade, de modo que cada membro não é um Deus independente. O Pai, o Filho, e o Espírito são “pessoas” distintas porque representam três centros de consciência dentro da Divindade. Portanto, embora os três participem completamente da essência divina de modo a formarem um [único] Deus, esses três centros de consciência resultam em três pessoas dentro desse único ser Divino.

De modo similar, a formulação doutrinária da pessoalidade e encarnação de Cristo diz que ele é um em um sentido e dois em um sentido diferente. Que ele é um em pessoa, mas dois em natureza.

Para esclarecer essa formulação doutrinária, nós precisamos definir os termos e compará-los à formulação doutrinária da Trindade. Do mesmo modo que “natureza” é usada na formulação doutrinária da encarnação, “essência” é usado na formulação doutrinária da Trindade. Eles se referem à definição de algo, e a definição de algo muda de acordo com os atributos ou propriedades desse algo. Pessoalidade é novamente definido pela consciência ou intelecto. Agora, a definição de Deus inclui o atributo ontológico da Trindade, e embora exista um só Deus, existem três pessoas divinas ocupando completa e igualmente os mesmo atributos que definem a deidade.

Na encarnação, Deus o Filho tomou para si a natureza humana; isto é, ele adicionou à sua pessoa a parte dos atributos que definem o homem. Ele fez isso sem sobrepor uma natureza a outra, de maneira que ambos os atributos permanecem independentes. Assim, sua natureza divina não se misturou à sua natureza humana, e sua natureza humana não foi divinizada por sua natureza divina. Essa formulação também protege a imutabilidade de Deus o Filho, uma vez que a natureza humana não modifica em nada sua natureza divina.

A objeção de que os atributos divino e humano necessariamente se contraditam quando possuídos por uma mesma pessoa falha em não perceber que esses dois atributos são independentes no Deus o Filho. Por exemplo, Cristo não era onisciente em relação a seus atributos humanos, mas era onisciente em relação a seus atributos divinos, e isso é verdade ainda hoje. Seus atributos divinos não divinizaram seus atributos humanos.

Essa formulação doutrinária da encarnação é imune à contradição, desde que nós não afirmemos que Cristo é um e dois ao mesmo tempo e num mesmo sentido. O que afirmamos é que Cristo é uma pessoa com dois tipos de atributos. Visto que essa formulação não degenera em uma contradição lógica, isto é estabelecido como verdade se pudermos demonstrar que Cristo é tanto Deus quanto homem através de exegese bíblica.

Iremos primeiro considerar algumas passagens que indicam a DEIDADE de Cristo. No início de seu Evangelho, o apóstolo João refere-se a Jesus Cristo como o logos , ou a Palavra :

“No princípio era aquele que é a Palavra. Ele estava com Deus, e era Deus. Ele estava com Deus no princípio. Todas as coisas foram feitas por intermédio dele; sem ele, nada do que existe teria sido feito.” (João 1:1-3, NVI)

O verso 1 começa afirmando a pré-existência de Cristo, dizendo que ele existia antes do evento da criação. O próprio Cristo confessou sua pré-existência em João 8, dizendo, “Eu lhes afirmo que antes de Abraão nascer, Eu Sou” (v.58) A palavra Deus (grego: theos) nesse verso se refere ao Pai, e “a Palavra estava com Deus” indica que Cristo não é idêntico ao Pai em termos de sua pessoalidade. Contudo, ele não é menos que Deus em termos de seus atributos, pois o verso continua a dizer, “a Palavra era Deus.” Essa é uma indicação explícita da atribuição de deidade a Jesus Cristo. As palavras, “Ele estava com Deus no princípio”, no verso 2, novamente afirmam sua pré-existência e o fato de que ele é distinguível do Pai.

O verso 3 fala de Cristo como o agente da criação, dizendo, ‘Todas as coisas foram feitas por intermédio dele; sem ele, nada do que existe teria sido feito”. Isso concorda com a cristologia de Paulo, que escreveu em Colossenses 1:16, “Pois nele foram criadas todas as coisas nos céus e na terra, as visíveis e as invisíveis,sejam tronos ou soberanias, poderes ou autoridades;todas as coisas foram criadas por ele e para ele”. Cristo não somente é o criador do universo, mas ele agora sustenta sua própria existência. Paulo diz que “nele tudo subsiste” (v.17). Foi através de Cristo que Deus “fez o universo” e é também Cristo que “sustenta todas as coisas por sua palavra poderosa” (Hebreus 1:2-3).

Colossenses 2:9 diz, “Pois em Cristo habita corporalmente toda a plenitude da divindade”. Tito 2;13 diz, “aguardamos a bendita esperança: a gloriosa manifestação de nosso grande Deus e Salvador, Jesus Cristo”. Em Hebreus 1:3 lemos, “O Filho é o resplendor da glória de Deus e a expressão exata do seu ser”. Hebreus 1:8 faz uma aplicação messiânica do Salmo 45:6-7, quando Deus diz a Cristo, “O teu trono, ó Deus, subsiste para todo o sempre; cetro de eqüidade é o cetro do teu Reino”. Assim, o próprio Deus o Pai declara que Jesus é Deus, e diz que seu domínio é “para todo o sempre”. Finalmente, Paulo escreve em Filipenses 2:6 que Cristo, “embora existindo na forma de Deus,” tomou sobre si atributos humanos.

Agora nós veremos algumas passagens que indicam a HUMANIDADE de Cristo. Após afirmar fortemente a deidade de Cristo, o apóstolo João escreve em seu Evangelho , “Palavra tornou-se carne e viveu entre nós” (João 1:14). Hebreus 2:14 diz, “Portanto, visto que os filhos são pessoas de carne e sangue, ele também participou dessa condição humana, para que, por sua morte, derrotasse aquele que tem o poder da morte...”. Paulo é muito explícito a respeito da humanidade de Cristo quando escreve em 1 Timóteo 2:5, “Pois há um só Deus e um só mediador entre Deus e os homens: o homem Cristo Jesus”.

Várias passagens na Bíblia indicam que, em sua natureza humana , Jesus tinha verdadeiras limitações. Por exemplo, ele esteve “cansado da viagem” em João 4:6, faminto em Mateus 21:18, e sedento em João 19:28. E o mais significante, “ele sofreu a morte” (Hebreus 2:9) para comprar a salvação para seus eleitos.

Algumas passagens na Bíblia afirmam ou implicam tanto a divindade quanto a humanidade de Cristo. Por exemplo, João 5:18 diz que os Judeus procuravam matar a Jesus porque ele “estava dizendo que Deus era seu próprio Pai, igualando-se a Deus.” Eles o viram como um homem, mas ele reivindicava ser Deus. João 8:56-59 descreve outro conflito semelhante a este:

‘Abraão, pai de vocês, regozijou-se porque veria o meu dia; ele o viu e alegrou-se'. Disseram-lhe os judeus: ‘Você ainda não tem cinqüenta anos, e viu Abraão?'. Respondeu Jesus: ‘Eu lhes afirmo que antes de Abraão nascer, Eu Sou!'. Então eles apanharam pedras para apedrejá-lo, mas Jesus escondeu-se e saiu do templo.

As pessoas reconheceram que em sua vida humana, Jesus não tinha ainda cinqüenta anos de idade e afirmava conhecer pessoalmente a Abraão. Aqueles que o ouviram não contestaram sua humanidade, mas entenderam que suas palavras continham uma reivindicação de divindade.

Mateus 22:41-45 também afirma que Jesus é tanto Deus quanto homem:

Estando os fariseus reunidos, Jesus lhes perguntou: “O que vocês pensam a respeito do Cristo? De quem ele é filho?”. “É filho de Davi”, responderam eles. Ele lhes disse: “Então, como é que Davi, falando pelo Espírito, o chama ‘Senhor'? Pois ele afirma: ‘O Senhor disse ao meu Senhor: Senta-te à minha direita, até que eu ponha os teus inimigos debaixo de teus pés'. Se, pois, Davi o chama ‘Senhor', como pode ser ele seu filho”.

Os fariseus reconheceram que o Cristo deveria ser o filho de Davi, e como filho de Davi, Cristo deveria ser humano. Contudo, enquanto estava “falando pelo Espírito”, de modo que não poderia estar errado, Davi chamou Cristo de “Senhor”, como uma designação de divindade. Portanto, o Cristo deveria ser o descendente humano e o divino Senhor de Davi – Cristo deveria ser Deus e homem.

 

(Teologia Sistemática, páginas 125-128)



Nota sobre o autor: Vincent Cheung é o presidente da Reformation Ministries International [Ministério Reformado Internacional]. Ele é o autor de mais de vinte livros e centenas de palestras sobre uma vasta gama de tópicos na teologia, filosofia, apologética e espiritualidade. Através dos seus livros e palestras, ele está treinando cristãos para entender, proclamar, defender e praticar a cosmovisão bíblica como um sistema de pensamento compreensivo e coerente, revelado por Deus na Escritura. Ele e sua esposa, Denise, residem em Boston, Massachusetts. [http://www.rmiweb.org/]

 


Tradução: Márcio Santana Sobrinho
Revisão: Felipe Sabino de Araújo Neto


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