Como a Doutrina Afeta o Evangelismo?
Os Métodos Divergentes de Asahel Nettleton e Charles Finney

por

Rick Nelson

O Batista do Sul mediano (se tal pessoa existe) oferece um olhar desconcertante quando escuta o nome de Asahel Nettleton, o último grande evangelista que adotou a doutrina da graça. Embora Nettleton (1783-1844) tenha visto trinta mil pessoas se converterem durante uma década de ministério ativo no ínicio do século XIX, seu legado se viu afetado por uma negligência trágica, se não por um ativo desprezo, por parte dos historiadores eclesiásticos contemporâneos.

Por outro lado, Charles Finney (1792-1875) tem sido recentemente o tema de outro tratamento biográfico extensivo. [1]. Amplamente considerado como o pai do avivamento moderno, Finney representa o período de mudança do Calvinismo para o Arminianismo como a teologia dominante para o evangelismo. Os conservadores amam a Finney por seu zelo evangelístico e os liberais enfocam com orgulho seu envolvimento na reforma social. Mark A. Noll se refere a Finney como "a figura crucial no evangelismo dos americanos brancos depois de Jonathan Edwards", com um impacto mais profundo na vida da nação que Ralph Waldo Emerson, Daniel Webster ou Horace Mann. [2]

O legado de Finney moldou de maneira geral a teologia e metodologia do evangelismo, e de forma particular o evangelismo dos Batistas do Sul. A publicação de suas principais obras, "Lições sobre o Avivamento da Religião" e "Lições sobre Teologia Sistemática", produziram um impacto no evangelismo, o qual tem alcançado os nossos dias. A ênfase que os Batistas do Sul dão à aspectos como cruzadas simultâneas, preparação de cruzadas de avivamento, sistema de convite público e ao uso de reuniões de avivamento como uma estratégia evangelística são pelo menos em parte, atribuíveis à considerável influência de Finney no evangelismo de seus dias.

Um cuidadoso estudante da história dos Batistas do Sul sabe que até os ínicios do século XX, a doutrina reformada da salvação foi a posição geralmente aceita na vida da Convenção. Hoje os Batistas do Sul adotam "uma hermenêutica da Grande Comissão" que coloca uma maior importância na resposabilidade humana do que na soberania divina no tema da soteriologia ou doutrina da salvação. [3] Como resultado desta mudança de filosofia, os Batistas do Sul adotaram uma estranha mistura híbrida de Calvinismo e Arminianismo. Querem ser Calvinistas ao afirmarem o estado pecaminoso do homem e a perseverança da salvação genuína, porém recusam seguir as doutrinas Reformadas da eleição incondicional, da redenção particular e da natureza triunfante da graça divina. Bill Leonard corretamente caracteriza como confusa a soteriologia dos Batistas do Sul:

Os herdeiros das tradicões Calvinistas e Arminianas freqüentemente têm selecionado e popularizado diversas doutrinas da salvação, as quais, quando se unem, têm o potencial de criar sérias confusões teológicas. [4]

O estado desconcertante da doutrina da salvação dos Batistas do Sul tem produzido uma mescla de resultados. Jesus pessoalmente reconheceu que até o Reino dos Céus contém uma mescla de trigo genuíno com trigo falso, na Parábola do Trigo e do Joio (Mat. 13:24-30, 36-43). Embora os Batistas do Sul orgulhosamente reivindiquem a distinção de ser a maior denominação não-Católica dos Estados Unidos, frutos espiritualmente enfermos permanecem nas igrejas até o ponto do Presidente da Convenção Batista do Sul (SBC) enfatizar a necessidade de uma conversão genuína entre os membros das igrejas, de acordo com seu discurso de assembléia em 1997. Quando milhões de nossos membros não mostram nenhuma verdadeira evidência bíblica de conversão, assistindo às igrejas fielmente e vivendo pelo menos uma vida cristã nominal, não mostrará a nossa amada Sião dos Batistas do Sul estar contaminada pelo pragmatismo e pelo orgulho se nos atrevermos a mencionar que o problema se encontra em uma metodologia carente de sólidos fundamentos doutrinais? O inimigo é suficientemente capaz de semear a falsa semente no campo sem a ajuda dos sinceros, todavia descuidados, Batistas do Sul, os quais não analisam o raciocínio inerente em alguns métodos populares evangelísticos.

Este artigo afirma de maneira contudente que a crença de uma pessoa, igreja ou denominação acerca da salvação tem uma relação direta com o evangelismo que elas praticam. [5] A doutrina da salvação modela a metodologia evangelística. A crença é que uma sã doutrina da salvação deve produzir uma prática sã de evangelismo.

 

Asahel Nettelton - Reavivalismo Teocêntrico

 


Seguindo a corrente teológica de Jonathan Edwards, que enfatizou a responsabilidade humana com a visão Calvinista, Asahel Nettelton representou a essência do Calvinismo da Nova Inglaterra em seus dias. Embora se mativesse firme a cada um dos princípios do Sínodo de Dort (também conhecido como os Cinco Pontos do Calvinismo) como o entenderam seus predecesores da Teologia da Nova Inglaterra (Edwards, Joseph Bellamy, e Timothy Dwight), ele primeiramente e como o mais importante creu que seu sistema doutrinal era a verdadeira revelação bíblica. [6]

O sistema de crenças de Nettleton podem se resumir assim: O homem, sendo totalmente pecador em sua natureza e por sua própia escolha, não pode salvar-se a si mesmo. [7] Pela graça de Deus, alguns foram escolhidos para a vida eterna. [8] Para aqueles escolhidos por Deus (os eleitos), Jesus ofereceu um sacrifício penal substitutivo por seus pecados, na cruz. [9] Os eleitos, por quem unicamente Jesus morreu, serão chamados pela triunfante graça de Deus ao arrependimento e salvação pela fé em Cristo Jesus [10]. Eles serão guardados por Deus para a salvação eterna. [11]

Os seres humanos devem ser divinamente regenerados ou terem anulada sua natureza pecaminosa, antes de que possam se arrepender e crer em Cristo para a salvação. [12] No sistema de Nettleton, a habilidade humana para responder a cada etapa da salvação vem de um ato supremo de Deus. Se não existe uma ação da parte de Deus, o homem permanecerá perdido e sem esperança. [13]

A metodologia de Nettleton correspondia à sua teologia. Ele utilizou a pregação como um meio para atrair os pecadores à convicção de seus pecados. Ele impregnou todos seus esforços evangelísticos com orações fervorosas e humildes ao único Deus que pode efetuar a regeneração do pecador. Para aqueles que respondiam ao chamado, se realizavam reuniões independentes dos serviços preparados; Nettleton oferecia reuniões de consulta, as quais eram essencialmente grupos evangelísticos e sessões de aconselhamento. Nestas reuniões, as pessoas podiam receber ajuda pessoal sem a pressão do público para aceitar o evangelho.

Poucos homens alcançaram o nível de experiência que demostrou Nettleton com seu evangelismo pessoal. Ele foi um cirurgião especializado nas almas. Motivava àqueles que se haviam mostrado interessados pela pregação, a estabelecer o assunto da salvação de maneira privada diante de Deus. As multidões vinham a uma fé salvadora em Cristo como resultado de seu ministério em "lugares de perdição" e em igrejas de todos os tipos e tamanhos. Poucos de seus convertidos abandonaram sua profissão de fé para regressar ao mundo.


Charles Finney - Reavivalismo Antropocêntrico

Charles Finney determinou desde seus primeiros dias como jovem cristão a atuar contra o que ele cria que eram os efeitos danosos do evangelismo Calvinista e adotado por homens como Nettleton. Crendo o mesmo ser um corretivo para uma ênfase exagerada na soberania divina, Finney enfocou a responsabilidade do homem como um agente moral livre.

Devido ter sido educado como advogado e ser tragicamente carente de uma educação teológica, sua leitura das Escrituras o persuadiu a ver a salvação em termos de uma filosofia moral e legalista. Tais princípios demandavam que aqueles responsáveis de obedecer à lei, deveriam ser livres para obedecer. Enquanto Nettleton concedeu a maior importância à liberdade de Deus, Finney escolheu enfatizar a liberdade do homem.

Finney cria que o homem era voluntariamente e não constitucionalmente pecador. A eleição para salvação era o resultado de uma divina presciência de uma resposta do homem ao evangelho. O sacrifício feito por Jesus pagou não pelos pecados de alguns como uma pena substitutiva, mas permitiu a Deus perdoar aos pecadores sem violar Sua própria lei nem Sua própria natureza. [14]

Michael Horton resumiu exatamente as crenças de Finney: "Deus não é soberano, o homem não é pecador por natureza; o sacrificio não é um pagamento verdadeiro pelo pecado; a justificação por imputação é um insulto à razão e à moral; o novo nascimento é simplesmente o efeito de técnicas bem sucedidas; e o avivamento é o resultado natural de campanhas estratégicas". [15]

Porque os homens são agentes morais livres, Finney cria que eles podiam recusar a graça de Deus. E mesmo depois do arrependimento e de professar a fé em Cristo, a salvação final da pessoa permanecia sem definir-se esperando ser estabelecida através da obediência até a morte. [16]

A teologia de Finney o levou a perceber que só um inimigo, uma vontade difícil de mudar, impedia a salvação das pessoas. Cada método utilizado por Finney foi avaliado na base de sua eficácia em "romper" a vontade obstinada dos pecadores. O pragmatismo dominava o ministério de Finney. Utilizando uma série de métodos que já estavam sendo usados, Finney revolucionou o evangelismo e deu nascimento ao avivamento moderno. Popularizou uma forma mais dramática de pregação, usou a oração pública como uma ferramenta para aplicar pressão nos pecadores, permitiu às mulheres orar nas reuniões públicas, denunciou seus oponentes, mudou a tradição aceita nas reuniões de consulta, organizou pequenos grupos de oração e equipes de visitas nas casas, iniciou as campanhas evangelísticas de larga duração, e abriu o caminho para o que mais tarde seria o sistema público de apelo. Estas novas medidas causaram grande controvérsia, porém também, de acordo com o reportado, trouxe mais de quinhentas mil pessoas "a uma renovação". [17]

Aplicações para o Evangelismo Contemporáneo

Estes resultados são aplicáveis ao evangelismo moderno em dois níveis. Primeiro, Que princípios podem ser obtidos deste estudo? Segundo, quem oferece um melhor exemplo para o futuro do evangelismo dos Batistas do Sul, Nettleton ou Finney?

Metodologicamente as similitudes entre Finney e Nettleton oferecem um excelente ponto de partida para os princípios de aplicação. Se a pregação está marcada por paixão e fidelidade às Escrituras, à aplicação pessoal pertinente, à apresentação clara e ao poder espiritual, o evangelismo será eficaz. Se os ministros e membros das igrejas tomam a atividade da oração como o fizeram Finney e Nettleton e seus colaboradores nas reuniões, o evangelismo será revolucionado. Eles não só praticaram a oração pessoal, mas também organizaram orações nas igrejas preparando reuniões evangelísticas. Se as pessoas interessadas na mensagem evangelística são aconselhadas apropriadamente, sem ser publicamente pressionadas a fazer decisões prematuras (e portanto falsas), os resultados do evangelismo seriam conservados em uma porcentagem mais alta, com decisões mais duradouras. Se os ministros e membros das igrejas praticassem um evangelismo pessoal teologicamente preciso, as igrejas seriam transformadas por uma introdução de uma nova vida espiritual.

Se os Batistas do Sul tomassem a estes dois grandes evangelistas do passado como modelos para o futuro evangelístico, qual destes dois homens seria o melhor candidato a seguir? Duas razões me levam a escolher Nettleton: (1) O legado de Finney não pode suportar a pressão de um minucioso exame; e (2) quanto mais se observa o legado de Nettleton, mais se obtém um panorama claro e aparece um equilibrio doutrinal.

O legado de Charles Finney tem sido discutido por muito tempo. O professor de evangelismo do Southeastern Seminary, Prof. Alvin L. Reid, diz:

À Finney se lhe atribui o haver providenciado o ímpeto para a mudança do trabalho de Deus ao trabalho de homens no reavivamento e no despertamento espiritual. O convite público, cultos de larga duração (agora chamados serviços de avivamento ou simplesmente avivamento) e a preparação de tais reuniões, podem ser atribuíveis em grande medida a Finney. Ele tem sido elogiado e condenado por esta mudança. Avaliando a Finney, devemos recordar que ele estava reagindo à fria e inerte versão extremista do Calvinismo de seus dias. [18]

 

Muitas das multidões alcançadas pelo ministério de Finney, regressaram ao mundo depois que a influência do carismático evangelista desapareceu. B. B. Warfield advertiu que "uma grande proporção daqueles que foram atraídos às igrejas pela emoção do serviço evangelístico de avivamento, não foram realmente convertidos, como claramente se notou tempos depois". [19]

Para que alguém não despreze a Warfield como um Calvinista de Princeton e inimigo de Finney, apresentemos os testemunhos dos amigos de Finney e seus colaboradores James Boyle e Asa Mahan, que oferecem mais evidência de que o trabalho de Finney deve ser visto com sérias reservas, senão suspeitas. James E. Johnson admitiu dar credibilidade à "acusação de que muitas pessoas foram atraídas pela emoção das reuniões evangelísticas avivadas, as quais nunca experimentaram uma mudança de coração". [20] Boyle escreveu a Finney em 1834:

Olhemos os campos onde você e outros, e eu mesmo, temos trabalhado como ministros do evangelho, e qual é seu estado moral agora? Qual foi seu estado depois de três meses de havermos deixado-os? Eu tenho visitado e revisitado muitos destes campos, e meu espírito geme ao ver o triste, frígido, carnal e contencioso estado em que muitas das igrejas têm caído mui pronto depois de nossa partida. [21]

 

Mahan escreveu em sua Autobiografia que não somente muitas das pessoas que se convertiam supostamente nas campanhas, mas também pastores das igrejas que dirigiam as reuniões e ainda os evangelistas das mesmas, sofriam quedas morais e espirituais posteriormente. Ele escreveu:

Eu pessoalmente conheci a quase todos eles - eu não posso recordar um só homem, excetuando o irmão Finney e o pai Nash, que não haviam perdido a unção depois de uns quantos anos, e que haviam chegado a ser igualmente desqualificados para serem evangelistas ou pastores. [22]

 

Michael Horton tem tomado uma liderança vigorosa entre os cristãos que atacam o legado de Finney. Horton apresenta a Finney como o pai espiritual do movimento de crescimento das igrejas, do Pentecostalismo e do avivamento político. Ele acusou a Finney (com as próprias palavras de Finney) de negar as doutrinas fundamentais: o pecado original, a pena substitutiva como motivo para o sacrifício na cruz e a divina natureza do novo nascimento. [23]

Devido Finney repudiar os princípios básicos da histórica fé cristã, Horton lhe chama não somente de um inimigo do Protestantismo evangélico, mas também do Cristianismo histórico no sentido mais amplo. Horton aceita que Finney estava correto em um único ponto: "O Evangelho sustentado pelos teólogos de Westiminster e certamente adotado por todo o grupo de evangélicos, que ele atacou diretamente, é 'outro evangelho', em distinção do proclamado por Charles Finney".

Horton faz uma grande pergunta para aqueles evangélicos que com total desconhecimento e em nome do êxito evangelístico, têm colocado a Finney no pedestal de herói: "Para qual evangelho nos inclinaremos?" [24]

Monte Wilson de maneira correta relaciona a Finney com as mudanças nos métodos evangelísticos e observa a análise incorreta de Finney, de ser a natureza humana a raiz de suas crenças de que os avivamentos podem ser planejados, promovidos e propagados pelo homem. A tendência moderna de confiar em técnicas para a preparação das campanhas avivadas, pode ser atribuída à aceitação das falsas premissas de Charles Finney. Quando o evangelismo é avaliado somente com base nos resultados, Finney é o responsável desta técnica. Quando os ministros que não produzem os numeros apropriados são desgraçadamente retirados dos púlpitos, se observa então o comentário de Finney: "um bom ministro será bem sucedido, ainda que detrás da tragédia". [25]

Finney cria que se todos os membros seguissem seu exemplo, o avivamento varreria a terra, através dos séculos. Somente uma década depois que seu livro enfocando a metodologia do avivamento, Lições no Avivamento da Religão, foi publicado, ele se queixou que as reuniões evangelísticas haviam declinado tanto em quantidade como em qualidade. Wilson comenta acertadamente: "Pelos próprios estandardes de Finney, seus ensinamentos em como produzir convertidos e avivamentos, assim como suas crenças, foram examinadas como incorretas". [26] Só a eternidade mostrará quantos dos que começaram a sentir uma convicção genuína de pecado nos avivamentos de Finney, foram pressionados através de uma decisão de salvação falsa, e a pôr em perigo a salvação de suas almas.

Finney chegou a ser o responsável de mudar a teologia que sustém o evangelismo. Assim como o Arminianismo suplantou o Calivinismo, assim o homem suplantou a Deus como o centro da teologia do evangelismo. Robert H. Lescelius corretamente declara que isto tem se mantido predominantemente desde o evangelismo americano. [27]

A teologia e o ministério de Finney se construíram sob a falsa premissa de que o Calvinismo pôe em perigo o evangelismo. Sessenta e cinco pessoas se haviam convertido na igreja na qual Finney foi batizado nos dois anos antes de sua conversão. [28] Finney chegou à fé em Jesus Cristo no meio de uma campanha de avivamento regional durante um período quando o Calvinismo dominava o panorama teológico.

A premissa se mantém tão falsa hoje como nos dias de Finney. Um contemporâneo de Finney na Grã-Bretanha, o pregador Charles Haddon Spurgeon, construiu uma grande igreja e esteve comprometido com a doutrina bíblica da salvação.
O fenomenalmente popular programa de treinamento para testemunho, o Evangelismo Explosivo, veio de um pastor presbiteriano, Dr. James Kennedy, cuja igreja continuou o crescimento com base numa teologia reformada. O pregador radical e escritor John MacArthur Jr., pastoreia uma igreja próspera e sustenta as visões reformadas. Alguém pode defender exitosamente a premissa de que tomar a posição Arminiana é chegar a ser mais evangelístico que uma igreja com teologia reformada. [29] Este argumento simplista não foi correto nos dias de Finney e não o é agora.

O legado de Finney deve ser catalogado como perigoso devido à natureza antropocêntrica de sua teologia e aos métodos resultantes de dita teologia. [30] Em seu esforço para refutar o que ele viu como uma forma extrema do Calvinismo, Finney fez uma mudança de direção de forma desordenada, longe de Deus, e para a participação do homem na salvação. Seu evangelismo não enfocou o ponto principal do evangelho, uma transformação sobrenatural e divina dos seres humanos, de pecadores a santos. Seu avivamento deixou atrás igrejas que caíram em piores condições, porque eles estabeleciam novas medidas ou despediam ministros de Deus que não possuiam o estilo de pregação evangelística adotado por eles. Cada método de Finney deve ser reavaliado de maneira crítica até suas mais profundas bases teológicas. Para o futuro bem-estar do evangelismo, o útil deve ser separado do perigoso com respeito ao ministério de Charles Finney.

Por outro lado, Asahel Nettleton demonstrou a sanidade potencial do evangelismo baseado numa sã doutrina. O ministério de Nettleton não prejudicou às igrejas; as edificou. Os ministros que trabalhavam junto a ele se sentiram abençoados como colaboradores pastorais. Nettleton entendeu que a igreja se mantinha ainda depois de que o evangelista seguia para outros lugares. Ele cria na suma importância de preservar a saúde da igreja.

Comparado com o alto grau de deserção deixado por Finney, Nettleton manteve um número notório na retenção de membros nas igrejas, produto de suas reuniões. Geralmente os pastores testificavam que depois de mais de vinte e cinco anos, quase todos os convertidos continuaram sendo fiéis seguidores de Jesus Cristo. [31]

Ainda que os números de Nettleton não se comparem com os de Finney, alguém deve se preguntar: Quantos daqueles que supostamente Finney ganhou voltaram ao mundo? Comparado com Finney, Nettleton trabalhou numa área geográfica muito menor. Os lugares onde ele ministrou tinham uma menor densidade de povoação. Devemos nos perguntar, então: Que haveria acontecido se Nettleton huouvesse ido às povoações que Finney visitou?

Asahel Nettleton entendeu que a teologia determina a metodologia.[32] Ele conscientemente trabalhou com as almas de tal forma que dava honra à intervenção divina, a qual produzia a verdadeira conversão. O testemunho de Bennet Tyler descreveu o ministério de Nettleton como sendo semelhante a suaves chuvas que nutriam terras secas e produziam frutos espirituais duradouros.[33] James Ehrhard escreveu que o mais supreendente para os leitores atuais é o descobrimento de que a grande eficácia de Nettleton ocorreu sem a utilização dos métodos que os evangelistas atuais pensam que ser essenciais para o evangelismo. [34] Nettleton testou a metodologia através dos estandardes das Escrituras, porque ele sabia que qualquer outro caminho causaria em última instância a ruína, não importando quão bem sucedido ele pudesse parecer.

O legado de Nettleton oferece aos Batistas do Sul, melhores fundamentos para o futuro do evangelismo. Ele não estava certo porque era Calvinista; ele estava certo porque ele avaliou o que era certo e o que era errado pela revelação bíblica, ao invés do razão humana. [35] Ele cria que o homem era totalmente pecador por natureza, porque a Biblia assim ensina. Ele cria que Deus deve realizar o primero ato na salvação, porque Jesus assim o declara claramente em João 6:44 e 6:65. Ele cria que o sacrifício na cruz foi uma pena sustitutiva porque ele viu que as Escrituras assim o apresentavam. Ele cria que as pessoas podem ser reconciliadas com Deus somente pela fé em Jesus Cristo e através do arrependimento para com Deus, pelo ensinamento bíblico. Ele cria que os crentes genuínos seriam finalmente conhecidos por suas vidas santificadas, já que isto é um princípio bíblico.

Os Batistas do Sul têm estabelecido constantemente sua aliança com a revelação bíblica. Deveriam então reavaliar seu compromisso com o evangelismo pragmático de Finney comparando-o com o da Biblia. Encontrariam que suas posições com respeito à natureza humana devem ser repudiadas. Finney estava equivocado acerca de que o sacrifício na cruz não foi um pagamento pelos pecados de ninguém em particular. Ele cria que a participação humana tinha um papel mais importante na salvação do que o que dizem as Escrituras. Os erros doutrinais de Finney causaram erros na prática, os quais ainda abundam entre os Batistas do Sul hoje, especialmente na pobre porcentagem de retenção dos recém-convertidos.

O trabalho de J.I. Packer, Evangelismo e a Soberania de Deus, representa uma posição mais bíblica. Iniciando com a crença de que Deus é soberano sobre todas as coisas e particularmente na salvação, Packer descreve a tensão bíblica da soberania divina e a responsabilidade humana como uma antinomia que deve ser aceita. [36] Packer adverte àqueles que enfatizam a responsabilidade do homem em detrimento da soberania divina que tal enfoque leva a um evangelismo pragmático e calculado com uma filosofia similar à lavagem cerebral.

Ele aceita que tal evangelismo seria apropriado se a produção de conversos, e não a proclamação fiel da verdade, fosse a responsabilidade do cristão.[37] Packer também oferece uma advertência àqueles que negam a responsabilidade humana para exaltar a soberania divina. A tentação para estas pessoas é o negar da responsabilidade evangelística de todos os crentes sob a crença de que Deus salvará aos eleitos. Packer reprova estas crenças, chamando-as de apatia evangelística "inescusável". [38]

Citando o exemplo de Spurgeon, que disse que nunca tentaria reconciliar amigos, Packer oferece uma perspectiva sadia e balanceada que reconhece a mútua dependência das aparentes verdades contraditórias. Ele sabiamente aconselha: "Na Bíblia, a soberania divina e a responsabilidade humana não são inimigas....São amigas e trabalham juntas". [39]
Isto leva Packer à seguinte conclusão: "O melhor método evangelístico...é o que faz possível a mais completa e exautiva explicação das boas novas de Cristo e de Sua cruz, e a mais exata e penetrante aplicação das mesmas". [40]

Como crentes professantes da autoridade bíblica, os Batistas do Sul crêem na pecaminosidade humana e devem posicionar-se contra Finney, junto àqueles que afirmam que os homens são pecadores e necessitam de salvação, sem a capacidade de se auto-induzirem à uma reforma moral. Eles crêem que a salvação vem de um Deus santo e cheio de graça que providenciou um sacrifício substitutivo na morte de Seu Filho, Jesus Cristo. Crêem que a salvação deve ser achada por meio do arrependimento e fé em Cristo como resposta ao chamado da graça da parte de Deus através do poder de convicção do Espírito Santo.

Estas crenças deveriam impulsionar os Batistas do Sul a repudiar suas associações ideológicas e metodológicas com Charles Finney e a acercar-se ao modelo desenvolvido por Asahel Nettleton, que representa a teologia e práticas nas quais a Convenção foi fundamentada. Finney creu que necessitava se mover para o Arminianismo para alcançar resultados. Sua influência causou um movimento extremista em direção à responsabilidade do homem. Os Batistas do Sul necessitam voltar a revisar a mudança excessiva de Finney para com o homem e alcançar o equilíbrio bíblico em sua teologia e prática novamente.

Nos dias recentes, o autor se regozijou ao escutar o Dr. Timothy George dizer que é bom que os Batistas do Sul se encontrem reabrindo diálogos acerca destes assuntos tão importantes. É positivo, como o Dr. George disse, que estejamos falando da doutrina da salvação nestes dias, em lugar da ordenação de homossexuais no ministério. Testifica a autencidade da autoridade bíblica em nossa família da fé. Reunamo-nos portanto, com Bíblias abertas, corações abertos, reuniões oontroladas por Cristo, e reestabeleçamos o equilíbrio correto com os Batistas do Sul no assunto relacionado com a soberania divina e a responsabilidade humana na doutrina da salvação.


1 Charles E. Hambrick-Stowe, Charles G. Finney and the Spirit of American Evangelicalism, Library of Religious Biography, ed. Mark A. Noll, Nathan 0. Hatch, and Allen C. Guelzo (Grand Rapids, MI, and Cambridge, England: William B. Eerdmans Publishing Company, 1996).

2Mark A. Noll, A History of Christianity in the United States and Canada (Grand Rapids, MI: William B. Eerdmans Publishing Company, 1992), 176-77.

3 Charles S. Kelley Jr., How Did They Do It: The Story of Southern Baptist Evangelism (n.p.: Insight Press, 1993), 21.

4Bill J. Leonard, "Getting Saved in America: Conversion Event in a Pluralistic Culture," Review and Expositor 82, no. 1 (Winter 1985): 123.

5 O material deste artigo foi extraído de minha dissertação, "A Relação da Sotereologia e a Metologia Evangelística nos Ministérios de Asahel Nettleton e Charles G. Finney" (Ph.D. diss., Southwestern Baptist Theological Seminary, 1997).

6 Bennet Tyler, Memoir of the Life and Character of Rev. Asahel Nettleton, D.D., 2d ed. (Hartford: Robins & Smith, 1848), 273.

7 Asahel Nettleton, Asahel Nettleton: Sermons from the Second Great Awakening, with an introduction by Tom Nettles and a preface by Bennet Tyler (Ames, IA: International Outreach, 1995), 394-95.

8Ibid., 240.

9Ibid., 236.

10Ibid., 105. Nettleton pregava, "É certo que Cristo terminará a grande obra pela qual Ele Se responsabilizou. Ninguém que Ele designou salvar, se perderá eternamente".

11 Ibid., 195.

12 Ibid., 60-73, veja o sermão de Nettleton intitulado, "Genuine Repentance Does Not Precede Regeneration (O Arrependimento Genuíno Não Precede a Regeneração)."

13 Ibid., 89, onde Nettleton declara que "a única base de esperança no caso de pecadores descansa na soberana misericórdia de Deus".

14 Muitos evangélicos se chocam ao ouvir isto sobre Finney, mas ouça suas próprias palavras: "É verdade, que a expiação, de si mesma, não assegura a salvação de ninguém; mas a promessa e o juramento de Deus, que Cristo terá uma semente para Lhe servir, provê tal segurança". Charles G. Finney, Lectures on Systematic Theology, ed. James H. Fairchild (Oberlin, OH: E. J. Goodrich, 1878, reprint, Whittier, CA: Colporter Kemp, 1844), 281. Page references are to the reprint edition. Itálico meu.

15Michael S. Horton, "O Legado de Charles Finney," Premise 2, no. 3, 27 March 1995 [journal on-line], available from http://www.public.usit.net/capo/premise/95/march/horton-f.html. Internet.

16 Finney, Lectures on Systematic Theology, 550, escreve, "Se a salvação final dos santos é certa, é certa somente sob uma condição, que sua perseverança na obediência até o fim da vida seja certa".

17 Paulus Scharpff, History of Evangelism: Three Hundred Years of Evangelism in Germany, Great Britain, and the United States of America, trans. Helga Bender Henry (Grand Rapids: William B. Eerdmans Publishing Company, 1966), 109; John Mark Terry, Evangelism: A Concise History (Nashville: Broadman & Holman Publishers, 1994), 146.

18Evangelism and Church Growth: A Practical Encyclopedia, s.v. "Charles Grandison Finney (1792-1875)," by Alvin L. Reid, 235. Reid is far too pessimistic in his view of the Calvinism of Finney's day. Bob Pyke states that "the leading Calvinistic ministers during the Second Great Awakening were all men who agreed that evangelism needed to insist on immediate faith and repentance, and that the older Calvinism had distorted accountability by emphasizing too much the sinner's dependence on God." Bob Pyke, "Charles G. Finney and the Second Great Awakening," Reformation & Revival Journal 6, no. 1 (Winter 1997): 47.

19 Benjamin Breckenridge Warfield, Perfectionism (New York: Oxford University Press, 1931), 2:23; Joseph I. Foot, "Influence of Pelagianism on the Theological Course of Rev. C. G. Finney, Developed in His Sermons and Lectures,: Literary and Theological Review 5 (March 1838): 39, wrote that "during ten years, hundreds, and perhaps thousands, were annually reported to be converted on all hands; but now it is admitted, that his (Finney's) real converts are comparatively few. It is declared, even by himself that 'the great body of them are a disgrace to religion.' "

20 James E. Johnson, "The Life of Charles Grandison Finney" (Ph.D. diss., Syracuse University, 1959), 399-400.

21Quoted in Warfield, Perfectionism, 2:26. The letter is not in the Finney Papers.

22Asa Mahan, Autobiography: Intellectual, Moral, and Spiritual (London: T. Woolmer, 1882), 229.

23 Horton, "The Legacy of Charles Finney," Internet.

24 Ibid. Pyke, 53, notes that Finney's theory of the atonement "was enough outside the pale of orthodoxy to have been considered heretical in previous centuries."

25 Monte A. Wilson, "Charles Grandison Finney: The Aftermath," Reformation & Revival Journal 6, no. 1 (Winter 1997): 97-99. Finney's statement is the title of one of his Lectures on Revivals of Religion, 161-79.

26 Wilson, 100.

27 Robert H. Lescelius, "The Second Great Awakening: The Watershed Revival," Reformation & Revival Journal 6, no. 1 (Winter 1997): 23. Pyke, 33 -34, writes, "By the end of the [nineteenth] century, American evangelicalism bore little resemblance to that of 1800. The theology of conversion was no longer theocentric, the focus in evangelism now being on man and his responsibility, not on God, His holiness, and His saving mercy."

28 Wilson, 100.

29 MacArthur também vê Finney com suspeita e conclui que "o legado real de Finney é o impacto desastroso que ele teve sobre a teologia evangélica e a metodologia evangelística americana". John F. MacArthur Jr., Ashamed of the Gospel: When the Church Becomes Like the World (Wheaton and Nottingham, England: Crossway Books, 1993), 235.

30 Pyke, 39, observes that "the rough, compel-them-to-come-in, results-oriented style which marked Finney's ministry is evident from the outset. As was so characteristic of his career, after initial enthusiasm and superficial success (abetted, it would seem, by human effort and armtwisting), results invariably fell off."

31 "Robert A. Swanson, "Asahel Nettleton: The Voice of Revival," Fundamentalist Journal 5, no. 5 (May 1986): 51.

32 Lescelius, 29.

33Bennet Tyler, New England Revivals As They Existed at the Close of the Eighteenth and the Beginning of the Nineteenth Centuries (Boston: Massachusetts Sabbath School Society, 1846; reprint, Wheaton: Richard Owen Roberts, Publisher, 1980), 7 (page citations are to the reprint edition).

34James Ehrhard, "Asahel Nettleton: The Forgotten Evangelist," Reformation & Revival Journal 6, no. 1 (Winter 1997): 85-86.

35 Finney, por outro lado, rejeitou doutrinas tais como o pecado original, porque ele as considerava ofensivas à razão humana. John Stanley Mattson crê que Finney considerava a Bíblia e a razão como sendo co-iguais, como fontes fundamentais de autoridade. John Stanley Mattson, "Charles Grandison Finney and the Emerging Tradition of 'New Measure' Revivalism" (Ph. D. diss., University of North Carolina at Chapel Hill, 1970), 197.

36 "J. I. Packer, Evangelism and the Sovereignty of God (Downers Grove, IL: InterVarsity Press, 1961), 18-22. O presidente do Seminário do Sul, R. Albert Mohler Jr., enfatizou que a soberania divina e a responsabilidade humana "são verdades paralelas" em sua mensagem de convocação, na primavera de 1997. James A. Smith Sr., "Mohler: God's Sovereignty & Human Responsibility True," The Tie 65, no. 2 (Spring 1997): 27.

37Packer, 27-28. O observador sábio vê o padrão do evangelismo de Finney nesta ênfase. John F. MacArthur Jr. acusa Finney de ser a origem do pragmatismo evangélico moderno: "Finney foi o primeiro evangelista influente a sugerir que os fins justificam os meios". MacArthur, 233.

38Packer, 32-34.

39 Ibid., 35-36.

40Ibid., 90. Asahel Nettleton incorporou tal evangelismo balanceado porque ele afirmava a soberania divina e a responsabilidade humana como igualmente bíblicas e realizou seu ministério dentre da tensão da antinomia que elas representam. Finney escolheu a posição extrema que favorece a liberdade humana, mas negligencia a soberania divina.

 


Tradução livre: Felipe Sabino de Araújo Neto
Cuiabá-MT, 24 de Abril de 2003.