Teorias da Expiação

por

Paul Mizzi

 

Diversas teorias da expiação têm sido propostas durante toda a história da igreja. Consideraremos as mais importantes como uma explicação do porque somente a última mencionada é bíblica, enquanto as restantes são falsas.

(1) "Cristo identifica-se completamente com o homem e como um participante dos nossos sofrimentos nos expôs o perfeito exemplo de auto-sacrifício a Deus”.

O que é dito acima é verdadeiro até certo ponto. Mas quando você aplica tal declaração em referência ao propósito inteiro da expiação, então, ela se torna uma deturpação grosseira.

Certamente, Cristo identifica-se com o homem até ao ponto em que Ele se encarnou e tabernaculou entre nós. Com o propósito de salvar o homem, Ele se identificou com o homem, participando da mesma carne e sangue. Ele é descrito como nosso grande sumo sacerdote, capaz de simpatizar com os fracos e pecaminosos homens que somos. Ele também participou de nossos sofrimentos, nascendo em pobreza e suportando tentação, privação, calúnia e toda sorte de perseguição imaginável. Ele é o “homem de dores e experimentado nos sofrimentos”. Finalmente sua obediência à vontade do Pai O levou a sofrer sobre uma cruz.

Assim, toda a Sua atitude, comportamento e dependência de Deus é colocada diante de nós como um modelo para que imitemos. “Porque para isto sois chamados, pois também Cristo padeceu por nós, deixando-nos o exemplo, para que sigais as suas pisadas” (1 Pedro 2:21). Sim, ali encontramos a perfeita imagem para nós, o que significa ser totalmente consagrado a Deus.

Mas esta teoria da expiação é falha não pelo que ela propõe, mas pelo que ela deixa não dito. Porque o apóstolo, continuando seus pensamentos, nos dá o verdadeiro significado do Calvário imediatamente depois: “Levando ele mesmo em Seu corpo os nossos pecados sobre o madeiro, para que, mortos para os pecados, pudéssemos viver para a justiça; e pelas suas feridas fostes sarados”.

A expiação, portanto, efetuou a remoção do pecado pelo sacrifício. Não é o nosso próprio sacrifício que obtém o perdão e a salvação.

(2) "O grande fato expiatório é a nossa fé e arrependimento aceitáveis, induzidos pela visão da morte de Cristo na cruz”.

Nossa fé e arrependimento nunca são ditos expiar pecados pessoais. Ao contrário, eles são descritos como dons do Cristo ressurreto (Filipenses 1:29; Atos 5:31), e como meios instrumentais de salvação, isto é, pela fé nos tornamos participantes de Cristo e fugimos para Ele para salvação.

Mas a própria salvação foi adquirida por Ele. “Havendo feito por si mesmo a purificação dos nossos pecados” (Hebreus 1:3). Não há nada para nós fazermos a fim de completar ou fazer a salvação completa. Antes, é o sangue de Cristo que expia (Romanos 5:11), isto é, produz a reconciliação com Deus.

Na Bíblia, nunca somos informados e nunca somos intimados para que quando as pessoas ouçam sobre a morte de Cristo, eles sintam pesar e se voltem para Deus, e neste próprio ato eles decretam a salvação para si mesmos. Se fosse assim, então, a salvação pertenceria ao homem, e não a Deus.

(3) “Cristo satisfez a justiça de Deus por sua simpática identificação com os nossos pecados e com o arrependimento vicário deles”.

Quase toda teoria falsa tem um ar de verdade ao redor dela; após uma examinação é descoberto o que ela realmente é – a fabricação da mente humana, e não a interpretação de Deus do Calvário. Realmente Cristo identificou-se com os pecadores (não com os nossos pecados), a ponto de submeter-se ao batismo de João.

Mas é uma idéia completamente estranha a Escritura dizer que Ele arrependeu-se vicariamente de nossos pecados. Pelo contrário, nós temos que nos arrepender de nossos próprios pecados. O arrependimento é uma graça salvadora, dada de cima; mas o homem tem que se arrepender, não Cristo. O arrependimento, em outras palavras, é dever e responsabilidade do homem. “Arrependei-vos, pois, e crede no evangelho”, Cristo pregou. Cristo morreu uma morte substitutiva, o justo pelo injusto; na aplicação de Sua expiação, o Espírito então opera o arrependimento em nós, tendo nos dado um coração novo na regeneração.

Finalmente, Cristo satisfez a justiça de Deus, não por um arrependimento vicário, mas pelo derramamento de Seu sangue (Romanos 3).

(4) "Nossa visão dos sofrimentos expiatórios de Cristo nos dissuade de pecar. Através disso, Deus é capaz de perdoar nossos pecados sem comprometer Seu governo moral do mundo”.

Tais sentimentos se originaram na mente de Hugo Grotius (1583-1645). Conhecida como a teoria governamental da expiação, esta teoria concorda com as três primeiras [listadas acima] na sustentação de que a natureza divina não necessita ser propiciada.

Ela sustenta em vez disso que Deus, para manter o respeito por Sua lei, deixou um exemplo de Seu ódio pelo pecado na morte de Cristo. A atitude de sofrimento da parte de Cristo supostamente toca de uma tal forma nos corações dos homens que eles se arrependem; e visto que o arrependimento é a única condição para o perdão, Deus assegura a salvação do pecado pela morte de Cristo. Deus é satisfeito com menos do que é esperado, por assim dizer.

Mas esta teoria não explica o porque este Exemplo deve ser uma Pessoa inocente; ela não explica a intensidade dos sofrimentos de Cristo (Marcos 15:23; Lucas 22:44; Mateus 27:46); e nega o aspecto fundamental da expiação, isto é, o de fazer uma satisfação da santidade de Deus.

(5) “Cristo propiciou a ira de Deus e expiou nossa culpa através de um cumprimento completo das demandas de Sua lei, tanto em seus preceitos como em suas penalidades”.

Considero esta sentença como contendo, em sua essência, uma declaração verdadeira e balanceada da expiação.

A morte de Cristo demonstrou o amor e a justiça de Deus simultaneamente. Os atributos de Deus, sendo um todo harmonioso, foram honrados no Calvário, e vindicados no tempo e na eternidade. A propiciação da ira de Deus por Cristo é uma revelação do amor de Deus por um mundo pecador (João 3:16).

Pela própria iniciativa de Deus, Cristo veio não somente para nos mostrar o caminho para o Pai, mas para realmente e de fato nos libertar da ira e da escravidão ao pecado, e nos justificar por Seu sangue. “Nisto está o amor de Deus, que Ele enviou Seu Filho para ser uma propiciação pelos nossos pecados” (1 João; veja também Romanos 3).

A lei de Deus tem sido honrada. Deus nunca poderia aceitar algo menor. Isto, Cristo fez por Sua perfeita conformidade à lei: “Não vim para destruir a Lei e os profetas; mas para cumpri-los”. Mas, ao morrer como um substituto, Ele suportou a penalidade da mesma lei, que é a morte.

Dessa forma, o que era impossível para nós fazer, Cristo fez em nosso lugar e como nosso representante. As seguintes abaixo são apresentadas na Escritura, quando ela fala da expiação de Cristo:

1. Todos os homens são pecadores.
2. Todos os pecadores estão em desesperado perigo por causa de sua culpa.
3. A salvação acontece somente porque Deus em Seu amor a desejou e executou.
4. A salvação depende do que Deus fez em Cristo.
5. Tanto a divindade como a humanidade de Cristo estão envolvidas no processo.
6. Cristo era pessoalmente inocente.
7. Embora a importância da vida de Cristo não deve ser minimizada, a importância central está ligada à Sua morte (obediência ativa e passiva).
8. Em Sua morte Cristo se fez um com os pecadores. Ele tomou o lugar deles (2 Coríntios 5:21; Gálatas 3:13; Hebreus 9:28; 1 Pedro 3:18, etc.).
9. Por sua vida, morte, ressurreição e ascensão Cristo triunfou sobre Satanás e o pecado e toda força concebível do mal (Colossenses 2).
10. Cristo assegurou um veredicto. Ele realizou a salvação poderosamente, mas também legalmente. Deus é capaz de justificar pecadores sobre a base de Sua morte (Romanos 3:26).
11. Em Sua morte Cristo revelou a natureza de Deus como amor (1 João 4:10; Romanos 5:6,8,10).
12. Esses eventos demandam de nós uma resposta: Deus ordena que todos os homens em todo lugar se arrependam (Atos 17). Evidentemente a morte de Cristo foi substitutiva, vicária e penal. Nisto é onde o peso do testemunho profético e apostólico descansa.


Traduzido por: Felipe Sabino de Araújo Neto
Cuiabá-MT, 19 de Maio de 2004.