Discutindo o Natal (Novamente)

por

Josaías C. Ribeiro Jr.

 


Sou completamente a favor da comemoração do Natal, não porque necessite dessa festa para me lembrar da vinda de Cristo, mas porque nenhum argumento até hoje utilizado é “bíblico o suficiente” (como se existisse isso) para impedir a comemoração da festa.

Antes de entrarmos nos assunto, notemos algumas peculiaridades da história do Natal, conforme os Evangelhos. Um detalhe que passa despercebido, depois de tanto ouvirmos a história, é a própria festa organizada por Deus, mesmo enquanto Maria e José lutavam para encontrar uma hospedagem decente para o bebê. O próprio Deus e Criador do Universo designou anjos para cantarem e anunciarem a chegada de Seu Filho Amado, trouxe pastores para verem o bebê, alegrarem a festa e alegrarem-se com a festa.

Dias depois, uma estrela (não vamos entrar em detalhes quanto á natureza da estrela) foi movida, a fim de que magos — literalmente homens pagãos, para os judeus da época — encontrassem o bebê e pudessem presentear e adorar o Rei dos Judeus. Poderíamos gastar um bom tempo comentando a alegria de João Batista, ainda no ventre de sua mãe, ao sentir a presença do Messias, ou o hino de Maria pela chegada do Cristo, e também a satisfação do velho Simeão pela vinda de Jesus, a ponto de ele não desejar mais nada nesta vida.

Me pergunto se, com tantas pessoas, seres celestiais e a própria criação comemorando, festejando e se alegrando com a chegada de Jesus, deveríamos nos privar do mesmo sentimento. Outro ponto importante é que o Verbo se tornando carne e habitando entre nós é o cumprimento da Festa dos Tabernáculos, instituída pelo próprio Deus através da Lei. A chegada de Cristo é uma Festa em seu cumprimento pleno, no mais perfeito sentido da palavra e da forma mais divina.

Com tanta alegria tomando a Terra, não tenho dúvida de que deveríamos festejar isto todos os dias, mas isto é impossível, logicamente — além do que a morte e resssurreição de Cristo formam o ponto crucial de nossa crença. Porém, a impossibilidade de Ceias de Natal diárias não tira a possibilidade de um dia designado especialmente para pensarmos profundamente no assunto.

Acredito que é um dia em que as pessoas estão mais abertas para a pregação do Evangelho (não por causa do dia, mas pelo excelente estrategista que é o Espírito Santo e que se utiliza de todas as formas para chamar aqueles que O aprazem), e não há dúvidas de que o dia de Natal faz as pessoas pensarem sobre o assunto. Faltar a uma comemoração de Natal de seus amigos, vizinhos, parentes não-cristãos é agir de forma contrária a Paulo que fez-se “tudo a fim de ganhar todos” (1 Co 9.22).

Mas, sem desenvolver muito os argumentos a favor, vamos tratar dos argumentos contra.


“O Natal veio de festas pagãs!”

Com base em 1 Co 8.8 e usando as palavras de C. Mattew McMahon (um cara que não comemora o Natal, diga-se de passagem): “Árvores não nos tornam mais agradáveis a Deus. Nem mesmo perus, presentes, guirlandas ou presunto feitos para a ocasião do Natal (...) O Natal não pode ser condenado por causa de suas origens pagãs. O Natal, tão pagão quanto possa ser, e quantas ideologias pagãs possa conter, não pode ser condenado porque há 1000 anos, 500 anos ou 5 dias atrás, alguém se prostrou diante de uma árvore e cometeu idolatria. (Pessoas usam molduras em suas casas para colocar fotos, molduras estas feitas de madeira — deveríamos detê-las já que elas sabem que aquilo algum dia foi uma árvore e alguém há 500 anos atrás adorava árvores?). O cristão não é preso por suposições do tipo se não estiver se prostrando diante delas, se sua consciência está tranquila perante Cristo, uma vez que tenha estudado e refletido sobre as implicações e informações biblíco-históricas do assunto, e se é realmente tudo que se diz” [1].

O fato de reinos pagãos verem deuses em árvores nada significa, e por esta lógica, deveríamos nos privar dos benefícios do Sol, da Lua, dos mares, chuva e todas as outras manifestações dos atributos visíveis e invisíveis de Deus na criação (Rm 1.18), inclusive deveríamos deixar de visitar zoológicos e nos relacionar com seres humanos, visto que eles também são alvo da natural tendência humana à idolatria (Rm 1.23).


“Foi a Igreja Católica que inventou!”

Péssimo argumento que se utiliza do preconceito natural que muitos evangélicos têm pelos costumes católicos. É verdade que isto vem desde a época da Reforma e alguns usam as palavras dos primeiros reformadores a respeito do assunto como argumento. Mas aqueles homens viviam num contexto completamente diferente, que era resgatar as doutrinas cristãs originais, e isso com certeza os influenciava sob vários aspectos (vide a antipatia de Lutero pela carta de Tiago).

De qualquer forma, em primeiro lugar, ninguém sabe ao certo "quando, como e qual" Igreja Católica inventou. Lembremo-nos que até a primeira divisão da Igreja, entre romanos e gregos, só existia Igreja Católica – que quer dizer “universal” – e até a Reforma Protestante, todo cristão ocidental era católico, tanto que no Credo Apostólico, muitas igrejas protestantes usam a expressão “Creio na Igreja Católica...”.

Não tenho nenhuma dificuldade em dar mais crédito a escritos de católicos do passado, como Santo Agostinho, Santo Anselmo, Santo Irineu e São Justino, entre outros, que às teorias da conspiração de muitos “evangélicos” do presente. Da mesma forma, o fato de um escritor antigo e importante, seja Agostinho, Lutero ou Calvino, tomarem uma posição sobre determinado assunto não nos dá a obrigação de ter a mesma opinião (evidentemente, não estou falando de conceitos básicos da Escritura).

Em um bom texto, Cleriston Andrade, colaborador do CAPC, cita algo interessante - muitos (incluo aqui historiadores sérios) afirmam que o Domingo foi escolhido como dia de culto pela malvada Igreja Católica de Roma pra confrontar os pagãos que comemoravam sua festa dedicada ao Sol nesse dia – por isso, os saxões e descendentes, o chamam de "Sun-day". Parece muito com o caso do Natal ou é impressão minha? Deveríamos repensar esta prática de cultuar no domingo? Mas não se esqueça que o Satur-day também errado, pois era designado pra outro deus, a saber, Saturno. [2]


O Princípio regulador do culto

Este é o argumento usado pelos reformados tradicionais (como C. Mattew McMahon, citado acima). Nos ensina a não acrescentarmos nada no culto além do que foi ensinado na Bíblia. Concordo com a idéia e a preocupação dos reformadores quanto a isto, e devemos sempre estar atentos em relação a inovações no culto.

Mas com base apenas na falta de unidade das opiniões dos cristãos reformados [3], tenho de fazer a polêmica sugestão, com todo o respeito, de que se regule melhor o princípio regulador, numa ideal associação entre a Bíblia e o bom-senso. Enquanto isto impede que muitas bobagens do tipo unção do riso, do leão e da centésima ovelha (e por aí vai) tomem conta das igrejas cristãs, se levarmos o princípio ao seu outro extremo, teríamos de excluir EBDs, cultos para as crianças, apresentação dos visitantes, cantatas, grupos vocais, etc.


Conclusão

Evidentemente, estamos falando da festa realizada pela comunidade cristã - não estou de forma alguma apoiando o consumismo, glutonaria e toda essa palhaçada de nossa sociedade, que desvirtuou o motivo original da festa. Por isso, a Igreja deve preocupar-se em conscientizar as pessoas - especialmente as crianças - de que a festa de Natal é apenas uma celebração simbólica instituída, e não literalmente o aniversário de Jesus Cristo. Além de, claro, deixar claro que o Papai Noel, e crendices relacionadas, são tão importantes e relevantes para o Natal quanto o Homem-Aranha é para o Dia da Reforma. Fora essa exortação, não vejo motivo para não glorificar a Deus e pregarmos o Evangelho através desta festa que relembra algo tão magnífico, que marca a história, tanto do homem quanto da salvação.

“Portanto, quer comais quer bebais, ou façais, qualquer outra coisa, fazei tudo para glória de Deus.“ (1 Coríntios 10.31)


(Escrito em meio a (mais) um debate sobre o Natal – 21/12/2004)


NOTAS:

[1] Embora discorde da opinião sobre o Natal do autor, faço minhas as palavras dele ao rebater os argumentos mais comuns. O texto (em inglês) se encontra em http://www.apuritansmind.com/Christmas/Christmas.htm

[2] ANDRADE, Cleriston. “Os Judaizantes de Hoje”
http://www.cacp.org.br/judaizantes_de_hoje.htm

[3] Vide, por exemplo, John Piper escrevendo a favor.
http://www.desiringgod.org/

 

 


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