Fazendo Morrer o Pecado

por

J. Ligon Duncan III

Assim, façam morrer tudo o que pertence à natureza terrena de vocês: imoralidade sexual, impureza, cobiça, desejos maus e a ganância, que é idolatria. 'E por causa dessas coisas que vem a ira de Deus sobre os que vivem na desobediência, as quais vocês praticaram no passado, quando costumavam viver nelas. Mas agora abandonem todas estas coisas: ira, indignação, maldade, maledicência e linguagem indecente no seu falar. Não mintam uns aos outros, visto que vocês já se despiram do velho homem com suas práticas e se revestiram do novo, o qual está sendo renovado em conhecimento, à imagem do seu Criador, onde não há grego nem judeu, circunciso nem incircunciso, bárbaro, nem cita, escravo nem livre, mas Cristo é tudo e está em todos – Colossenses 3:5-11 NIV.

"Suponha um verdadeiro crente, e que ele descubra em si mesmo um poderoso pecado que habita nele e que continuamente o conduz à escravidão; consumindo seu coração com inquietações, desconcertando seus pensamentos, enfraquecendo sua alma com respeito aos seus deveres para com Deus, perturbando sua paz, e até mesmo poluindo sua consciência e o expondo ao endurecimento através do engano do pecado – o que ele deve fazer sobre isso? Qual atitude deveria ele tomar para mortificação deste pecado, cobiça, destempero ou corrupção?”

Assim escreveu o Puritano John Owen, em meados do século XVII. Sua audiência consistia de rapazes de quinze anos de idade, os quais estavam longe de casa, na Universidade de Oxford (onde Owen era vice-chanceler). O livro nos qual estas palavras foram escritas (o volume 6 da coletânea de seus escritos) tem, de forma justa, permanecido como um tratamento clássico do pecado. Eu recordo vividamente da primeira vez que o li, há mais de 25 anos atrás. Não encontrei nada que confronte totalmente a malignidade do pecado interior com tanto vigor, como Owen o faz. Muitos livros e sermões (do último, inclusive o meu, certamente) tocam somente a superfície do problema, não conseguindo se tornar bastante específico para uma multidão de argumentos. Mas a conquista de hábitos pecaminosos (e hábitos são o que eles se tornam) é uma marca de maturidade espiritual. Não pode haver crescimento sem ela. Perca tempo aqui e o resultado será algo tão frágil, tão insípido, que a ruína obrigatoriamente será o resultado final.

É importante desejar maturidade espiritual. Se não tivermos desejo de crescer, não cresceremos! Se o coração estiver errado, tudo mais que procede dele estará errado, como Jesus disse aos fariseus repetidas vezes. Em adição, é importante pensar de forma apropriada e acurada, sobre o que significa se tornar um cristão e ser um cristão. Considere o que Paulo diz aos Colossenses, no capítulo 3. Ali ele insiste que há duas coisas sobre nós mesmos que devemos saber e lidar, se somos cristãos: nós morremos com Cristo, e ressuscitamos com Cristo. Como conseqüência, temos que buscar as coisas que são de cima, onde Cristo está sentado à destra de Deus. Devemos viver com nossas cabeças acima das nuvens, contemplando algo da glória e majestade de Jesus. Devemos saber quem somos e qual é a verdade a respeito de nós. Este é o aspecto positivo do caminho da santificação que Paulo deseja que utilizemos.

Mas, há também um lado negativo. Há um poder no pensamento negativo, apesar de Norman Vincent Peale [1] ! Paulo quer que apreciemos que, a menos que saibamos o que não devemos fazer, não há utilidade em nos dizer o que devemos fazer. Há tanto poder no pensamento negativo, como no pensamento positivo. A palavra chave aqui é mortificação. É uma palavra antiga, antigamente conhecida e amada pelos leitores da versão King James da Bíblia, e que necessita ser re-introduzida ao nosso vocabulário. Ela significa “fazer morrer o pecado”. Todo cristão deve estar engajado neste dever (sim, ele é um dever) de fazer morrer o pecado. “Mate um pecado ou uma parte do pecado todo dia”, era o conselho de Owen. “Mate o pecado, ou ele te matará”, ele adicionou, indicando algo da seriedade do assunto. O que Paulo nos ensina aqui, em Colossenses 3, que necessitamos fazer?


A Realidade do que Nós Somos

Primeiro, ele expõe a realidade do que nós somos. Há um ponto geral que precisa ser estabelecido, se vamos ser sérios no tratamento com o pecado interno. Devemos dizer: “Preciso enfrentar a realidade da existência do pecado”. Nós fomos libertos do reino do pecado, mas não fomos livres ainda da presença do pecado. Uma luta constante sucede dentro de nós, das luxúrias da carne (inicia a guerra) com o espírito. Há uma guerra espiritual acontecendo na parte mais interna de nosso ser. Necessitamos, portanto, olhar o pecado (pecado pessoal e particular) nos olhos.

Nos apressamos na leitura destes versos, não nos apressamos? Notamos a maneira “detalhada e pessoal” na qual Paulo lista duas séries de cinco pecados, e nos encontramos perguntando o que eles significam. Mas, necessitamos parar e refletir por um momento sobre a conveniência de tudo isto falado sobre o pecado. O volume devidamente famoso de J.C. Ryle, Santidade, começa com uma declaração sobre este efeito: “Aquele que desejar dar grandes e largos passos na santidade, deverá primeiro considerar a grandeza do pecado”.

Ryle, escrevendo no final do século XIX, estava meramente refletindo sobre o que Anselmo de Cantuária tinha escrito na Idade Média. Num diálogo entre ele mesmo e uma personalidade chamada Boso, Anselmo estava tentando responder à questão: Por que Deus se tornou homem (Cur Deus homo)? Num ponto desta obra, Anselmo expressa a famosa linha: “Você ainda não tem considerado a gravidade do pecado”. Porque ele estava relutante em reconhecer nossa necessidade de salvação, Boso era incapaz de ver o porque o Senhor Jesus Cristo teve que se tornar encarnado, para salvar o Seu povo. Nosso problema é o pecado. Assim tem sido desde o Jardim do Éden, e assim ainda permanece hoje.

O que Anselmo, Owen e Ryle estavam dizendo é que nossos corações necessitam ser expostos pelo Espírito Santo de Deus, para revelar a extensão da destruição do pecado sobre nós. Isto é algo como o que acontece quando um aparelho de ressonância magnética mapeia os órgãos e tecidos internos de nosso corpo. Ele pode não somente nos mostrar o que está saudável, mas o que está canceroso e indesejável. Ele pode ver onde somente o olho não pode ver.

Se você for mordido por uma cobra, uma das melhores coisas que você pode fazer é trazê-la com você ao doutor (você necessitará matá-la primeiro!), de forma que o veneno possa ser reconhecido e o antídoto relevante prescrito. Com o pecado é da mesma forma. A menos que possamos identificar os pecados, não saberemos que remédio deveremos usar. Não é suficiente sermos vagos e genéricos sobre nossos pecados. Pecados têm nomes, e faremos bem em aprender o que eles são. Será um ponto de progresso sempre que pudermos identificar o que aqueles pecados que prevalecem em nossas vidas são. E antes que possamos fazer isto, necessitamos reconhecer que há a necessidade de se fazer isto. O pecado nos agarra de maneiras que, às vezes, recusamos reconhecer. Devemos começar encarando o fato de nosso pecado – nossos pecados específicos.

Robert Murray McCheyne, o ministro presbiteriano escocês do século XIX cuja vida foi extinta antes dele alcançar os trinta anos de idade, escreveu em seu postumamente publicado Diário: “Tenho começado a perceber que as sementes de todo pecado conhecido ainda subsistiam em meu coração”. Este é um ponto de progresso. Quando conhecemos isto, nossos olhos são abertos – assim como quando um doutor diagnostica nossa doença, e chegamos a entender o que ela é. Imagine um doutor te dizendo: “Sim, há algo acontecendo dentro de você, mas não nos preocuparemos com isto! Olhemos para o lado bom, ok? Não é este um belo dia?” O que você pensaria disto? Mesmo que isso satisfizesse sua necessidade de negação de imediato, duvido que você visitaria alguma outra vez este doutor. Muitos de nós, quando as coisas ficam sérias, desejam conhecer a verdade, ainda que ela doa. E dura ela será, não tenha dúvida disto.


O que Necessita ser Tratado

Em segundo lugar, Paulo identifica para nós, em detalhes, o que necessitar ser tratado. Há um assunto de tradução em nosso texto que precisa ser observado brevemente. A New American Standard Version [Nova Versão Americana Padrão] traduz o verso 5 desta forma: “Considere os membros de vossos corpos terrestres como mortos...” Isto soa como algo que Paulo diz em Romanos 6. Há um tempo para “considerar a nós mesmos como mortos para o pecado”. Em Cristo, a grande mudança já aconteceu. Mas é duvidável se é esta a mensagem de Paulo aqui. Portanto, a New International Version [Nova Versão Internacional] o traduz desta forma: “Assim, façam morrer tudo o que pertence à natureza terrena de vocês”. Esta tradução é melhor, mas ela também encobre, ao invés de clarificar o que Paulo pretende aqui. Voltarei para a King James Version [Versão Rei Tiago] por um minuto: “Mortificai, portanto, vocês membros que estão sobre a terra”. Provavelmente a NIV traduziu este verso de uma maneira que nos faça pensar menos que Paulo esteja sugerindo algum tipo de auto-mutilação. Os Colossenses estavam por cometer este próprio erro. Mas, necessitamos apreciar que o modo como o pecado opera em nossas vidas é via os membros de nosso corpo!

Vossos membros! Os cristãos necessitam de uma santidade física. A santidade do Novo Testamento transforma o que fazemos com os nossos corpos. Ela tem olhos, mãos e pés.
A primeira lista de cinco pecados move-se de atos externos para motivações internas. É incrível pensar que a primeira coisa que Paulo menciona é a imoralidade sexual. A palavra que ele usa cobre todas as formas de prostituição, todo comportamento sexual ilegítimo – heterossexual, homossexual ou mesmo bestial. Ele liga isto com a atitude do coração: impureza. Paulo deseja que consideremos que o que a mente abriga em secreto, o corpo fará externamente. Então vem a cobiça, isto é, paixões que vêm e nos dominam, incontrolada e incontrolável. Desejo é a próxima palavra, pela qual ele quer dizer algo que está fora do controle. E ele termina a lista sugerindo que todo comportamento sexual é uma forma de ganância, que é uma forma de idolatria. Estes pecados são egoístas em seu âmago. Eles mostram que, como Calvino escreveu na edição de 1559 de suas Institutas da Religião Cristã: “A mente do homem é uma fábrica perpétua de ídolos”. Você terá perdido sua consciência quando pensar que esta vida é apenas satisfação de seus próprios desejos, e seus somente! Você se faz como Deus quando pensa desta forma. Você está se curvando diante do deus do ego.

Os dias de Paulo eram consideravelmente como os nossos. Eram dias de imoralidade sexual abundante. O homossexualismo era tão prevalecente como o é agora. As palavras de Paulo aqui parecem particularmente pertinentes para nós hoje. Santidade, verdadeira santidade, demanda pureza sexual total. O pecado distorce o que Deus pretendeu ser uma bela coisa.

Talvez isto nos toque de uma forma muito pessoal. Ninguém mais sabe sobre ele. Talvez, seja melhor assim. Negócios, viagens de negócios, revistas, pornografia de Internet – a lista de áreas possíveis que nos afeta é interminável.

Faça morrer estes pecados! Se não o fizer, eles te destruirão. “Por causa dessas coisas, vem a ira de Deus”, Paulo adverte. Assustador, não é? Note que Paulo tem vários motivos para o viver ético, e não somente positivos! Nos versos 1-4, o motivo é positivo. É por causa de quem somos, do que nos tornamos em Cristo. Morremos e fomos ressuscitados com Cristo. Nossas vidas estão ocultas com Cristo, em Deus. Mas aqui, o motivo é, de modo geral, negativo. A ira de Deus está vindo sobre aqueles que não se arrependem. Voltar ou queimar é o que Paulo está sugerindo, não importa quão duro e áspero isto possa soar.

O pecado também tem um potencial para destruir os outros. No verso 6, na outra lista dos cinco pecados, Paulo move-se das emoções internas para ações externas, fazendo o oposto (ou imagem de espelho) do que ele fez nos versos 5-7. Os cinco pecados mencionados são: ira, indignação, maldade, maledicência e linguagem indecente no seu falar. Ele começa com ira: aquele espírito de ser oposto, de uma forma hostil, às coisas que Deus deseja para nossas vidas. Há uma ira justa que é perfeitamente apropriada e de acordo com os mais altos padrões de santidade. Mas não é esta ira que Paulo tem em mente aqui.

Para nos ajudar a entender o que ele pretendia dizer, ele adiciona indignação. Nós ouvimos de indignação na estrada, ou da indignação que pode surgir numa família – um caldeirão efervescente de indignação. Um comentarista sugere que a palavra pode ser traduzida como “exasperação”. Nós algumas vezes consideramos a exasperação como uma virtude! Dizemos: “Eu não sofro perdas alegremente”.

Então vem a maldade, uma recusa em perdoar, e aliada ao cinismo. Então vem a maledicência: difamando ou assassinando o caráter de alguém. Seria maravilhoso dizer que a igreja é livre deste tipo de coisas, mas ela não é. Paulo está chamando os cristãos para serem diferentes do mundo – para não mexerem suas línguas. Se você não pode pensar algo de bom para dizer sobre os outros, então, não diga nada!

Jonathan Edwards tinha uma filha com um temperamento ingovernável. Um jovem rapaz perguntou a Edwards se ele poderia casar com ela. “Não”, ele respondeu. Respondendo sobre porque motivo, Edwards continuou: “Porque ela não é digna de você!” Ele explicou: “A graça de Deus pode viver com algumas pessoas, com as quais ninguém mais pode viver!”

O sexo e o falar são as características da vida que estão mais fora do controle. Você nunca crescerá até que você traga a espada da Palavra de Deus para estes pontos na sua vida. Pode ser que você esteja onde Agostinho estava, orando: “Dá-me castidade, mas não agora!” Mas Deus está lhe dizendo: “Eu a quero agora!”

Há mais uma coisa que Paulo parece ávido para dizer. O pecado não pode ser sempre tratado de forma pessoal. No verso 9, ele urge para que os Colossenses não mintam. Ele não está simplesmente chamado-os à veracidade, mas à honestidade e à responsabilidade. “Não finjam”, ele parece estar dizendo. Se hei de ser capaz de atuar nesta comunidade, então, devo parar de fingir que sou melhor do que sou. Necessitamos ser capazes de dizer um dos outros: “Eu necessito de sua ajuda, conselho e sabedoria. Estou lutando por Sião, ao invés de marchando para ela”.

O caminho do fingimento leva à um fracasso na comunhão e no viver cristão.


Como Devemos Fazer Isto?

Em terceiro lugar, Paulo dá indicações práticas de como faremos isto. Há dois verbos que ele emprega na passagem que necessitamos gravar em nossos corações: “façam morrer” (verso 4) e “abandonem” (verso 8). Eles trazem à mente as palavras de Jesus no Sermão do Monte, que nos urgem a arrancar os nossos olhos direitos e cortar nossas mãos direitas.

" Que nenhum cristão pense que ele está progredindo na verdadeira santidade, se ele não estiver preparado para vencer facilmente as entranhas de suas cobiças”, escreveu Owen em sua forma inflexível.

Isto pode soar para você como legalismo. Esta é uma palavra conveniente que alguns cristãos empregam para se esquivarem da tarefa dolorosa de auto-examinação e mudança. Eles usam isto quando alguma aplicação parece que irá machucá-los. Mas não é legalismo desejar ser santo como Jesus. É a única coisa sensata a desejar. Qualquer coisa menor é concessiva e indigna.

Sem querer ser muito técnico, o tempo do verbo (aoristo imperativo) tem em mente a ação completa. Paulo está interessado não simplesmente em resolver a mortificação do pecado, mas com o desejo de ser liberto dele completamente. É como se ele estivesse dizendo: “Coloque suas mãos no pescoço deste pecado, e não solte até que ele pare de respirar”.

O que isto significará? Começará com um sentimento honesto da gravidade de nossa condição. Significará encarar o pecado e procurar sua destruição, custe o que custar para nós. Significará ir ao Senhor dizendo: “Senhor, eu tenho este pecado que me aflige. E eu estou tão triste. Eu fico fora de controle, ou trato mal as pessoas, ou fofoco o tempo todo. Me regozijo quando os outros caem, pois isto me faz sentir melhor sobre eu mesmo”. Significará uma mudança de hábitos e estilo de vida, determinada para que nossos membros sejam usados para o que é santo e não para a auto-gratificação às custas da Palavra de Deus e dos meios de Deus.

Você perseguirá esta tarefa? Sem ela, você sempre será menos do que Deus quer que você seja,

O autor é ministro sênior da Primeira Igreja Presbiteriana (PCS) em Jackson, Miss.

 


Tradução livre: Felipe Sabino de Araújo Neto
Cuiabá-MT, 22 de Setembro de 2004.


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