Alarmado com a Voz de Jack Deere

por

Richard L. Mayhue

Dr. Jack Deere, o bem-conhecido autor não-cessacionista do livro anteriormente publicado sob o título “Surpreendido pelo Poder do Espírito”, propôs em sua obra subseqüente, “Surpreendido pela Voz de Deus”, que os cristãos obediente e, humildes, que procuram andar intimamente com Deus deveriam regularmente escutar Deus falando à parte das Escrituras através de vários meio, tal como a audição de vozes, impressões, sonhos, e/ou visões. O autor chega a sugerir que a experiência cristã hoje pode até superar os momentos mais espetaculares da igreja de Jerusalém no Primeiro Século tal como registrados em Atos. A atitude de Deere para com os que discordam de sua postura teológica no tocante a estas questões (cessacionistas) e as suas proposições são examinadas levando em conta a sua validade lógica, propriedade hermenêutica, proporções testemunhais, exatidão exegética e persuasão teológica. Este revisor chegou à conclusão de que Deere infelizmente tenta exaltar as virtudes e diminuir as falhas incidentes em suas convicções, mantidas igualmente pelo movimento Neopentecostal de Terceira Onda, ao qual adere, quando é a Sagrada Escritura, não a experiência, o árbitro.

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Vivendo numa época como a atual na qual impera o neo-gnosticismo e o misticismo extremado [1] , como diferenciar as previsões da paranormal Jean Dixon, das que ocorrem em decorrência da teologia neo-pentencostal de terceira onda esposada por Jack Deere? Ambas têm em comum o fato de que reivindicam receber mensagens sobre o futuro e a orientação geral acerca de questões vitais. Igualmente, ambas aparecem como bem-sucedidas, conforme constam dos testemunhos/depoimentos em favor de cada uma das partes a ponto de soarem como plausíveis. Desse modo, quem é ou o que não é confiável? E, como fazer para julgar? Nesse tempo em que vivemos em meio a estrondoso engano espiritual, ninguém pode deixar de ser também cuidadoso (Atos 17:11).

Com Surpreendido pela Voz de Deus (Zondervan, 1996), Jack Deere dá seqüência ao seu trabalho anterior Surpreendido pelo Poder do Espírito (Zondervan, 1993) [2] em que tenta explicar a razão por que crê que Deus continua falando de forma tal que os cristãos podem escutar (307-20). Segundo entende, esta comunicação divina inclui o âmbito da informação específica sobre outras pessoas (13-17), eventos tanto do passado como do futuro (343-58), e direção particular com respeito a vida de alguém (286-88). Declara que isso deveria consistir a vida normal na cristandade (60-63) o que é uma continuação do mesmo fenômeno que se encontra na Escritura (53-56) e que não cessou com o encerramento da Era Apostólica e do Cânon do NT (276-78).

Num primeiro instante, a tese de Deere, cuidadosamente elaborada, pode ser convincente a muitos porque: (1) ele se insinua como o campeão da causa bíblica real (26-27); (2) freqüentes ilustrações pessoais parecem embasar o seu ensino; e (3) citações da Escritura dão impressão de validar sua tese.

Entretanto, algumas características incomuns do ensino e ministério de Deere ministério deveriam induzir, antes de se abraçar as suas conclusões, um exame cuidadoso do conteúdo do seu último livro. Primeiro, Deere faz algumas declarações e afirmações bizarras. Por exemplo, segundo alega, Deus falou a Deere, enquanto ele estava se exercitando ao som de uma balada romântica do tipo country (128-29). Além disso, ele relata que Paul Cain, seu mentor, supostamente recebera mensagem(s) de Deus por meio de uma enorme tela de TV afixada no céu (352-53).

Segundo, ainda que Deere dedique o livro a Paul Cain como seu amado mentor, refere-se a ele com ótimas referências (152, 176-77, 186), e até o utilize na conclusão apoteótica de um testemunho espetacular para confirmar os seus ensinos (343-58), há um outro lado nessa estória. Associações passadas de Cain com William Branham e outros, a quem Deere parece abraçar (207), leva-se a perguntar seriamente acerca da sabedoria de Deere no tocante aos seus companheiros de alinhamento teológico e pastoral. [3]

Terceiro, há suficientes críticas, substanciais e confiáveis, que têm sido encaminhadas quanto às bases bíblicas da teologia da Terceira Onda em geral e, a de Deere em particular, capazes de induzir cautela ao leitor e faze-lo olhar com mais cuidado para o material de Deere antes de aceitá-lo. [4]

Quarto, em todas as sucessivas gerações tem aparecido esse clamor no sentido de escutar Deus falando, aceitar os sonhos ou revelações divinas, e de demonstrar que alguém é capaz de receber previsão do futuro. Essa é a razão por que há abundantes admoestações bíblicas com vistas a chamar os crentes para o exame dessa espécie de afirmações, à luz das Escrituras. Portanto, o presente trabalho visa o atendimento deste propósito. Jack Deere é um Daniel dos dias de hoje (Dan 1:17; 2:15); alguém no mesmo nível de Paulo (Atos 18:9-10), ou é uma alma sincera mas mal orientada como os filhos de Ceva para quem um demônio uma vez disse, "a Jesus eu conheço, e sei quem é Paulo; mas vós, quem sois?" (Atos 19:15)?

   

QUEM É JACK DEERE?

Jack Deere detém vários títulos acadêmicos: bacharelado em Texas Christian University, mestrado (ThM) e doutorado (ThD) em teologia em Dallas Theological Seminary. Ensinou em Dallas Theological Seminary de 1976 até 1987 quando a instituição o despediu por causa de suas posições não-cessacionistas. (37-38). [5]

Segundo o autor, ele originalmente defendia uma forte visão cessacionista em consonância com o seu treinamento e experiência docente no Dallas Theological Seminary - DTS. Depois de um ano de viagem a estudo à Alemanha (1984-1985), voltou ao DTS no ano escolar 1985-1986 (15). Enquanto convidava o Dr. John White, um psiquiatra britânico, para pregar numa conferência de igreja, Deere teve sua vida mudada, em vinte minutos de conversa ao telefone com White em janeiro de 1986 (13, 22).

White serviu na Comunidade Vineyard de Anaheim, pastoreada por John Wimber, desde meados de 1985 (35). White esteve em Fort Worth em abril de 1986, para uma série de conferências, fato que foi relatado por Deere no Capítulo 2 do seu livro. (25-32). Várias semanas mais tarde, Deere encontra-se com Wimber [6] ai mesmo em Fort Worth (33). Como resultado, Deere e Wimber se tornaram bons amigos; Deere visitou Comunidade Vineyard de Anaheim em várias ocasiões durante 1986-1987 (39).

Depois de sua saída do DTS em outono de 1987, Deere também foi integrado à equipe pastoral da Comunidade de Kansas City pastoreada por Mike Bickle (38). Ele então fez planos para se mudar para Anaheim e tornar-se pastor auxiliar de tempo integral de John Wimber (40).

Deere permaneceu com Wimber até inicio de 1990, quando voltou para a área de Dallas-Fort Worth. Daí em diante, Deere escreve e dá palestras no mundo todo sobre os dons do Espírito Santo.

Pelo próprio testemunho de Deere, John Wimber, o psiquiatra britânico John White, e Paul Cain têm exercido as maiores influências sobre ele (35-43). Além disso, quatro meses de intenso estudo das Escrituras de janeiro a abril de 1986 (24) e suas experiências (15-43) combinaram-se para convence-lo de que os dons extraordinários ainda operam hoje na Igreja da mesma forma que no primeiro século.  

 

AS IDIOSSINCRASIAS DE DEERE  

Por todo esse segundo volume, Jack Deere tem esboçado imagens deturpadas dos que agora crêem diferentemente dele. Essas alegações de maneira alguma caracterizam a pessoa humilde, conduzida pelo Espírito, que poderia ter sido antes abraçar a teologia não-cessacionista. As seguintes amostras bastam para documentar as caricaturas desnecessárias apresentadas pelo Sr. Deere.  

1. Os cessacionistas, caracterizados como deístas bíblicos por Deere (251-69), são idólatras. [7]  

2. Os que agora crêem como Jack Deere antigamente cria, quando era cessacionista, são farisaicos em suas atitudes (28, 61, 108, 124, 239-44, 247-48).  

3. Alguém que agora crê como Jack Deere cria tem orgulho no coração (256).  

4. Os cessacionistas são semelhantes aos liberais (126).
 

Suponho que se creio que outros cristãos que pensam diferente de mim são liberais, orgulhosos, fariseus e idólatras, então eu não poderia ser mais grato ou feliz quanto ao meu passado do que Jack Deere.
   

A LÓGICA DE DEERE  

Por todo o livro, Deere emprega um raciocínio silogístico falacioso. Dessa maneira, ele elabora conclusões exegéticas e teológicas defeituosas que leva o leitor a acreditar que são verdadeiras quando, de fato, eles não são. Por exemplo (47), Deere afirma que (1) Cristo e os apóstolos realizaram milagres, ressuscitaram mortos, e escutaram a voz do Deus através do poder do Espírito Santo e (2) no Século 20 os crentes compartilham o mesmo Espírito Santo como Cristo e os apóstolos. Conseqüentemente, ele conclui, que os crentes do Século 20 deveriam operar milagres hoje igualmente a Cristo e os apóstolos. Deere erra quando assume que compartilhar o mesmo Espírito Santo significa admitir os mesmos propósitos de Deus em demonstrar o poder do Espírito hoje como eram no Primeiro Século.

A lógica de Deere é falha, assim como ele tem falhado em fazê-la parecer válida. Em segundo lugar (26), Deere argumenta que (1) os milagres ocorriam no passado e (2) as Escrituras em nenhum lugar dizem que iriam cessar. Portanto, os milagres do passado deveriam ser esperados para hoje. O pensamento de Deere vai se desviando quando afirma que nenhum versículo da Bíblia diz que os milagres cessariam. Ele ignora o testemunho histórico das Escrituras de que os milagres estiveram ausentes durante longos intervalos de tempo na história bíblica, para não mencionar que conclusões válidas podem realmente ser tiradas das Escrituras com respeito ao propósito autenticador de milagres, que não ultrapassou a Era Apostólica.

Um exemplo final (281; 362 n. 2) bastará para marcar este ponto. Deere afirma que (1) os milagres são utilizados nas Escrituras para fornecer orientação para crentes e (2) Deus está guiando hoje. Portanto, Deus está guiando hoje, como no passado, com as mesmas espécies de milagres. Ele erra ao supor que Deus deve continuar guiando através de um novo conjunto de milagres contemporâneos em vez de mediante a história fielmente registrada dos milagres bíblicos.

Deere tem reduzido seu pensamento aos pontos delimitados pela sua visão simplista. Emprega uma má lógica que induz uma teologia pobre. Até que ele estabelece suas afirmações com a intenção de parecerem biblicamente válidas mediante um processo exegético e teológico, mas suas conclusões são opiniões pessoais, e não variantes bíblicas sobre as quais edifica uma vida cristã. As únicas conclusões confiáveis são as teológicas e não as que decorrem de raciocínios silogísticos falazes.


A HERMENÊUTICA [8] DE DEERE  

Deere ostensivamente comete dois erros fundamentais de interpretação bíblica. O primeiro é o da generalização , isto é, crer que a ocorrência de um milagre no passado significa que nada impede que seja repetido, e, portanto, espera sua recorrência. O segundo é o experiencialismo , ou seja, aceitar qualquer alegação de quem que seja que afirme ter uma experiência miraculosa hoje da mesma espécie que consta da história bíblica, então deixa que essa experiência prove que Deus opera no presente essa mesma espécie de milagres. O primeiro envolve uma hermenêutica biblicamente injustificável, pela qual se raciocina que, a menos que as Escrituras neguem a continuidade de uma experiência, essa experiência é contínua e contemporânea. O segundo diz respeito à leitura de uma experiência na Escritura de molde a que esta experiência valide a Escritura em vez do contrário. Ambos generalização e experiencialismo podem ser combinados sugerindo um erro chamado normalização , a saber, assumir que algo era normal na Escritura, então este algo deve ser normal depois. Por exemplo :  

1. A ressurreição de Êutico (23-24).  
2. Hospedagem de anjos por Abraão (19, 26) . [9] .
3. A vida de Jesus (28, 42-45).
4. Os Israelitas no Deserto (29).
5. Paulo em Corinto (50).
6. O livro de Atos (51-56) . [10] .

Seguindo à risca a lógica de Deere, poder-se-ia esperar, depois de Cristo, outros nascimentos virginais. Entretanto posso esperar que Deere talvez diga diante disso, "Não!" Por que o nascimento virginal de Cristo foi um evento único em cumprimento do propósito de Deus conforme prenunciado no AT e a maneira singular de uma criança sem pecado nascendo de pais pecadores. Ainda que as Escrituras nem sempre digam que não mais ocorreriam nascimentos virginais, isso não significa que necessariamente continuariam ocorrendo. Assim, se Deere deseja seguir a linha de raciocínio acima (e penso que ele pode), então ele deve considerar isso em relação aos milagres. Assim, poderíamos invalidar a maior parte do seu pensamento contido em Surpreendido pela Voz de Deus .

Se a tese de normalização de Deere é verdadeira, então milagres da Bíblia deveriam estar ocorrendo hoje. Pessoas poderiam ser arrebatadas até o terceiro céu como Paulo (2 Cor 12:1-6); apesar de que como Paulo eles não deveriam contar os detalhes. A roupa e os sapatos dos cristãos não poderiam ser gastos, justamente como ocorreu com os hebreus no deserto (Deut 29:5). Machados sem cabo poderiam boiar (2 Reis 6:1-7), pessoas poderiam tomar um excelente transporte alternativo (Atos 8:39-40), fazer compras na mercearia poderia ser obsoleto (Exodo 16:13-14), e cruzar o Mar da Galiléia poderia ser como passeio no parque (João 6:19). Mas nada disto é verdadeiro. Assim como, o leitor há de convir, o paradigma da normalização de Deere de forma absolutamente trágica vulgariza o extraordinário e miraculoso e compromete na essência os seus impactos e propósitos poderosos.


O ESTILO TESTEMUNHAL DE DEERE

Deere começa onde encerrou em Surpreendeu pelo Poder do Espírito , principalmente utilizando casos, testemunhos, contos, ou histórias, para ilustrar a sua tese. Como ele próprio admite, ele coloca a experiência no mesmo nível da Escritura. [11]

Restringi minha discussão à parte da linguagem do Espírito Santo que parece mais comum nas Escrituras, ou aos aspectos que eu mesmo já tenha experimentado ou que alguém a quem eu considero testemunha confiável tenha experimentado. [12]

Em outro lugar, Deere critica aqueles cuja teologia é embasada nas Escrituras somente e que por isso não reformulam as suas crenças a partir da experiência (252). Mas, de tudo o que Deere discute, freqüente ou ruidosamente, nenhuma de suas convicções provêm das Escrituras, nada senão experiência, é tudo o que os livros tratam. O que um revisor lamentou sobre Surpreendido pelo Poder do Espírito é igualmente aplicável a este volume. “... Infelizmente, ele leva leitor a crer que é a experiência religiosa em si que valida o que ele argumenta." [13]

Um outro ponto a salientar consta do primeiro livro de Deere. Em Surpreendido pelo Poder do Espírito (58), Deere argumentou: " nenhum escritor cessacionista que conheço tenta firmar seu ponto à base exclusiva das Escrituras. Todos eles apelam tanto para as Escrituras quanto para uma outra história do presente ou do passado para sustentar suas teses...” Depois escreveu (268 n. 9), "Até mesmo o maior erudito cessacionista, Benjamin Breckenridge Warfield, não defende sua tese com base apenas na Escritura. Ele apelava tanto para as Escrituras quanto para ‘o testemunho dos tempos antigos.' O que, essencialmente, Deere defende: os cessacionistas deveriam restringir a discussão deles somente às Escrituras. O uso de ilustrações contemporâneas ou históricas enfraqueceria tese deles.

Isso, entretanto, é expressivamente inconsistente com que ele sabe ser verdadeiro. È mais ou menos como se um lutador tem suas mãos livres para atacar o seu oponente que está com suas duas mãos amarradas para trás e não pode se defender. À luz da citação de Deere acima, este revisor fica espantado ao ler o que segue, também da pena de Deere, quando este se defendeu de outros ataques. O que negou aos cessacionistas, permitia aos não cessacionistas:

... embora a Escritura estabelece doutrina, experiência pessoal e testemunhos são vitais à comunicação efetiva da doutrina. O papel da experiência pessoal é ilustrar, esclarecer, apoiar ou confirmar o ensino da Escritura; razão porque a Bíblia está repleta de biografias e escritos históricos. [14]  

Ora, as regras devem valer igualmente para ambos lados. Do lado cessacionista, ilustrações que ilustram devem ser permitidas. Da perspectiva de Deere, ilustrações também são permitidas, as que são conhecidas: (1) a sua própria admissão conforme citação acima; (2) as trinta páginas em que ele empreende a validação histórica em Surpreendido pela Voz de Deus (64-93); e (3) testemunhos em abundância que proporcionalmente eclipsam a discussão bíblica. Mas, por outro lado, ambos os lados devem ser lembrados de que a Escritura é sempre primordial para a determinação da verdade, enquanto que a experiência é, quando muito, secundária.


A EXEGESE DE DEERE [15]


Deuteronômio 18:20-22 (68-69). Deere sem causa desconsidera a seriedade deste texto que se aplica ao um falso profeta de Deus. [16] Falar em nome de Deus sem uma mensagem clara da parte de Deus era suficiente para que um falso profeta merecesse a pena de morte. Este padrão pode ser aplicado em essência em qualquer tempo, não somente no Israel antigo.

Jó 33:14-15 (219, 232, 235). As palavras de Eliú a Jó são assumidas de forma acrítica como verdadeiras por Deere para o efeito de normalização de sonhos na experiência de todos crentes. Dada a natureza obscura dos dizeres em questão e o fato de que Eliú os proferira com cólera (cf. Jó 32:2-3), essas observações deveriam rapidamente alertar o intérprete da Bíblia para não construir uma teologia de sonhos sobre este fundamento de areia. Mesmo assim, Deere pouco sabiamente faz exatamente isso.

Isaias 42:3 (113). Deere alegoriza este maravilhoso texto descrevendo a benignidade do Messias. Com esta metodologia interpretativa, Deere pode fazer com que a Escritura signifique tudo quanto desejar.

Tiago 5:13-20 (25, 163). Como em Surpreendido pelo Poder do Espírito , Deere toca ligeiramente este texto e conclui sobre Tiago, "Ele prometeu aos seus leitores que Deus poderia usá-los para curar os doentes..." (25). Ele não considera ou mesmo leva em conta o fato de que o contexto de Tiago 5:16 aponta primeiramente para a cura espiritual através da confissão de pecado, não à cura física. Certamente não promete que os cristãos curarão fisicamente as pessoas. [17]

O exposto acima é uma amostra representativa de textos que Deere tem utilizado casualmente para apoiar sua tese. Talvez o mais que poderíamos dizer é que se trata de exegese descuidada, ou mesmo de uma prática de eisegesis, ou seja, a imposição de um significado estranho a um texto bíblico e tomado este texto como se estivesse falando de conclusões que partiriam da Escritura. Por exemplo, de uma seção do seu livro "Aprendendo a Linguagem do Espírito Santo" (159-232) um longo trecho trata somente de seus próprios pensamentos e experiências. Pergunta-se a respeito desse material, "Onde isso é ensinado na Escritura?" A resposta poderia ser, "nas entrelinhas". É a opinião pessoal de Jack Deere, nada mais! [18]


A TEOLOGIA DE DEERE

Um apanhado representativo das mais bombásticas declarações ajuda a definir o pensamento de Deere e pode também ilustrar a teologia não-cessacionista do autor. Demonstra ser extremamente sugestivo para tentar compreender a mensagem central do livro.

"Não posso conceber a tentativa de levar a vida cristã sem isso” (17). Pode-se pensar que Deere esteja se referindo aqui à orientação da Escritura ou da oração, mas pelo contexto ele está se referindo à voz de Deus fora do texto bíblico. Não somente isso, mas esse gênero de afirmações sugere elitismo espiritual – ou seja, sem a voz de Deus a vida Cristã é inferior – além disso, não passa de uma espécie de gnosticismo cristão – a saber, a posse de um conhecimento especial a somente uns poucos iniciados. Não parece que Deere esteja se referindo a "como saber a vontade de Deus" nos assuntos da vida diária como compreendido pela maioria dos cristãos através dos tempos [19] . Mas antes, ele parece referir-se às atualizações revelacionais freqüentes vindas diretamente do Deus.

"Porém parecia que Ele, após ter escrito Bíblia, ficou mudo, ou pelo menos era a impressão que eu tinha, pois a única forma pela qual podia ouvi-lo falar era por meio do seu livro" (19). Esta verdadeira confissão de Jack Deere é completamente reveladora. A despeito das expressões bíblicas contidas em nos Salmos 19, 119; 2 Tim 3:14-17; e 2 Pedro 1:3 de que as Escrituras são suficientes em matérias espirituais, Deere quer mais. Essa ânsia é marca geralmente de quem não se contenta com o que tem, mas que está sempre procurando as coisas prometidas e não alcançadas. Ele certamente reúne as posições dos que segue a fórmula"Bíblia mais alguma coisa além”, características tanto do cristianismo aberrante como das seitas.

"... [N]em mesmo o conhecimento da Bíblia é guia insuficiente para conduzir a Jesus" (36). Deere parece sugerir que sem a revelação extrabiblica de Deus, ninguém poderá conhecer a Cristo de maneira suficiente. Ele está definitivamente indo além do ministério de iluminação do Espírito de Deus, que tanto cessacionistas quanto não-cessacionistas abraçam. Deere está falando sobre " revelação direta e sobrenatural" (38; sua ênfase). Ainda, ele mais tarde escreve, "A maneira mais comum do Espírito Santo revelar Jesus e nos falar hoje é através da Bíblia" (100). Essa expressão isolada está em contradição com a declaração de Deere na página 38 e com a tese do seu livro.  

"Com a vinda do Espírito, passa a existir um entendimento de que todo cristão deve profetizar... Todos no Novo Testamento podem num tempo ou noutro, profetizar, sonhar, ou ter uma visão" (179). Como Deere sabe isso? Isso certamente não é o que o Novo Testamento claramente ensina ou qualquer ou que consta em qualquer exemplo histórico do NT. Ele recorre à citação de Pedro de Joel 2:28-29 em Atos 2:17-18 no dia de Pentecostes para chegar à conclusão acima que é, aliás, infundada. Ele falha ao não alertar seus leitores para os seguintes fatos: (1) o fenômeno de Atos 2:19-20 (cf. Joel 2:30-31) não ocorreu o que ele menciona; (2) Atos 2:17-20, citando Joel 2:28-31, parece mais corretamente que será experimentado concorrente no futuro; (3) parece que somente os doze falavam em línguas, não toda a assembléia; e (4) em nenhum lugar exceto nas epístolas do NT parece cumprir o objetivo da profecia de Joel. Assim, conclusão de Deere é um resultado da má utilização de textos-prova.

"Mas talvez, com mais freqüência que nunca, um compromisso ingênuo com as tradições afogará a voz dele num mar de confiança nos métodos e nas regras humanas" (249). Deere está dizendo que a assim chamada voz extra-bíblica de Deus é mais confiável do que a voz bíblica de Deus, ou seja, a instrução bíblica derivada de um estudo cuidadoso das Escrituras. Ele pode acusar quem acredita diferentemente de ter abraçado uma tradição deficiente, mas sugere que os que têm a sua mesma persuasão tem supostamente interpretado a verdade corretamente. Ou por outro lado, sem "a voz" não se pode ter certeza do que a Escritura ensina.

"Nos tempos bíblicos, as pessoas sabiam que Deus falava com freqüência por sonhos, então levavam os sonhos a sério" (217). "Os sonhos têm sempre sido um meio importante de comunicação... E uma das maneiras prediletas de falar é por meio de sonhos" (219). Ao contrário das colocações de Deere, sonhos e visões eram realmente incomuns escassas mesmo. Considere que no AT inteiro (um período de mais de 4.000 anos) menos que 20 sonhos específicos para menos que 15 pessoas são registradas
[20] . Circunstancias históricas de sonhos no NT não são encontradas além dos seis registrados em Mateus [21] . Todos esses sonhos ocorreram em benefício pessoas incrivelmente importantes como se relacionassem com os tempos cruciais em que Deus desdobrava o seu plano de histórico redentivo. Mesmo assim os sonhos, até mesmo nessas circunstâncias, eram tão extremamente poucos e quantos espaçados. [22] Os dados bíblicos não apóiam a tese de Deere de que os sonhos eram freqüentes na Escritura e assim deveria ser hoje. Realmente, a Bíblia e Jack Deere estão em conflito diretos.

Caso se incluísse também entre as "visões", conforme acima descritas, os "sonhos," que aprecem na Sagrada Escritura (Dan 1:7), menos do que 25 visões específicas são registradas para menos de 15 pessoas no AT [23] . Menos ainda são encontradas no NT [24] . Sonhos e visões nunca foram dados por razões mundanas ou às massas como eles relacionaram para plano de Deus de redenção.  

Essas citações demonstrativas de Deere ilustram os extremismos biblicamente injustificáveis e as conclusões escrituristicamente infundadas adotadas pelo autor. Isso por si coloca seriamente em risco a credibilidade bíblica dos ensinos.  


UMA BUSCA MAL SUCEDIDA

Neste ponto poder-se-ia perguntar, "Por que qualquer pessoa pode ser contra essa espécie de experiência que Deere tem tentado persuadir o leitor que faz parte de uma vida cristã normal, saudável, vibrante, como abundantemente retratada na Escritura?" A resposta é muito simples, "Porque as conclusões do Jack Deere não são bíblicas!"

Os esforços do Deere de normalizar o extraordinário são completamente não convincentes, em que pese tantas declarações bizarras, outros tantos testemunhos, e tantas outras caricaturas dos que sinceramente discorda dele. Por outro lado, a quase total ausência de uma boa hermenêutica, uma hábil exegese, e uma bem fundamentada teologia bíblica fazem erodir qualquer confiança na exatidão das conclusões de Deere. Em síntese, considerando que o trabalho de Deere é escrituristicamente deficiente e inadequado e sem exatidão no tratamento do assunto, este revisor formula a questão mais importante, "Como e de que meios o Espírito Santo de Deus, que reside em todo verdadeiro crente no Senhor Jesus Cristo, guia e dirige os cristãos hoje?"


Richard L. Mayhue é Vice-presidente Sênior e Deão, além de Professor de Ministérios Pastorais.

NOTAS:

[1] Arthur L. Johnson, Faith Misguided: Exposing the Dangers of Mysticism – “ Fé Mal Orientada:Expondo os Perigos do Misticismo ” (Chicago: Moody, 1988); John F. MacArthur, Reckless Faith “ Fé Temerária ” (Wheaton, Ill.: Crossway, 1994) 19-34; Peter Jones, The Gnostic Empire Strikes Back: An Old Heresy for a New Age – “O Império Gnóstico Contra Ataca : Uma Velha Heresia para uma Nova Era” (Phillipsburg, N. J.: Presbyterian & Reformed, 1992); idem, Spirit Wars: The Revival of Paganism at the Edge of the Third Millennium – “ Batalha Espiritual : O Re-avivamento do Paganismo no Limiar do Terceiro Milênio ” (Nashville, Tenn.: Thomas Nelson, 1996).

[2] Veja a revisão crítica , “Who Surprised Whom? The Holy Spirit or Jack Deere?” (Quem Surpreende Quem? O Espírito Santo ou Jack Deere. TMSJ 5 (Outono 1994):123-40).

[3] Veja Hank Hanagraaff, Counterfeit Revival (Dallas: Word, 1997) 134-37, 145-50.

[4] Ibid. Particularmente notório é o Prefacio escrito por um ex-pastor da Vineyard (ix-xviii). Também consulte-se The Briefing 45/46 (Abril 24, 1990) em que se dá considerável atenção a Deere e Wimber. Deere respondeu à critica do Briefing em “The Vineyard's Response to The Briefing ” (Anaheim, Calif.: The Assoc. of Vineyard Churches, 1992). Tamfém veja Thomas R. Edgar, Satisfied by the Promise of the Spirit (Grand Rapids: Kregel, 1996).

[5] Page citations in this section are from Surprised by the Power of the Spirit .

[6] Para ver o que Deere tem exposto em relação a John Wimber, leia John Wimber e Kevin Springer, Power Evangelism , 2ª ed. (San Francisco: Harper and Row, 1992), e John Wimber e Kevin Springer, Power Healing (San Francisco: Harper and Row, 1987). A defesa mais substancial do pensamento de John Wimber encontra-se em Gary S. Greig e Kevin N. Springer, eds., The Kingdom and the Power (Ventura, CA: Regal, 1993).

[7] “Os deístas bíblicos de hoje adoram a Bíblia” (251).

[8] Compare Mayhue, “Who Surprised Whom?” 129-32. Para uma completa discussão dos erros de interpreção consulte Richard Mayhue, How to Interpret the Bible for Yourself (Fearn, Ross-shire, Scotland: Christian Focus, 1997) 151-61.

[9] Deere cita Heb 13:2 ao menos cinco vezes (19, 26, 29, 137, 140). “O que aconteceu antes acontece hoje— basta ler a sua Bíblia,” escreve Deere (26). O ponto central de Heb. 13:2 não é a visitação angélica, mas particularmente a recepção de estrangeiros. Logo, mesmo se se recepcionara anjos, alguém pode não estar consciente disso a semelhança de Abraão o, então o ponto de Deere não o ponto central.

[10] Essa expressão tão impressionantemente estranha ilustra as expectativas grandiosas de Deere. Ele atualmente sugere que a experiência de Atos é anormal no que está abaixo do padrão. “Se todas as coisas são possíveis a quem crê, e Atos nos mostra algumas dessas possibilidades, não deveríamos fazer do cristianismo de Atos nosso objetivo? Melhor ainda, porque não podemos que o livro de Atos representa o ápice da experiência cristã? O que aconteceria se o Senhor da historia realmente reservou o melhor de seu vinho para os últimos dias? Você não gostaria de bebe-lo?” (46).

[11] Compare Mayhue, “Quem Surpreende Quem?” 129-32.

[12] Deere, Surprendido pela Voz 156. Quando Craig Blomberg fez a revisão de Surpreendido pelo Poder do Espirito em Themelios 21 (April 1996):26-27, ele escreve, “Deere ocupa-se com teologia narrativa por excelência. Ele simplesmente relata os eventos que ele experimentou, particularmento na esfera da cura fisica sobrenatural e profecias espetaculares, pelas quais ele abandonou suas crenças anteriores de que os sinais e maravilhas do movimento carismático contemporâneo não passam de produções humanas.”

[13] Edith L. Blumhofer, “Dispensando Scofield,” CT 38 (Janeiro, 10, 1994):57.

[14] Deere, “The Vineyard's Response,” na seção “Major Issues,” 3.

[15] Compare Mayhue, “Quem Surpreende Quem?” 132-34.

[16] Considere o exemplo profético de Samuel cujas palavras não falharam (1 Sam 3:19-20) e, em cont raste, as falsas palavras de Hananias (Jer 28:15-17), pelo que Deus o tirou a sua vida.

[17] Para um extenso t ratamento de Tiago 5:13-20 veja Richard Mayhue, The Healing Promise (Fearn, Ross-shire, Scotland: Christian Focus, 1997) 127-39.

[18] Para outros exemplo da eisegesis de Deere veja sua (1) discussão de expectativas pessais com respeito a voz de Deus (17); (2) linhas diretivas para um ministério profético (190-203); e (3) regras com respeito a “ciladas proféticas” (204-16).

[19] Veja Richard Mayhue, Spiritual Intimacy (Wheaton, Ill.: Victor, 1990) 113-34, para uma discussão biblica deste tema. Também veja John Murray, “The Guidance of the Holy Spirit” in Collected Writings of John Murray (Edinburgh: Banner of Truth, 1976) 1:186-89.  

[20] Abimeleque (Gen 20:3, 6); Jacó (Gen 28:12; 31:10, 11); Labão (Gen 31:24); José (Gen 37:5; cf. 42:9); coperio e padeiro de Faraó (Gen 40:5); Faraó (Gen 41:5, 8); Moisés (Num 12:6); um soldado (Juizes 7:13-14); Saul [implicito] (1 Sam 28:15); Salomão (1 Reis 3:5, 15); Jó (Jó 4:13; 7:14); Daniel (Dan 1:17; 2:1-2; 4:4-5; 5:12; 7:1); and Nabucodonozr (Dan 2:1-2; 4:4-5). A frequente menção de Deere a Jó 33:14-15 está discutida acima.

[21] Cinco relatos do nascimento de Cristo e sua primeira infância. Ele esteve com José (Mat 1:20; 2:13; 2:19; 2:22) e os magos (2:12). O último relato por no julgamento de Cristo, experimentado pela esposa de Pilatos (Mat 27:19).

[22] As únicas duas menções de sonhos no NT estão em Atos 2:17, comentado acima, e Judas 8 que adverte a igreja a acautelar quanto aos sonhadores.

[23] A braão (Gen 15:1); Jacob (Gen 46:2); Balaão (Num 24:4, 16); Samuel (1 Sam 3; Ps 89:19); Natã (2 Sam 7:4, 17; 1 Cro 17:15); Ido (2 Chr 9:29); Zacarias (2 Chr 26:5); Ezequiel (Ezek 1:1; 8:3; 11:24; 40:2; 43:3); Daniel (Dan 1:17; 2:19; 7:1-2; 8:1; 10:1); Nabucodonozor (Dan 4:5, 9-10, 13); profetas (Oséias 12:10); Joel (Joel 2:28); Amós (Amós 1:1); Obadias (Obad 1:1); Nahum (Nah 1:1); and Habacuque (Hab 2:2).

[24] Os quatro discipulos (Mat 17:9); Zacarias (Lucas 1:22); as mulheres no túmulo (Lucas 24:23); Ananias (Atos 9:10); Paulo (Atos 9:12; 16:9-10; 18:9; 26:19; 2 Cor 12:1); Pedro (Atos 10:3, 17, 19); e João (Apoc. 9:17).

 


Tradução livre: Anamim Lopes Dias
Brasília-DF


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