Celebração do Evangelho
(Resenha do Livro)
por

Isaias Lobão Pereira Jr.

AMORESE, Rubem Martins. Celebração do Evangelho: Compreendendo Culto e Liturgia. 3a. edição Editora Ultimato. Viçosa, MG. 1997.

Resenhado por Isaias Lobão P. Jr.

O livro de Rubem Amorese faz uma análise ousada, porém pertinente do culto evangélico brasileiro. O autor é presbítero da Igreja Presbiteriana do Planalto, em Brasília e assessor legislativo do Senado Federal. Além disto é membro da Fraternidade Teológica Latino-Americana, setor Brasil (FTL-B). esta obra foi apresentada originalmente como uma palestra para o presbitério de Brasília, da Igreja Presbiteriana do Brasil (IPB), denominação ao qual o autor pertence e atua pastoralmente.

O livro foi publicado pela primeira vez pela Editora Sião, de Brasília. Depois de alguns anos esgotado, foi reeditado pela Editora Ultimato, sediada em Viçosa, ligada a conhecida revista evangélica. O prefácio ficou a cargo do Rev. Caio Fábio.

A proposta de Rubem Amorese neste texto é analisar e debater junto com o leitor os diversos elementos que formam o culto evangélico. Utilizando-se do conhecimento das Ciências Sociais, ele faz uma análise ousada, como se fosse um observador estrangeiro ao universo evangélico. Esta crítica é por vezes bastante perturbadora.

A obra foi dividida da seguinte maneira, uma apresentação e uma introdução, seguida por cinco capítulos.

Na apresentação, o autor faz um importante alerta aos seus leitores. Este é um texto crítico. Em alguns momentos irá soar alto nos ouvidos dos que lêem. Por isto, ele explica a razão de sua ousadia, para deixar bem claro o amor que ele tem pela Igreja e sua Missão.

Na Introdução, Rubem vai explicar o título escolhido para sua obra. Baseando-se em Efésios 4.11-16, ele chega a conclusão que a Igreja tem, entre outras responsabilidades a missão de celebrar o evangelho. Segundo suas palavras: “celebrar o evangelho é vive-lo; é vivenciar uma nova realidade existencial no âmbito pessoal, social, espiritual e cósmico”. Ainda segundo ele, “assim, estudar a celebração, em seu aspecto cultural é estudar a dinâmica social na qual o ser humano produz, transforma e mantém significados existenciais comuns”.

Partindo da conceituação de Peter Berger para o processo cultural, Amorese utiliza e exemplo do guarda de trânsito, como uma criação humana que se transforma numa realidade objetiva, um produto cultural. Ele se utiliza deste argumento para apresentar sua tese, que será desenvolvida no decorrer do livro: “A celebração do evangelho se materializa na prática em ritos e artefatos. Rito, um determinado conjunto de práticas destinadas a dar expressão a um segmento completo de significado. Pelo rito, comunicam-se os sentidos existenciais, suas nuanças e expressões subjetivas. Como artefatos designam-se os objetos utilizados pelos celebrantes para veicular os estados interiores a serem celebrados... o artefato sofre uma dinâmica de modificação dos sentidos, sendo influenciado pelas práticas ou ele mesmo influenciado-as”.

A tarefa de Amorese é analisar o impacto destas transformações no grupo que recebeu o evangelho e como este grupo celebra esta boa-notícia. Para isto, ele se utiliza de duas regras hermenêuticas. A primeira, o que (o rito ou artefato) significava para aqueles que o viram ou presenciaram, “lá e então”. A segunda, o que tal (rito ou artefato) significa hoje, “aqui e agora”.

“Tal tarefa consiste em transpor os significados originais da realidade estudada para nossa situação atual. O processo começa pela ação de ‘despir’ o fato de sua roupagem cultural, para descobrir seu ‘princípio humano’, sua essência. Finaliza com a ação de ‘vestir’este núcleo com as roupagens do ‘aqui e agora’”.

Para efetuar esta tarefa de desnudamento, Amorese parte, no capítulo 1, de um rito não litúrgico. A festa de aniversário. “O aniversário se instalou como decorrência da importância de contar o tempo... está ligado à nossa compreensão de finitude”. A seguir ele passa a analisar os componentes de uma festa de aniversário, cada um dos ritos. Estes ritos transmitem um conteúdo, e torna-se a ponte que o autor irá ligar ao rito de celebração do culto evangélico.

No capítulo 2, Amorese fala sobre os gestos no culto. Para ele, os gestos são as “palavras que almas que expressar”. O primeiro gesto analisado é o de levantar as mãos no culto. O autor critica este gesto, quando ele não vem acompanhado de sua real significaçào bíblico-teológica. Ele fala de sua ampla divulgação através de movimentos renovacionistas, e de seu esvaziamento. Outro gesto, uma expressão verbal, também é criticada por Amorese. A conhecida expressão “Paz do Senhor”. Que deixou de ser uma saudação e palavra abençoadora para se tornar uma senha identificadora do grupo, que separa os não-iniciados (perdidos) dos iniciados (salvos). O terceiro rito analisado é o de orar com os olhos fechados. Ele questiona o fato de sempre quando o crente vai orar, ele fecha os olhos. Para o autor, e ele apresenta experiências pessoais, a oração pode ser feita com os olhos abertos. Não existe nada de mágico, nem de espiritual, no ato de fechar os olhos para orar. Isto leva o autor a conclusão deste capítulo: “o gesto da alma nos ajuda a celebrar o evangelho...mas [ele] não deve ser sacralizado a ponto de nos levar a perder a liberdade de adorar adequadamente ao Senhor”.

No capítulo 3, o autor analisa os ritos que fazem parte do culto, que ele chama de “frase da alma”. Para Amorese, o gesto esta num nível mais elementar, enquanto que o rito expressa formas mais complexas e elaboradas. E por isto eles denunciam as práticas sociais onde foram gerados. Pode-se entender pelos ritos de culto de uma determinada igreja, se ela é de origem européia ou norte-americana, ou se ela é mais contextualizada. O primeiro rito analisado é a Oração Dominical, ou o Pai Nosso, oração ensinada por Jesus. Para o autor, esta oração foi ensinada por Jesus como se fossem temas a serem explorados na vida litúrgica da igreja, e não para ser repetida como uma fórmula mágica, nem limitada ao uso coletivo, na igreja, mas, ampliada para a devoção de cada cristão, individualmente.

A seguir ele passa a descrever o papel da liderança qualificada na igreja, onde o autor, me parece, transmite uma tensão pessoal. Sua experiência eclesial é menos clerical que sua própria denominação. No seu texto ele expressa seu descontentamento com a tendência secularizante da igreja , que busca lideres de acordo com os padrões de eficiência e estéticas mundanas. Neste capítulo ele analise um importante rito da vida da igreja, o canto coral. Segundo Amorese: “trata-se de um rito tipicamente de adoração, destinado a expressar pela musica segmentos de significado do evangelho”. Amorese critica com acidez este rito. Ele faz questionamentos sérios e profundos, até mesmo sua legitimidade na vida da igreja.

Depois ele encerra falando da Ceia do Senhor. Vê-se pelo seu texto que este é um momento especial na sua vida devocional. Ele desafia a Igreja a retirar os elementos tradicionais e idólatras que nos chegaram pela inculturação da mensagem do evangelho e busca apresentar-nos o real significado da Ceia do Senhor, celebrando com alegria a vitória de Jesus sobre o pecado e a morte. Para mim este é o ponto alto do livro

No quarto capitulo, Amorese apresenta a liturgia do culto, ou seja, a união de todos os elementos anteriormente analisados por ele. Ele faz duas comparações, da liturgia com um texto e da liturgia com a opera. No primeiro, ele candidamente, apresenta sua crítica às liturgias pré-impressas, tão comuns nas denominações históricas, entre as quais, a que o autor pertence. Para ele, o culto deve ser dinâmico, e buscar expressar vida. Uma liturgia estagnada, afirma Amorese, apresenta uma liderança limitada. O culto é comparado a um texto vem escrito e atualizado, enquanto que uma liturgia estacionada é como se fosse um texto “xerocado”. Em seguida, ele faz uma outra comparação, a do culto com a ópera. Com uma ressalva importante, que no culto não se admite expectadores. Todos são convocados a adorar. O único expectador é Deus, a quem é oferecido o culto. O culto pode ser comparado com a ópera pelos seguintes elementos: o clima de espetáculo que arrebata os corações, a platéia é o próprio Deus e os artistas sãos os crentes oferecendo-Lhe o louvor e a adoração, a harmonia é destacada como elemento comparativo, todos adoram juntos. E finalmente, Amorese termina falando da diversidade no culto; “há espaço para toda diversidade da alma humana...há espaço para todos os dons e aptidões”.

No último capitulo, Rubem Amorese nos fala de dois artefatos culturais importantes para o culto, o hinário e o púlpito. No caso do hinário, Amorese faz criticas relevantes, como a antiguidade dos hinos e talvez de sua pequena relevância hoje. Ele questiona a imposição cultural que muitos hinos representam para a igreja brasileira. Porém, em minha opinião, eles não devem ser descartados, mas também contextualizados. E me parece, esta é a opinião do autor, que na sua vida litúrgica mantém a rica hinódia tradicional, com destaque para as produções mais recentes. No caso do púlpito, sua critica passa por um pequeno histórico do uso deste artefato e vai até sua sacralização moderna. Ele questiona a limitação do púlpito aos ministros ordenados, mais uma vez Amorese expressa sua tendência leiga, versus a versão clerical que muitas igrejas, infelizmente, adotam.

Por fim, o autor conclui seu trabalho, afirmando que sua intenção com a obra foi de “ajudar aos irmãos a compreender um pouco mais de sua realidade eclesiástica, para que possamos dizer ao mundo que não é preciso, como ele em geral pensa, o suicídio intelectual para abraçar a fé”.


 


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