A História e os Propósitos de Deus

por

Mauro Meister



Uma miríade de evangélicos norte-americanos (pastores, tele-evangelistas e etc.) saiu em “defesa de Deus” depois dos ataques terroristas de 11 de setembro. Ainda que por um lado alguns reconhecidos evangelistas julgaram que o ataque era uma punição vinda de Deus por causa da permissividade da cultura e sociedade norte-americana, por outro, muitos tentaram defender a Deus tirando-o de cena: “Deus não tem nada a ver com essa tragédia, isso é culpa do Diabo”. Em ambos os casos a interpretação está além ou aquém da linha da interpretação histórico gramatical das Escrituras. O primeiro, ao atribuir uma causa específica para um acontecimento que não se encontra nas Escrituras. O segundo, por negar a soberania de Deus!

Deve-se ao menos considerar, pelo ensino das Escrituras, que os acontecimentos de 11 de setembro estavam totalmente dentro do controle de Deus. O problema é que muitos crentes se tornam ‘deistas’ diante de catástrofes ou tragédias. Certo dia pela manhã uma de nossas secretárias chegou ao trabalho dizendo que havia passado por uma situação terrível em que quase batera o carro e afirmou: “Mas Deus é fiel!” Imediatamente perguntei a ela se Deus deixaria de ser fiel caso tivesse batido. Para muitos Deus controla tudo o que é bom, e nada do que seja mau está debaixo de sua mão. Considerando partes bem claras da Escritura, esse não é seu ensino. Vejam alguns exemplos das Escrituras para uma reflexão mais profunda.

José, filho de Jacó – a história de José é trágica. Seus irmãos o odeiam, colocam-no em um poço seco para que morra, mudam de idéia, o vendem para mercadores que o levam para o Egito. No Egito, no ápice de sua prosperidade, a tragédia o atinge novamente e ele vai parar na prisão – de escravo a encarcerado. A situação piorou! Depois disso José é conduzido ao cargo de governador de todo o Egito. Seus irmãos voltam, “por acaso”, a se encontrar com José e são por ele abençoados, mas o temem porque sabem o que fizeram contra ele. No entanto, a história termina da seguinte forma (Gn 50.20):

Respondeu-lhes José: Não temais; acaso, estou eu em lugar de Deus?

Vós, na verdade, intentastes o mal contra mim; porém Deus o tornou em bem, para fazer, como vedes agora, que se conserve muita gente em vida.

Na forma como o texto se encontra traduzido em português pode-se concluir que Deus tornou o mal em bem. Nesse caso, pode parecer que o mal feito pelos irmãos contra José estava além do alcance de Deus, mas ainda assim, Ele conseguiu transformar o mal em bem, ou seja, a providência de Deus só começaria a partir do mal feito a José. Chamo a atenção para a importância de se estar mais equipado. Observando essa sentença (50.20) na língua hebraica, língua na qual foi escrita, percebe-se que uma tradução mais elucidadora seria: “Vós, na verdade, intentastes mal contra mim; porém Deus o intentou para bem...” Nas traduções comumente utilizadas aparece “vós intentastes / Deus o tornou”. A versão Almeida Corrigida Fiel captou melhor o que se tem na verdade, ou seja, a repetição do mesmo verbo na língua original. Assim, pode-se concluir que mesmo o mal feito pelos irmãos de José estava nos desígnios de Deus para que este pudesse abençoar sua família e dar continuidade às promessas de vida que Ele mesmo havia feito aos antepassados de José, ou seja, a providência de Deus estava em enviar José ao Egito, ainda que usando os maus intentos de seus irmãos. Comentando nessa passagem Calvino elucida: “A venda de José foi um crime detestável pela sua crueldade e perfídia; ainda assim, ele não foi vendido a não ser pelo decreto celeste...Logo, podemos afirmar com verdade e propriedade, que José foi vendido pelo ímpio consentimento de seus irmãos, e pela providência secreta de Deus. Ainda assim, não foi um trabalho comum a ambos, no sentido de que Deus tenha sancionado qualquer coisa relacionada à ímpia cobiça deles: porque enquanto eles estão tramando a destruição de seu irmão, Deus está efetuando do alto a sua libertação.” (Calvino, Comentário em Gênesis). A história de José nos mostra a soberania de Deus sobre todas as coisas, e não só as coisas boas. Há propósito em tudo o que acontece, e esse propósito é determinado por Deus.

Israel e Judá – Outro exemplo muito claro da soberania de Deus sobre cada detalhe, não só os que normalmente apreciamos, é a história dos Reinos do Norte e do Sul. O fim do Reino do Norte (Israel) e o cativeiro do Reino do Sul (Judá), foram ambos determinados pelo desígnio de Deus. Os profetas trouxeram previamente a palavra ao povo de ambos os reinos quanto ao que haveria de acontecer. Basta ler o livro de Oséias para observar que a destruição do Reino do Norte não teve por causa última a maldade e poder da Assíria, mas a disciplina de Deus sobre o povo, usando como seu instrumento aquela nação. O mesmo se pode dizer do Reino do Sul, sua queda, seu exílio e seu retorno. O profeta Habacuque teve como resposta clara de Deus a seus queixumes: “Pois eis que suscito os Caldeus, nação amarga e impetuosa, que marcham pela largura da terra, para apoderar-se de moradas que não são suas.” (Hc 1.6) Deus lançou mão de uma nação ímpia para disciplinar o seu povo, assim como, posteriormente, teve como instrumento um rei ímpio, chamado Ciro, para lhes levar de volta à terra, conforme Isaías 45.1. Nesse mesmo capítulo profético, Deus mostra ao profeta que Ele, o Deus Iavé, soberano sobre todas as coisas, toma a Ciro para derrubar nações, a fim de que se saiba “...que eu sou o Senhor, o Deus de Israel...” (45.3), “...até ao nascente do sol e até o poente, que além de mim não há outro” (45.6), e ainda, “Eu formo a luz e crio as trevas, faço a paz e crio o mal; eu, o Senhor, faço todas estas coisas” (45.7). Parece claro pelo contexto que o “mal” refere-se à guerra, em contraste com a paz. A lição é muito clara: não há nada que esteja fora do controle absoluto de Deus. Há propósito na história!

Jesus, filho de Deus – Talvez uma das passagens mais intrigantes sobre a morte de Cristo seja a passagem de Atos 2.22-23:

Varões israelitas, atendei a estas palavras: Jesus, o Nazareno, varão aprovado por Deus diante de vós com milagres, prodígios e sinais, os quais o próprio Deus realizou por intermédio dele entre vós, como vós mesmos sabeis; sendo este entregue pelo determinado desígnio e presciência de Deus, vós o matastes, crucificando-o por mãos de iníquos;

As palavras de Pedro são cristalinas: quem matou Jesus, o Nazareno, foram os varões israelitas. Eles, como os irmãos de José, certamente intentaram o mal contra Jesus. Mas isso somente aconteceu porque Jesus foi “entregue pelo determinado desígnio e presciência de Deus.” Por mais que se queira definir a presciência como mero conhecimento prévio do que haveria de acontecer, o que é errado, não há como escapar do desígnio. Foi Deus quem planejou e decidiu que seu unigênito fosse morto em favor dos eleitos, inclusive determinando que tipo de morte haveria de morrer. Essa foi a ação soberana de Deus com propósito: que vivamos e ensinemos uma teologia com propósito: a glória de Deus.

Fica ainda a pergunta: por que essas coisas tão terríveis aconteceram, Senhor? Não sabemos, a única certeza que temos é que elas têm um propósito nas mãos de Deus.


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