Pular para o conteúdo

Caridade Inteligente, Compaixão com Princípios

A viúva realmente necessitada e desamparada põe sua esperança em Deus e persiste dia e noite em oração e em súplica. Mas a que vive para os prazeres, ainda que esteja viva, está morta.

Nenhuma mulher deve ser inscrita na lista de viúvas, a não ser que tenha mais de sessenta anos de idade, tenha sido fiel a seu marido e seja bem conhecida por suas boas obras, tais como criar filhos, ser hospitaleira, lavar os pés dos santos, socorrer os atribulados e dedicar-se a todo tipo de boa obra.

Não inclua nessa lista as viúvas mais jovens, pois, quando os seus desejos sensuais superam a sua dedicação a Cristo, querem se casar. Assim elas trazem condenação sobre si, por haverem rompido seu primeiro compromisso. Além disso, aprendem a ficar ociosas, andando de casa em casa; e não se tornam apenas ociosas, mas também fofoqueiras e indiscretas, falando coisas que não devem. Portanto, aconselho que as viúvas mais jovens se casem, tenham filhos, administrem suas casas e não deem ao inimigo nenhum motivo para maledicência. Algumas, na verdade, já se desviaram, para seguir a Satanás.

Se alguma mulher crente tem viúvas em sua família, deve ajudá-las. Não seja a igreja sobrecarregada com elas, a fim de que as viúvas realmente necessitadas sejam auxiliadas. (1 Timóteo 5.5-6, 9-16)

A igreja primitiva era inteligente e tinha princípios na distribuição de ajuda. Talvez ela carecesse das burocracias do mundo moderno, mas chatice não deveria ser confundido com gestão desenvolvida. As instruções de Paulo com respeito às viúvas mostra que a igreja primitiva observava vários fatores essenciais na administração eficaz da caridade. Havia termos claros e precisos para definir indivíduos que estavam qualificados para receber ajuda. A necessidade apenas era insuficiente para constituir uma reivindicação legítima aos recursos da igreja – é significante que o apóstolo tenha colocado tanta ênfase sobre se as pessoas cumpriam as suas responsabilidades estabelecidas pelos preceitos do evangelho.

O fato que havia uma lista de viúvas que estavam qualificadas a receber ajuda implica deliberação e organização. Eles tinham um sistema de doação que envolvia muito mais do que distribuir dinheiro e mantimentos a indivíduos anônimos aguardando numa fila em diversos horários. Além disso, os termos eram muito mais estritos que aqueles de qualquer igreja contemporânea que encontramos, pelo fato de exigir uma história estabelecida de conduta santa. Se a igreja fazia algumas exceções para casos muito especiais, certamente eram exceções que provavam a regra.

Aquelas que não se qualificavam para receber ajuda como viúvas poderiam obter alguma forma de assistência sobre outra base – talvez como indivíduos que precisavam de ajudar para sobreviver. Contudo, mesmo se isso acontecesse, teria sido ocasional, espontâneo e temporário, bem como insuficiente para manter o sustento de uma pessoa. De outra forma, o sistema inteiro de caridade para com as viúvas teria sido sem sentido. Esse programa para sustentar as viúvas surgiu do desejo da igreja em exercer compaixão com inteligência e integridade. As restrições tinham o intuito de limitar o fardo da igreja, bem como impedir qualquer escândalo que trouxesse vergonha ao nome de Cristo. A verdadeira ética cristã sempre coloca a honra de Deus acima das próprias vidas de homens e mulheres que supostamente devemos ajudar. Esse é um princípio inflexível que deve governar todas as obras de caridade sem exceção ou hesitação.

Esta foi uma das principais razões para recusar auxílio a viúvas jovens licenciosas. Paulo não forneceu nenhum outro caminho para elas receberam sustento da igreja. Elas seriam forçadas a casar de novo e sossegar, ou morrer de fome. Diferente da igreja moderna, os crentes antigos recusavam patrocinar a vida pecaminosa em nome da compaixão. Isso é chocante para os sentimentos humanistas contemporâneos, seja dentro ou fora da igreja, mas não é uma inferência duvidosa a partir de uma passagem isolada. O apóstolo também nos ordena em outro lugar: “Se alguém não quiser trabalhar, também não coma” (2Ts 3.10). Ali ele não fornece nenhuma outra forma para um homem sobreviver. Se um homem pode trabalhar mas não o faz, a igreja não deve sustentá-lo com dinheiro e mantimentos. O homem então ou será forçado a trabalhar (se apropriado, a igreja pode até contratá-lo), em cujo caso não morrerá de fome, ou ele permanecerá ocioso e morrerá, em cujo caso seria um ato de suicídio.

A Escritura exige que toda pessoa assuma sua própria responsabilidade antes de poder receber ajuda da igreja. Um homem que pode trabalhar, deve trabalhar. O mesmo pensamento se aplica aqui, visto o apóstolo dizer: “Mas a que vive para os prazeres, ainda que esteja viva, está morta”. Podemos mantê-la viva com comida e abrigo, mas se ela chafurda no mundanismo, então ela já está “morta” num sentido profundo. Ela é um cadáver ambulante. Quando uma pessoa escolhe se matar, embora lentamente, podemos detê-la apenas por um tempo, mas eventualmente ela terá sucesso. A igreja não incorre em culpa em tais casos.

Os filhos devem sustentar os pais que estão em necessidade. Todavia, quando isso é necessário, pressupõe-se alguma falha nos pais. O motivo é que Paulo diz em outro lugar: “Além disso, os filhos não devem ajuntar riquezas para os pais, mas os pais para os filhos” (2Co 12.14). Isto é, os filhos não deveriam ter que salvar ou sustentar seus pais, mas os pais deveriam ser capazes de sustentar a si mesmos durante toda a sua vida e ainda ter uma herança para deixar aos seus filhos quando morrerem. Ao invés de passar dívidas e encargos de geração para geração, é melhor passar economia e posses. Esse é o ideal, mas nem sempre acontece. E quando os pais são incapazes de sustentarem a si mesmos, os filhos devem sustentá-los.

As instruções de Paulo impediria que muitas pessoas enganassem o sistema, ou explorassem a generosidade dos cristãos. Uma viúva poderia ter mentido sobre sua idade, mas seria mais difícil falsificar uma reputação estabelecida de fidelidade ao esposo e “todos os tipos de boas obras” (NIV). Repetindo, deve ser enfatizado que se viúvas que não estavam qualificadas eram todavia inclusas na lista, isso tornaria inútil as exigências do apóstolo. Visto que o respeito pela inspiração divina significa que não devemos ignorar suas instruções, então não devemos ignorar nem afrouxar essas exigências. Quando o mundo define compaixão tão diferentemente, e quando favorece a vida e conforto humano bem mais que a honra de Deus, é necessário coragem e obediência para implementar esse tipo de programa na igreja. A caridade humanista ajuda alguém apenas por ser um ser humano como nós, e não por causa do mandamento de Deus. Se estamos agindo sobre a base do mandamento de Deus, então faremos o que ele de fato diz, e isso inclui excluir viúvas desqualificadas e deixar que homens ociosos morram de fome.

Às vezes as pessoas pensam que avançamos muito no pensamento e na inteligência, e também em nossos padrões éticos. Mas isso é baseado mais na arrogância e equívoco do que na verdade. Seria um engano supor que a igreja primitiva não era sofisticada, e que a igreja moderna possui princípios superiores para regulamentar a gestão da ajuda de caridade. Não, na medida em que seguiu a abordagem estabelecida pelo apóstolo, a igreja exerceu inteligência sem burocracias chatas, e administrou seus recursos de acordo com os princípios do evangelho, sempre com vista na honra do nome de Cristo em tudo o que fazia. A igreja moderna tem por vezes caído na armadilha humanista de cuidar mais de satisfazer as necessidades materiais das pessoas, e tem esquecido de reforçar os princípios de caráter e responsabilidade que emergem do evangelho de Jesus Cristo.

[divider]

Fonte: Reflections on First Timothy

Tradução: Felipe Sabino de Araújo Neto

Marcações: