J. Gresham Machen e o Princípio Regulador

por

D. G. Hart e John R. Meuther


Um dos episódios menos conhecidos na tormentosa carreira de J. Gresham Machen's (1881-1937) foi sua nomeação em 1926 para ser professor de apologética no Seminário de Princeton. Desde 1906 ele tinha ensinado Novo Testamento em Princeton e tinha se distinguido em obras tais como The Origin of Paul's Religion [A Origem da Religião de Paulo] (1921) como o principal erudito bíblico conservador de seus dias. Todavia, o campo da apologética não era estranho para Machen, como evidenciado por seus livros populares, Christianity and Liberalism [Cristianismo e Liberalismo] (1923) e What Is Faith? [O que é Fé?] (1925), obras que defendiam vigorosamente o Cristianismo histórico e a importância da teologia. Todavia, o que fez a nomeação de Machen à cadeira de apologética ser incomum, não foi sua falta de experiência formal, mas antes a oposição que sua nomeação excitou.

A eleição e promoção de qualquer professor de Princeton requeria confirmação da Igreja Presbiteriana na Assembléia Geral dos E.U.A. Este passo no processo de nomeação era freqüentemente uma mera formalidade. Na história de Princeton jamais um nomeado tinha sido vetado. Todavia, um resultado diferente aguardava Machen. A Assembléia Geral de 1926 recebeu um relatório que questionava sua firmeza por causa de sua atitude para com a Proibição. [1] Na reunião do Presbitério de Nova Jersey, Machen tinha votado contra uma resolução que endossava a Décima Oitava Emenda e o Ato de Volstead. Ele não queria seu voto registrado porque ele sabia que sua posição diferia da maioria dos Protestantes americanos. A proibição da venda e distribuição de álcool desfrutou de amplo apoio como um esforço para reter o caráter cristão da nação num tempo de imigração de não-Protestantes sem precedentes. A oposição de Machen à Proibição foi a principal razão para a Assembléia Geral recusar confirmar sua nomeação. Como um de seus amigos mais tarde lhe contou, a Assembléia era “radicalmente Proibicionista”; comissionários não podiam entender porque um bom cristão não apoiaria uma causa tão obviamente boa e bíblica.

Machen opôs-se a apoiar a Proibição, contudo, não porque ele aprovava a embriaguez ou preferia a impopularidade. Antes, ele assim o fez por razões teológicas, e até mesmo Reformadas. Numa declaração defendendo sua posição (nunca publicada novamente por causa do dano que seus amigos criam que teria feito) Machen argumentou que a igreja não tinha nenhum argumento legítimo para tomar um lado nesta questão política. À parte da questão das relações entre igreja e estado, ele cria que a igreja estava limitada pela Palavra de Deus e assim, todas as suas declarações e resoluções tinham que ter clara garantia escriturística. No entanto, a Bíblia não provia um apoio para a Proibição. Ela ensina a idéia de temperança, isto é, consumo moderado de álcool e outras boas coisas da criação de Deus. Isto significa que a Escritura proíbe a embriaguez. Mas nem mesmo aqui a Bíblia dá instruções para oficiais do governo abolirem a bebedice. Seria este um assunto para o governo federal administrar ou deveriam os estados e governos locais assim o fazerem? A legislação era a melhor forma de moldar o sentimento publico ou um programa educacional seria mais eficaz? O regulamento do comportamento privado do cidadão era ao menos uma preocupação correta do estado? A Bíblia não responde estas e várias outras perguntas. Assim, Machen concluiu, a igreja não tinha o direito de interferir nas políticas da Proibição ou em qualquer outro assunto onde a Escritura não fala.

O raciocínio de Machen aqui era uma extensão do Princípio Regulador. Na tradição Presbiteriana e Reformada, este princípio tinha sido tipicamente aplicado à adoração pública. Ele ensina que podemos adorar a Deus somente da forma como Ele nos ordenou, na Sua Palavra, a adorá-Lo. Pessoas que ouvem esta doutrina pela primeira vez frequentemente entendem-na como excessivamente negativa e restritiva, como se não tivéssemos liberdade na adoração. Embora o Princípio Regulador limite o que podemos fazer na adoração, da mesma forma importante é o que ele ensina sobre liberdade de consciência e o Senhorio de Cristo. Como a Confissão de Fé de Westminster ensina (20.2), “Somente Deus é o Senhor da consciência”. Atar as consciências dos crentes ao ensino da Escritura é reconhecer e estender o Senhorio de Cristo. Mas assim o fazer somente sobre a base da sabedoria ou preferência humana é usurpar a sua regra.

Este princípio é o que separa Presbiterianos de outros Protestantes. Diferentemente dos Luteranos e Anglicanos, que crêem que as igrejas podem fazer o que a palavra de Deus permite, Presbiterianos e Reformados ensinam que as igrejas podem fazer somente o que a Escritura ordena; por conseguinte o nome Reformado, “reformado segundo a Palavra de Deus”.

O Princípio Regulador se aplica não somente à adoração, mas a todos os aspectos da vida e testemunho da igreja. A menos que a igreja possa encontrar uma clara garantia das Escrituras para um ensino ou prática particular, ela não pode falar ou agir. De outra forma, ela corre o risco de atar as consciências dos crentes e usurpar o Senhorio de Cristo. Neste sentido amplo, o Princípio Regulador é apenas uma variação do princípio formal da Reforma, a saber, “sola scriptura”. Os Reformadores criam que Roma tinha substituído a Palavra de Deus pela palavra de homem (isto é, o papado). João Calvino lutou com justamente esta questão quando ele respondeu ao argumento que ele deveria se submeter às leis da igreja Romana, mesmo que elas fossem injustas, pois Deus ordena que os cristãos se submetam aos poderes que Ele ordenou. Calvino respondeu que não era uma questão de simplesmente suportar “alguma opressão dolorosa em nossos corpos”. A questão real era “se nossas consciências deveriam ser privadas de sua liberdade, isto é, dos benefícios do sangue de Cristo”. Segundo Calvino, esta não era uma questão trivial. “Nenhuma obrigatoriedade deve ser imposta sobre as consciências nas coisas das quais elas foram postas em liberdade por Cristo”, ele escreveu”, porque sem esta liberdade homem nenhum teria paz com Deus. “Se [crentes] desejam reter a graça que eles uma vez obtiveram em Cristo; eles não devem se submeter a nenhuma escravidão; eles não devem ser acorrentados por nenhum grilhão”.

As amplas implicações do Princípio Regulador são considerações importantes para os oficiais encarregados de governar o testemunho e a prática da igreja. Especialmente numa época em que as congregações estão tomando mais e mais responsabilidades, desde creche até aeróbica cristã, o Princípio Regulador reage com um sábio lembrete de que a obra da igreja é prescrita por sua cabeça, o Senhor Jesus falando através da Sua Palavra, e que Ele comissionou oficiais para fazer discípulos de todas as nações, não com base na sabedoria ou ingenuidade humana, mas pela fiel proclamação da sua Palavra.


D. G. Hart e John Muether são co-autores de Fighting the Good Fight: A Brief History of the Orthodox Presbyterian Church [Lutando o Bom Combate: Uma Breve História da Igreja Presbiteriana Ortodoxa]. Dr. Hart foi presbítero da CRC em Wheaton, Illinois. Ele é agora membro da OPC Calvário, Glenside, Pennsylvania. O Sr. Muether é presbítero na OPC Lake Sherwood em Orlando, Florida. Este artigo foi extraído de Ordained Servant, vol. 6, no. 1.

 

NOTAS:

[1] - Nota do tradutor: (1919-1933) período durante o qual a Décima Oitava Emenda estava em vigor e a venda manufaturada e o transporte de bebidas alcoólicas eram ilegais nos Estados Unidos da América. [voltar]


Traduzido por: Felipe Sabino de Araújo Neto
Cuiabá-MT, 19 de Junho de 2005.

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