Pós-Milenismo

por

Loraine Boettner, D.D.a

 


Capítulo 10 - Uma Apostasia e Rebelião Final?




Uma questão que confronta tanto o Pós- como o Pré-Milenismo é esta: haverá uma breve, mas mundial, apostasia e rebelião no final do Milênio? A vasta proporção da raça humana, depois de desfrutar os altos privilégios que se incorporaram à vida durante a era milenar, se voltarão violentamente contra Deus e a justiça, e tentarão sobrepujar o Reino que foi estabelecido?

Que isto sucederá tem sido geralmente a suposição do Pós-Milenismo — e do Pré-Milenismo igualmente. Até onde o Amilenismo está preocupado com uma rebelião final não se apresenta uma dificuldade especial, pois ele não espera uma era futura de justiça. A maioria dos Amilenistas, contudo, tem também esperado uma apostasia. Mas seja nos princípios pós-milenistas ou pré-milenistas, e acontecendo no próprio cume do reino milenar, tal desenvolvimento parece ser anti-climático e apresentar uma característica muito desagradável. Seja a era milenar vista como um resultado e fruto de uma longa e custosa campanha de evangelismo mundial, como o Pós-Milenista crê, ou seja ela vista como um reino divinamente estabelecido com Cristo governando em pessoa em Jerusalém, uma apostasia ou rebelião final, na qual ao Diabo é dado um triunfo mundial, mesmo que breve, parece ser inteiramente incongruente. Muita da glória do Reino pareceria estar perdida com semelhante rebelião.

A passagem da Escritura citada com respeito a isto é Apocalipse 20:3,7-10. Depois da declaração de que Satanás deve ser acorrentado e lançado no abismo por mil anos, para que ele não mais engane as nações, lemos: “Depois disto é necessário que ele seja solto por um pouco de tempo...E, acabando-se os mil anos, Satanás será solto da sua prisão, e sairá a enganar as nações que estão nos quatro cantos da terra, Gogue e Magogue, cujo número é como a areia do mar, a fim de ajuntá-las para a batalha. E subiram sobre a largura da terra, e cercaram o arraial dos santos e a cidade amada; mas desceu fogo do céu, e os devorou; e o Diabo, que os enganava, foi lançado no lago de fogo e enxofre, onde estão a besta e o falso profeta; e de dia e de noite serão atormentados para todo o sempre”.

Esta passagem contém muita linguagem figurada e é reconhecidamente difícil de interpretar. Contudo, como declarado anteriormente, cremos que a prisão de Satanás descrita nos versos 1-3, para que ele não possa mais enganar as nações, significa que o mundo será cristianizado. Estes versos parecem claramente se referir à terra, visto que João viu o anjo descendo do céu, e o Diabo foi preso para que não enganasse mais as nações até que se acabassem os mil anos. “Nações” referem-se à vida terrena, não à vida celestial. Cremos que os versos 4-5 são parênteses e que eles se referem ao estado intermediário.

Deve ser lembrado, em primeiro lugar, que o Diabo já é um inimigo derrotado e arruinado, e que ele não pode tentar ou ferir a humanidade, ou fazer qualquer outra coisa, exceto à medida que ele recebe permissão de Deus. Os Pré-Milenistas têm a tendência de diminuir o poder de Deus e sobreestimar o poder do Diabo. Alguns falam como se o Diabo fosse um inimigo formidável, “o deus deste mundo” num sentido literal, competindo praticamente em pé de igualdade com Deus, e ganhando muitas vitórias. Nós nunca poderemos entender o curso dos eventos deste mundo, a menos que tenhamos em mente que Deus é o absoluto e incontestável Soberano de tudo que existe, e que nenhum evento, bom ou mal, grande ou pequeno, pode acontecer sem Sua vontade decretiva ou permissiva. Que Ele permite muito mal que Ele poderia impedir Se escolhesse, é um fato inegável. Mas Ele o limita, controla e domina para Sua própria glória e para o grande bem do Seu povo. Ele freqüentemente usa uma pessoa ou poder maléfico para punir outra. O poder que o Diabo e os homens maus têm neste mundo é como aquele que o cruel e arrogante rei da Assíria exerceu para com Israel, o qual, embora perseguindo seus próprios planos, era na realidade somente o instrumento de Deus para o castigo severo de Israel (Isaías 10:5-15). Ele estava completamente nas mãos de Deus e não podia ir além do que Deus tinha escolhido permiti-lo ir. Esta é a única visão adequada do curso da história, se haveremos de entender os tratamentos de Deus com os homens.

Tudo isto é claramente trazido à luz na história de Jó. O Diabo não podia tocar Jó até que lhe fosse dada permissão e então, poderia assim fazer somente dentro dos limites prescritos. Neste exemplo, Deus dominou os desejos maus do Diabo e fez uso deles para uma maior santificação do Seu servo. Por estes meios Deus provou a paciência de Jó, humilhou seu orgulho, venceu sua auto-confiança, e no final levou Jó a uma confiança mais profunda em Sua graça. No Novo Testamento lemos que “Deus não perdoou aos anjos que pecaram (inclusive o Diabo), mas, havendo-os lançado no inferno, os entregou às cadeias da escuridão, ficando reservados para o juízo” (2 Pedro 2:4). Durante o ministério público de Jesus, o Diabo e os demônios eram imediatamente sujeitos às Suas ordens. Portanto, qualquer interpretação que fizermos de Apocalipse 20, deve ser feita com a compreensão de que o Diabo está, em todos os tempos, debaixo do controle absoluto de Deus e sujeito às Suas ordens”.

Esta “guerra” final, certamente, não tem nada a ver com as estratégias ou armas militares, nem mesmo com as localizações geográficas. Ela é a última fase da batalha que tem sido travada entre a semente da mulher e a semente da serpente, desde a queda do homem no Jardim do Éden. Foi mostrado, nós cremos, que a grande batalha descrita em Apocalipse 19:11-21 não é militar, mas um conflito espiritual que se enfurece através dos séculos. A guerra contra os santos em Apocalipse 20:7-10 é da mesma natureza, embora de duração muito mais curta. O povo do Senhor tem um lugar de refúgio e segurança no “arraial dos santos”, “a cidade amada”, e nenhum deles se perderá. “O arraial dos santos” e “a cidade amada” do versículo 9 são expressões figuradas que claramente se referem à Igreja, que é uma fonte de força e sabedoria espiritual e segurança para os santos. As almas regeneradas na verdadeira Igreja, como revelado em Apocalipse 7:3-4, são seladas para que elas não possam ser feridas, isto é, para que não possam ser levadas à apostasia por alguma das obras do Diabo. Nenhum verdadeiro santo apostata para o serviço do Diabo. Em todo tempo eles estão sob a divina proteção, que é simbolizada pelo fogo que desce do céu e devora seus inimigos. As armas usadas por Satanás e seus seguidores são doutrinas falsas, heresias, mentiras, blasfêmias, etc., que são diretamente contra o povo do Senhor. Aqueles que não são cristãos nascidos de novo são vítimas fáceis dos enganos do Diabo e tornam-se seus seguidores. Mas os verdadeiros cristãos estão preparados interiormente e prontos para enfrentar qualquer ataque, e não podem ser feridos por nenhuma destas coisas.

Paulo, quando escrevendo aos cristãos da Igreja em Éfeso, usou linguagem similar e expôs afinal a idéia de que o cristão está preparado interiormente e seguro contra os ataques do maligno. “Revesti-vos de toda a armadura de Deus”, ele disse, “para que possais estar firmes contra as astutas ciladas do Diabo”. “Porque”, ele continua, “nossa luta não é contra a carne e o sangue, mas, sim, contra os principados, contra as potestades, contra os príncipes das trevas deste século, contra as hostes espirituais da maldade, nos lugares celestiais. Portanto, tomai toda a armadura de Deus, para que possais resistir no dia mau e, havendo feito tudo, ficar firmes. Estai, pois, firmes, tendo cingidos os vossos lombos com a verdade, e vestida a couraça da justiça; e calçados os pés na preparação do evangelho da paz; tomando sobretudo o escudo da fé, com o qual podereis apagar todos os dardos inflamados do maligno. Tomai também o capacete da salvação, e a espada do Espírito, que é a palavra de Deus; orando em todo o tempo com toda a oração e súplica no Espírito, e vigiando nisto com toda a perseverança e súplica por todos os santos” (Efésios 6:11-18). E aos coríntios ele escreveu: “Porque, embora andando na carne, não militamos segundo a carne, pois as armas da nossa milícia não são carnais, mas poderosas em Deus, para demolição das fortalezas; derribando imaginações, e toda altivez que se levanta contra o conhecimento de Deus, e levando cativo todo pensamento à obediência de Cristo” (2 Coríntios 10:3-5).

Assumir que no final do Milênio a vasta multidão dos santos de Deus será literalmente calada na cidade de Jerusalém pelos seus inimigos e ficará praticamente indefesa, é assumir o absurdo. Devemos sempre ter em mente que esta é uma linguagem simbólica, que o que estamos vendo não é a realidade, mas uma visão, uma grande representação, e que os materiais simbólicos são usados meramente para apresentar a verdade espiritual.

Em seu recente livro, Uma Escatologia de Vitória, o Rev. J. Marcellus Kik faz o seguinte comentário com respeito ao aprisionamento de Satanás e a batalha contra a cidade amada:

“Observe que Satanás não foge da prisão por seu próprio poder. Ele não quebra suas cadeias. Ele é solto pelo Senhor...Os nomes de Gogue e Magogue são usados tanto quanto usamos os nomes de Hitler e Nazista depois da nossa experiência na Segunda Guerra Mundial. Hitler e Nazista trazem diante de nossas mentes exércitos cruéis que trouxeram muitos danos. Podemos muito bem denominarmos um futuro tirano de Hitler e uma futura nação de multidão Nazista, sem ter os alemães em mente. Em Apocalipse, os nomes dos antigos inimigos são usados para designar novos. Gogue e Magogue representam inimigos futuros da Igreja, cujos nomes são ainda desconhecidos. Este tipo de interpretação é ensinada em Apocalipse 11:8, 'E jazerão os seus corpos na praça da grande cidade, que espiritualmente se chama Sodoma e Egito, onde também o seu Senhor foi crucificado'. Sodoma e Egito são 'espiritualizados'. Assim também, devemos 'espiritualizar' Gogue e Magogue...”.

“É difícil para alguém conceber a natureza da oposição. A linguagem é tão vívida que é difícil para nós percebermos que esta não é uma batalha de armas — de espada e revólver. Nosso Senhor claramente lembra que a batalha pelo Cristianismo não é lutada com espada carnal. É uma batalha entre o verdadeiro Evangelho e o falso Evangelho. É uma batalha da verdade contra o erro. É uma batalha da luz contra as trevas. Não é uma guerra contra a carne e o sangue, 'mas contra os principados, contra as potestades, contra os príncipes das trevas deste século, contra as hostes espirituais da maldade, nos lugares celestiais'...

“Eles cercaram o arraial dos santos. A Igreja é comparada com um campo militar. Esta é uma figura emprestada do tempo de Moisés e Josué, quando a Igreja, até mesmo externamente, apresentava a forma de um campo militar. As doze tribos com suas bandeiras ao redor do Tabernáculo de quatro lados. O arraial tinha a forma de um quadrado, e seus quatro lados deveriam apontar para os quatro pontos cardeais. Este era um tipo da cidade celestial como vista em Ezequiel 48:20 e a cidade quadrada de Apocalipse 21:16. O arraial e a Cidade eram senão diferentes figuras de linguagem para descrever a Igreja sobre a terra. A Igreja no céu nunca será cercada pelos inimigos tais como nos descrito em Apocalipse 20...

“Para outros, esta é a cidade literal de Jerusalém. Apenas um pouco de pensamento mostrará quão impossível isto é. Imagine todos os exércitos das nações do mundo colocando cerco a uma cidade na Palestina! E você deve imaginar os exércitos modernos equipados com mísseis, bombas e aviões. A terra da Palestina não poderia conter todos os exércitos do mundo. Esta é uma linguagem figurada.. Esta é a linguagem do Antigo Testamento para expressar a inimizade do mundo contra a Igreja” (pp. 237-242).

É de grande interesse nesta conexão, notar que o Dr. Warfield cria que não haverá nenhum ressurgimento do mal de forma alguma no final, mas, pelo contrário, que no reino de Cristo, o presente Reino — então perfeito, com a conquista do último inimigo, a morte, — se fundirá ao reino eterno. Ele entendia a seção de Apocalipse 20:1-10 como se referindo ao estado intermediário, e ele cria que os “mil anos” tentavam descrever a felicidade celestial dos santos no Paraíso, em contraste com o qual o tempo de prova da Igreja sobre a terra é descrito pelo termo “um pouco de tempo” (versículo 3). Esta visão lhe permitiu sustentar que não haveria nenhuma apostasia ou rebelião de forma alguma no final da era dourada de justiça e paz. Como um Pós-Milenista, ele cria que o mundo será convertido ao Cristianismo antes do retorno de Cristo, mas ele baseava sua visão em Apocalipse 19:11-12 e sobre as intimações de Romanos 11 e 1 Coríntios 15, e não em Apocalipse 20:1-10. Ele disse com respeito à Apocalipse 20:1-10:

“A figura que é trazida diante de nós aqui é a figura do 'estado intermediário' — dos santos de Deus reunidos no céu, longe dos barulhos confusos e com as vestes banhadas em sangue, que caracteriza a guerra sobre a terra, para que eles possam com segurança esperar o fim. Os mil anos, então, é a inteireza desta dispensação presente, que novamente é colocada diante de nós na sua totalidade, mas observando agora relativamente, não o que se está passando sobre a terra, mas o que é está se desfrutando 'no paraíso'. Este é, de fato, o significado do símbolo de mil anos. Pois este período entre os eventos é, sobre a terra, um tempo quebrado — três anos e meio, um 'pouco de tempo' (versículo 3) — para o qual, no meio de tumultos e problemas, os santos são encorajados a olhar como de curta duração, breve a se findar. Para os santos na glória ele é, pelo contrário, um longo e bendito período, passando lentamente e pacificamente por, enquanto eles reinam com Cristo e desfrutam da bem-aventurança da santa comunhão com Ele — 'mil anos' ”.

“Certamente, a passagem (20:1-10) não nos dá uma descrição direta do 'estado intermediário'. Devemos ter em mente que o livro que estamos lendo é escrito em símbolos e não nos é dado uma descrição direta de nada do que é colocado diante de nós, mas sempre uma descrição direta do símbolo pelo qual ele é representado. Na visão precedente (19:11-21), não temos nenhuma descrição direta do triunfo e progresso do Evangelho, mas somente uma feroz e horrível guerra: a simples frase que fala da espada matadora como 'saindo da boca' do conquistador somente indicando que ela é uma conquista por meio de palavras persuasivas. Assim, não devemos esperar uma descrição direta do 'estado intermediário'...Ela é uma descrição na forma de uma narrativa; o elemento de tempo e sucessão cronológica pertencem ao símbolo, não à coisa simbolizada. A 'prisão de Satanás' é, portanto, na realidade, não por um período, mas com referência a uma esfera; e sua 'soltura' novamente não é após um período, mas em outra esfera: não é subseqüência, mas exterioridade que é sugerida. Não há, deveras, nenhuma literal 'prisão de Satanás' para ser imaginada de forma alguma: o que acontece, acontece não a Satanás, mas ao santos, e é somente representado como acontecendo a Satanás com o propósito da figura simbólica. O que realmente acontece é que os santos descritos são removidos da esfera dos ataques de Satanás. Os santos descritos são livres de todo acesso de Satanás — ele está preso com respeito a eles: fora do círculo 'encantado' deles sua obra continua. Isto é indicado, deveras, no próprio emprego de dois símbolos 'mil anos' e 'um pouco de tempo'. 'Mil anos' é o símbolo da inteireza e da bênção celestial; o 'um pouco de tempo' da confusão terrena e do mal. Aqueles no 'mil anos' estão livros dos ataques de Satanás: aqueles fora dos mil anos ainda estão sofrendo seus ataques. E, portanto, ele, embora com respeito àqueles nos mil anos esteja preso, não está destruído; e a visão assim exige fechar com um relato de sua completa destruição, e certamente isto também deve estar presente na forma narrativa de uma soltura de Satanás, a reunião de seus exércitos e sua destruição pelo exército do alto” (Artigo, O Milênio e o Apocalipse; reimpresso em Doutrinas Bíblicas, pp. 649-651).

Nós concordamos que Apocalipse 20:10 não fornece nenhuma base real para se crer que haverá uma apostasia final no sentido que uma larga proporção dos habitantes da terra se voltarão contra Deus, ou que a segurança dos santos será seriamente ameaçada.

Além do mais, depois que mostramos em Apocalipse 19:11-21 quão completa é a vitória de Cristo e quão completamente esmagados são todos os Seus inimigos, não podemos crer que no final, Deus, como o soberano Governador do mundo — Ele, de quem as Escrituras diz, “Como ribeiros de águas assim é o coração do rei na mão do SENHOR, que o inclina a todo o seu querer” (Provérbios 21:1), e, “E todos os moradores da terra são reputados em nada, e segundo a sua vontade ele opera com o exército do céu e os moradores da terra; não há quem possa estorvar a sua mão, e lhe diga: Que fazes?” (Daniel 4:35) — irá subitamente e propositalmente jogar fora esta vitória e permitir ao Diabo um triunfo mundial, mesmo que por um breve tempo. Uma vez que a dura batalha está ganha e tal magnificente vitória ganha, podemos estar certos de que ela será propriamente protegida, e que ao Diabo nunca novamente será permitir se levantar como um sério contendor contra Deus.

E isto que nós cremos é o ensino consistente da Escritura. Talvez a declaração mais definida com respeito à permanência do reino de Messias é encontrada na interpretação de Daniel do sonho de Nabucodonosor, onde, após indicar os sucessivos reinos mundiais que se levantariam, Daniel disse: “Mas, nos dias desses reis, o Deus do céu levantará um reino que não será jamais destruído; e este reino não passará a outro povo; esmiuçará e consumirá todos esses reinos, mas ele mesmo subsistirá para sempre” (2:44). Ezequiel descreve as bênçãos sempre crescentes do reino do Messias como um jorrar de águas curadoras que brotavam de debaixo dos umbrais do templo, primeiramente batendo somente nos artelhos, então nos joelhos, então nos lombos, então um grande rio que não podia ser atravessado (47:1-5). Zacarias diz do Reino Messiânico que “seu domínio se estenderá de mar a mar, e desde o rio até às extremidades da terra” (9:10). As profecias do reino em Isaías e Miquéias ensinam uma vitória completa, nunca com uma referência a uma apostasia final. Falando através do Salmista, Deus disse, “Pede-me, e eu te darei as nações por herança, e as extremidades da terra por possessão” (2:8).

O Novo Testamento apresenta o mesmo ensino. O rio curador descrito por Ezequiel encontra cumprimento no ministério doador-de-vida da Igreja Cristã. O reino do céu é dito ser “semelhante ao fermento, que a mulher toma, e introduz em três medidas de farinha, até que tudo esteja levedado” (Mateus 13:33).

O restante dos homens, e todos os gentios” devem “buscar ao Senhor” (Atos 15:17). Cristo está sentado à mão direita do Pai até que todos os Seus inimigos sejam colocados debaixo dos Seus pés (Atos 2:35) — e não há razão para crer que àqueles inimigos, tendo sido uma vez conquistados, ser-lhes-á novamente permitido levantar e renovar a batalha.

Um contraste impressionante entre o Milênio no qual o Pós-Milenista crê e aquele no qual o Pré-Milenista crê, é visto no grau no qual ao mal será permitido se expressar durante aquele período e em seu fechamento. O Pós-Milenista crê que à medida que o Milênio se tornar uma realidade, o mal será reduzido ao mínimo. Mas o Pré-Milenista crê que embora Satanás esteja preso para que ele não mais engane as nações, aquelas nações, não obstante isso, continuarão inimigas em seus corações, prontas para se voltar para Satanás e seguir sua liderança na guerra contra os santos, no momento em que os mil anos se findarem. De acordo com a visão pré-milenar, o mal estará efetivamente contido durante o Milênio somente pelo governo de vara-de-ferro de Cristo.

Os Pré-Milenistas que estão acostumados a pensar da era milenar como uma era de justiça e paz, podem ficar surpresos em saber o que três de seus representantes, os quais têm sido tão influentes em trazer o sistema à sua presente forma (Dispensacionalismo), têm a dizer sobre este assunto. John N. Darby, cuja influência no começo do movimento foi tão criativa, diz: “Agora há uns poucos fiéis, Satanás sendo o príncipe e deus deste mundo, nadando contra a correnteza. Então, Cristo será o príncipe do mundo, e Satanás preso, e a obediência será paga ao poder manifestado de Cristo, mesmo quando os homens não forem convertidos. Quando esta obediência não for paga, a execução acontecerá, para que tudo seja paz e felicidade. É um governo perfeito da terra feita boa em todo e qualquer lugar. Quando Satanás for solto e as tentações vierem novamente, aqueles que não forem guardados pela graça o seguirão. Eu tenho a impressão de que a piedade declinará no milênio; mas ela é baseada numa impressão, de forma que não insisto nela; mas o resto que eu disse está revelado. Que homens devem cair quando tentados, embora triste, está muito claro. É o último esforço de Satanás” (Coletânea de Escritos, xi., p. 534).

James H. Brookes, em seu livro Maranatha, apresenta uma descrição ainda mais obscura. Diz ele: “O que é nascido da carne é carne e embora restringida durante o Milênio, manifestará sua depravação inerente na primeira oportunidade favorável, como um tigre engaiolado e contido por muito tempo, que voltará para sua selva nativa com sede insaciável por sangue, quando suas barras de ferro forem removidas” (p. 540, Quinta Edição, 1878).

E o Dr. G. Campbell Morgan diz: “Temos visto que a Era Dourada é para ser caracterizada pelo governo direto de Cristo. O pecado ainda estará na terra; mas ele será mantido em repressão e sumariamente punido tão logo se manifeste. As nações que Cristo governará com vara de ferro serão em uma larga extensão desleais no coração; para que, quando Satanás for solto por um pouco de tempo, ele imediatamente as engane. Verdade, haverá em todo lugar aqueles que recusarão se alistar sob suas bandeiras, mas a descrição aqui é de uma enorme apostasia, a mais terrível já vista...Não há dúvida de que para alguns que têm sonhado com o Milênio como uma finalização, a perspectiva mais adiante é desapontadora; mas, antes que o reino de Jesus Cristo possa ser introduzido em toda sua glória, a incredulidade e deslealdade ocultas nos corações dos homens devem ser trazidas à luz...Todas as nações estarão sob o governo de 'vara de ferro', e serão então compelidas à submissão. No coração, contudo, a grande multidão será rebelde até o fim, e avidamente se aproveitará da oportunidade de exteriormente se livrar do jugo e entrar em conflito real, quando acontecer a soltura de Satanás” (Os Métodos de Deus com o Homem, pp. 132, 133).

Comentando sobre esta visão, o Dr. Allis observa que não é uma visão atrativa e então diz: “não é agradável pensar do Rei Messiânico, o Príncipe da Paz, sentado entronizado como se estivesse sobre um vulcão em erupção; de um reino do Messias, pacífico na superfície, mas tempestuoso com ódio e rebelião murmuradora; de pessoas prestando uma obediência externa pois a 'excisão' é a conseqüência inevitável da desobediência e oposição, visto que o governo de vara-de-ferro pode somente significar 'quebrar em pedaços' o rebelde, assim como um vaso do oleiro. Quando lemos que 'o lobo deitará com o cordeiro', não tomamos isto como significando que o lobo estará ávido para devorar o cordeiro e que será restringido de fazê-lo somente pelo temor das conseqüências. Nós naturalmente entendemos que isto implica numa mudança de natureza; a besta devoradora, se as palavras forem tomadas literalmente ou figuradamente, não mais desejará devorar o cordeiro.'Não se fará mal nem dano algum' em todo o monte santo de Deus, pela razão de que eles não mais desejaram fazê-lo, não porque eles serão restringidos pela força superior de fazer algo que eles desejam fazer”.

Ele adiciona ainda que de acordo com esta visão, “Os inimigos do Messias farão uma demonstração de obediência ao governo que eles odeiam. Assim, nós podemos dizer, de acordo com esta visão, que o milênio sobrepujará todas as outras eras em hipocrisia e hipócritas. Homens, muitos homens, se submeterão somente porque eles devem; e estes 'homens-tigres' estarão esperando com impaciência crescente pelo momento quando o desafio e a resistência possam oferecer pelo menos a aparência de um final bem-sucedido” (Profecia e a Igreja, p. 241).

Que Milênio o Pré-Milenista tem! Mil anos de supremacia judaica com Jerusalém como capital, semi-celestial e semi-terrena, santos em corpos ressurretos e glorificados misturados com pecadores na carne, um estado misto de mortais e imortais, e tudo isto climatizado por uma manifestação do mal, sem precedentes, no final! A vida humana e o trabalho do mundo continuarão durante todo aquela longa era, tanto quanto agora. Homens e mulheres se casarão e crianças nascerão; pessoas com corpos mortais viverão em casas e comerão comida física e serão sujeitas à doença e morte, embora não no mesmo grau que no presente. As condições serão ideais, mas não celestiais; a terra será abundantemente frutífera; multidões honrarão e adorarão a Deus, enquanto outras estarão tristes e ressentidas. Homens ímpios serão refreados pelo governo de força. Numa extensão considerável as condições do Antigo Testamento serão restabelecidas. “A parede que fazia divisão” entre judeus e gentios, que Cristo derrubou “para que Ele pudesse criar em Si mesmo dos dois um novo homem, fazendo assim a paz” (Efésios 2:14-15), deve ser construída novamente e feita mais alta e forte, e os judeus restabelecidos como o povo escolhido. Tal reino deve ser necessariamente bem inferior em glória do que o Reino final.

Os Pré-Milenistas insistem que a última parte de Ezequiel, capítulo 38 a 48, deve ser tomada com grande literalismo, como tendo cumprimento no reino milenar, e como profetizando um Israel restaurado na terra da Palestina. Assim, o templo deve ser reconstruído, os sacrifícios de animais novamente apresentados para fazer expiação pelos pecados do povo (45:15 - 46:15), os sacerdotes oficializados (46:2), o povo da terra subindo até Jerusalém para as festas marcadas (46:9), e Cristo pessoalmente, presente e visível somente a um número de pessoas comparativamente pequeno, entrará no templo pela porta oriental, com os sacerdotes preparando seus holocautos e suas oferendas de paz (46:2,3). Note que se estes capítulos devem ser tomados literalmente, eles não dizem, como os Pré-Milenistas pretendem fazer com que eles digam, que os sacrifícios serão somente de natureza memorial, mas que eles definitivamente são chamados de 'oferta pelo pecado', 'holocausto' e 'ofertas de alimentos' (45:22,25). Um literalista não tem o direito de tomá-las em nenhum outro significado. Nós preferimos dizer que estas predições foram cumpridas em parte quando Israel foi restaurado à Palestina no tempo de Esdras e Neemias mais tarde, e que com respeito a quaisquer partes que não encontraram cumprimento naquele tempo, as formas de pensamento do Antigo Testamento são empregadas para ensinar as verdades espirituais do Novo Testamento, verdades que hoje podem ser expressas inteligentemente somente através daquelas com as quais o povo era familiar.

Francamente, não desejamos tal estado como o Pré-Milenismo apresenta, mas preferimos na morte entrar diretamente no Reino celestial. Certamente deve ser evidente para qualquer pessoa que tal estado, embora para os santos ele possa ser marcado por santidade de vida, todavia deixa muito a desejar, e que tal estado inferior de coisas prolongado por mil anos torna-se não um acréscimo, mas um decréscimo de bem-aventurança, restringindo mais do que promovendo a chegada do Reino de Deus em sua plenitude. Não há de fato nada para justificar a prolongação de tal intervalo fútil. Para os santos que partiram, que estão reinando com Cristo, um retorno para uma vida terrena e condições terrenas seria, literalmente e figuradamente, uma grande 'descida', uma séria restrição da vida gloriosa que eles agora desfrutam. Os Pré-Milenistas não fazem nenhuma concessão adequada para o tipo de vida muito superior e radicalmente diferente desfrutada pelos santos no Paraíso, e este tipo de vida ao qual eles estariam sujeitos se fossem trazidos de volta a esta terra. E até onde diz respeito àqueles que ainda estão na carne, certamente a presença física do Senhor, visível a apenas um número comparativamente pequeno de Seu povo, significará menos do que Sua presença espiritual agora experimentada por todos de Seu povo, em todas as partes do mundo — a menos que ele pare de andar pela fé e esteja andando por vista.

Novamente dizemos, Que Milênio o Pré-Milenista tem! — um Milênio precedido por sete anos de confusão, sofrimento e perseguição sem paralelos, durante a 'Grande Tribulação' e sob o reinado do Anticristo, e terminando com uma revolta universal e uma guerra contra a qual os santos e até mesmo o próprio Cristo parecem estar indefesos, e da qual eles são salvos somente pelo fogo do céu! Não podemos nos refrear de perguntar: Cristo abandona o Seu povo no final do glorioso reinado milenar, para que eles se calem em Jerusalém e fiquem praticamente à mercê do inimigo? Certamente isto não pode ser assim! Como é que esses eventos estranhos podem ser explicados?

E devemos perguntar ainda porque, se tal intervalo terreno adiante é tão importante, porque Cristo e os apóstolos não predisseram claramente que o templo seria reconstruído, os sacrifícios e os rituais levíticos restabelecidos, o sacerdócio de Aarão restaurado, os judeus novamente apontados para serem um povo separado e especialmente favorecido, e Jerusalém feita novamente o centro da adoração mundial num reinado judeu de mil anos.Deve haver apenas uma resposta: Tal esquema não fazia parte de sua crença. Longe de restringir a adoração a um templo em Jerusalém, Jesus disse, “A hora vem, em que nem neste monte, nem em Jerusalém adorareis o Pai...A hora vem, e agora é, em que os verdadeiros adoradores adorarão o Pai em espírito e em verdade; porque o Pai procura a tais que assim o adorem. Deus é Espírito, e importa que os que o adoram o adorem em espírito e em verdade” (João 4:21-24).


Tradução livre: Felipe Sabino de Araújo Neto
Cuiabá-MT, 26 de Dezembro de 2004.


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