A Única Coisa Necessária (4)

por

Vincent Cheung




Caminhando Jesus e os seus discípulos, chegaram a um povoado, onde certa mulher chamada Marta o recebeu em sua casa. Maria, sua irmã, ficou sentada aos pés do Senhor, ouvindo-lhe a palavra. Marta, porém, estava ocupada com muito serviço. Ela, aproximando-se dele, perguntou: “Senhor, não te importas que minha irmã tenha me deixado sozinha com o serviço? Dize-lhe que me ajude!”

Respondeu o Senhor: “Marta! Marta! Você está preocupada e inquieta com muitas coisas; todavia apenas uma é necessária. Maria escolheu a boa parte, e esta não lhe será tirada
” (Lucas 10:38-42).


Lenski pensa que a queixa de Marta não exibe nenhuma irreverência ou reclamação contra Jesus. Ele escreve: “Mas isso teria sido descarada impolidez e rudeza, e a resposta de Jesus não indica nada desse tipo” [5]. Contudo, esse argumento é uma falácia, pois se baseia somente na especulação de Lenski sobre qual teria sido a resposta de Jesus se a declaração de Marta exibisse “descarada impolidez e rudeza”. De fato, alguém pode mais naturalmente dizer que sua declaração deveras exibe “descarada impolidez e rudeza”, e que a resposta de Jesus apenas demonstra Sua paciência para com ela.

Lenski continua: “Alguns têm encontrado desrespeito descarado nas palavras ‘não te importas', mas se esquecem que Marta se dirige [a Jesus] como ‘Senhor', e a resposta óbvia que Jesus teria tido que dar, a saber, prontamente se retirar”. [6] Em outras palavras, ele pensa que é impossível se dirigir a Jesus como “Senhor” e mostrar desrespeito ao mesmo tempo.

Mas essa é uma interpretação ingênua, e é Lenski quem esqueceu de todos os exemplos bíblicos nos quais até mesmos os profetas, que se dirigiam a Ele como o Soberano e Todo-Poderoso ao mesmo instante, tinham expressado algumas vezes frustração contra Deus. Certamente, qualquer queixa que seja mais do que uma expressão de necessidade pessoal e agonia, mas que equivalha a encontrar falta em Deus, é ilegítima e pecaminosa. Algumas vezes eles foram pacientemente encorajados; em outras, severamente repreendidos.

O argumento de Lenski implica que alguém sempre deve falar como um extremo ateu ou não-cristão quando exibir irreverência, mas isso é falso. Um modo de comportamento irreverente é precisamente reconhecer quem Deus é e então falar como se Ele não fosse quem é, ou reconhecer Sua sabedoria, poder e justiça, e então falar duma forma que questione Sua sabedoria, poder e justiça.

Chamar Jesus de “Senhor” e então criticá-Lo ou contradizê-Lo faz da irreverência de alguém ainda mais pecaminosa. Pela argumentação de Lenski, Mateus 16:16 neutralizaria qualquer irreverência em Mateus 16:22. Mas “repreender” Jesus, corrigindo-O sobre Sua própria missão sobre a terra, e isso logo após chamá-lo de “Cristo, o Filho do Deus vivo”, somente faz a irreverência de Pedro ser ainda mais evidente e inescusável. Assim, a resposta “Para trás de mim, Satanás!” (v. 23), é completamente apropriada.

Assim, qualifiquemos e suavizemos nossas críticas contra Marta duma maneira que seja apropriada — digamos que ela errou como resultado de frustração e ignorância, mas não de malícia — mas não devemos desprezar completamente o que ela diz. Sua declaração é realmente grosseira e irreverente.

Essa é, portanto, uma advertência para nós sobre a frustração que pode se levantar quando estamos ansiosos sobre fazer o que pensamos ser apropriado e necessário, ao invés de seguir o programa de Deus de discipulado. E essa frustração pode levar a um falso julgamento contra nossos irmãos e irmãs em Cristo, e a uma explosão de irreverência contra o próprio Deus que reivindicamos proclamar e adorar pela nossa condição distraída.


NOTAS:

[5] - R. C. H. Lenski, Commentary on the New Testament: The Interpretation of St. Luke's Gospel (Hendrickson Publishers), p. 614.

[6] - Ibid. Lenski novamente se refere à “resposta óbvia que Jesus teria tido que dar”. Mas isso não é nada mais do que especulação, e ela não é óbvia de forma alguma. É ilegítimo especular sobre o que Jesus teria feito, a menos que Lenski possa demonstrar que essa é uma implicação necessária de algo que está no texto, ou em alguma outra parte da Bíblia.



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Nota sobre o autor: Vincent Cheung é o presidente da Reformation Ministries International [Ministério Reformado Internacional]. Ele é o autor de mais de vinte livros e centenas de palestras sobre uma vasta gama de tópicos na teologia, filosofia, apologética e espiritualidade. Através dos seus livros e palestras, ele está treinando cristãos para entender, proclamar, defender e praticar a cosmovisão bíblica como um sistema de pensamento compreensivo e coerente, revelado por Deus na Escritura. Ele e sua esposa, Denise, residem em Boston, Massachusetts. [http://www.rmiweb.org/]

 


Traduzido por: Felipe Sabino de Araújo Neto
Cuiabá-MT, 15 de Agosto de 2005.


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